Atuais servidores públicos e aposentados serão prejudicados, imediatamente, pela reforma administrativa

Os atuais servidores e aposentados do serviço público serão, imediatamente, prejudicados pela reforma administrativa em tramitação no Congresso Nacional. Na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 32/2020 do governo Bolsonaro, elaborada pelo ministro da Economia, o banqueiro Paulo Guedes, servidores e aposentados serão atingidos em várias dimensões.

Nesta oitava matéria da série “Reforma administrativa: o fim dos serviços públicos”, o Sinpro-DF mostra que a PEC 32/2020 afeta, de imediato, os(as) atuais servidores(as) públicos(as) e vai mais longe: atinge também os(as) atuais aposentados(as). Uma das dimensões é o impacto do fim Regime Jurídico Único (RJU) e a colocação, no lugar, das novas modalidades de contratação que promoverão uma diáspora entre servidores. Essa divisão é uma das estratégias dos ultraliberais para enfraquecer e quebrar a unidade da luta por melhores e condições de trabalho dos servidores públicos.

Em segundo lugar, mesmo aqueles que ficam com o direito à estabilidade estão suscetíveis à demissão, uma vez que essa estabilidade será mitigada pelas novas regras. De imediato, eles também podem ser demitidos por avaliação de desempenho. A PEC estabelece que as três esferas federal, estadual e municipal deverão instituir novo regime jurídico de pessoal e outros vínculos empregatícios com a administração pública.

Além disso, uma lei infraconstitucional irá dispor sobre a perda do cargo. O Presidente da República mente ao dizer que a reforma não atinge os atuais servidores e aposentados. O advogado Jean P. Ruzzarin, especialista em Defesa do Servidor Público, esclarece, que a maior falácia diz respeito ao item tido por não tocado pela PEC 32/2020, o da estabilidade dos atuais servidores.

“Desde a Constituição de 1934, a hipótese de perda judicial do cargo público somente acontecia depois do trânsito em julgado, o que foi mantido com a redação originária da Carta de 1988. Agora, os servidores atuais podem ser destituídos do cargo pela primeira decisão judicial colegiada, mesmo sendo alto o índice de julgamentos favoráveis aos servidores nas últimas instâncias, que corrigem injustiças de decisão colegiadas anteriores”, explica o advogado.

Ele afirma que a proposta deixa, ainda, de exigir Lei Complementar para regulamentar a hipótese de perda do cargo por desempenho insatisfatório do servidor. “O afrouxamento dessa regra submeterá os atuais ocupantes de cargos estáveis a avaliações regulamentadas em lei ordinárias simples, que podem ser modificadas, facilmente, para atender às intenções governamentais episódicas, submetendo, facilmente, o serviço público a variações ideológicas do governo de plantão”.

Antônio Augusto Queiroz, jornalista, consultor e analista político, diretor de Documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), endossa a análise do advogado e acrescenta que, além disso, a PEC acaba com a possibilidade de promoção e progressão automática por tempo de serviço.

“Eliminam-se todos os cargos de confiança que hoje são reservados aos servidores. Abrem-se esses cargos para o setor privado. Amplia-se muito a possibilidade de os terceirizados ocuparem postos, espaços e atribuições dos atuais servidores de carreira disputando com eles, lado a lado, sem vínculo formal”, acrescenta o consultor.

O diretor do Diap explica que as alterações propostas para a perda de cargo, dentre elas a decisão judicial de órgão colegiado, têm estreita relação com o desemprego atual e com a quebra da estabilidade que será mantida para quem já é servidor e para os novos cargos típicos de Estado da PEC, porém, com alterações para facilitar a perda do cargo de quem já é servidor. Por isso que se diz que a estabilidade atual será mitigada pela reforma administrativa.

PEC 32 afeta atuais aposentados do serviço público
Queiroz afirma que, em relação aos aposentados o impacto imediato é, definitivamente, a quebra da paridade. Hoje, o mesmo reajuste que se dá aos ativos, é concedido aos aposentados. Como, para os ativos, no futuro, a tendência será a de remunerar por gratificação e produtividade, essa parte não iria para os aposentados.

Contudo, o que vai afetar, diretamente, os atuais aposentados é um resquício ainda da reforma da Previdência que vai ser implantado após a reforma administrativa: a redução da alíquota da faixa de isenção para contribuição para o Regime Próprio de Previdência Social (RPPS).

“É uma reforma que tem o objetivo de suprimir ou reduzir direitos dos atuais servidores e aposentados e submeter os futuros a uma relação de trabalho flexibilizada, draconiana e terá espiões, gente de fora, vigiando. É a lógica de vigiar e punir. E isso não tem nada que ver com qualidade do serviço público”, alerta Queiroz.

Efeitos indiretos imediatos da PEC 32 sobre atuais servidores
Estudo preliminar do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) sobre a PEC 32 mostra que, além de efeitos diretos, a reforma administrativa do governo Bolsonaro tem efeitos indiretos imediatos sobre os atuais servidores públicos.

Um deles é a instituição de “instrumentos de cooperação”. A partir do momento em que se autoriza os entes a firmarem instrumentos de cooperação com órgãos e entidades, públicos e privados, para a execução de serviços públicos, colocando como restrição somente as atividades dos cargos típicos, a PEC fragmenta e fragiliza os atuais servidores da maioria das carreiras.

Também afeta indiretamente os atuais servidores quando propõe a abertura da possibilidade de contratação por prazo determinado quando há interrupção do serviço, o que coloca em risco o direito à greve. Nesses casos a eficácia da greve fica comprometida.

Outro impacto indireto imediato nos servidores atuais é que quando o assunto é a Previdência, os entes vão ter autonomia, segundo texto da PEC, para criarem lei para vincularem os que não são cargos típicos de Estado ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS), o que fragiliza o Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), ao qual os atuais servidores são vinculados.

Efeitos diretos da reforma administrativa sobre o funcionalismo atual
Os atuais servidores públicos, segundo as regras apresentadas na PEC 32, estão sujeitos a perderem o cargo público por meio da avaliação de desempenho a ser instituída, bem como por outros instrumentos, o que é uma novidade que modifica para os atuais servidores.

Outro impacto direto é a proposta de vedar a concessão de vários direitos e garantias e quando fala da elaboração de lei federal que irá tratar de uma série de temas relacionados aos serviços públicos, incluindo aí a gestão de pessoas e a política remuneratória.

Ou seja, haverá impacto direto se uma lei distrital que concede algum direito for anulada por uma lei federal resultante dessa reforma administrativa que venha a dispor o contrário. A suposta lei federal, prevista na PEC, poderá, por exemplo, suprimir itens do próprio plano de carreira do funcionalismo do Distrito Federal.

O impacto que a criação de cargos de liderança e assessoramento causa é que as funções de confiança, que, antes, eram exclusivas de servidor público, com a reforma, poderão ser desempenhadas pelos cargos de liderança e assessoramento. Ou seja, os novos vínculos empregatícios eliminam a prerrogativa de que somente servidores públicos podem ocupar a função de confiança.

Efeitos diretos e indiretos sobre os aposentados

Essa reforma vai afetar, imediatamente, de forma direta e indireta também os aposentados. Um dos efeitos é que as regras propostas fragilizam o RPPS ao colocarem a possibilidade de vincular os servidores ao RGPS.

Essa regra somada aos instrumentos de cooperação e às novas formas de contratação para que menos servidores ingressem afetam o regime de repartição simples (pacto de gerações), segundo o qual os ativos contribuem para o pagamento dos inativos, a reforma administrativa, possivelmente, vai gerar uma diminuição da proporção de ativos em relação à inativos.

“Resumindo, essa PEC foi concebida para desorganizar o serviço público, punir os atuais e submeter os futuros servidores públicos a regras da iniciativa privada. Se for aprovada, ela vai ressuscitar o estado de coisas de antes de 1988, que levou o Brasil a realizar uma Assembleia Nacional Constituinte e definir, na Constituição, as atuais garantias dos servidores públicos na forma em que estão na Carta Magna atualmente”, finaliza Cláudio Antunes, coordenador de Imprensa do Sinpro-DF.

 

Confira, a seguir, matérias anteriores da série “Reforma administrativa: o fim dos serviços públicos”:
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