Brasil precisa endurecer leis contra estupros e abusos sexuais dentro das unidades de saúde

O Brasil precisa endurecer as leis contra estupros e abusos sexuais contra mulheres dentro das unidades de saúde. Depois de mais um caso criminoso como o do anestesista colombiano Andrés Eduardo Onate Carrillo, que estuprou mulheres e crianças desacordadas no Hospital Heloneida Studart, em São João de Meriti, na Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro, isso é mais urgente ainda. Quem defende é a médica anestesista e Terapia Intensiva formada pela Santa Casa de São Paulo, Cintia Lucchini.

“Pelo que vejo, a legislação é suficiente mas o problema é a aplicação da lei. Infelizmente, quem trabalha com casos de violência de estupro, quem estuda isso, não ficou tão chocado”, diz a médica. Os casos do colombiano Carrillo, de 32 anos, que é acusado de estuprar várias pacientes, e de outro anestesista, Giovanni Quintella Bezerra, acusado de estuprar uma parturiente, não são isolados.

De acordo com levantamento do jornal O Globo, com dados do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MDH), do governo federal, de julho do ano passado, pelo menos 373 abusos sexuais foram denunciados por mulheres dentro de unidades de saúde, de 2020 a maio de 2022. As denúncias foram feitas através dos canais Disque 100 e Ligue 180.

Uma realidade assustadora de pelo menos um caso relatado a cada dois dias em unidades públicas ou particulares. A médica diz que casos como esses continuam ocorrendo porque a justiça demora para julgar, enquanto os estupradores trabalham normalmente.

“As próprias instituições abafam os casos porque esses processos correm em segredo. No hospital as denúncias são feitas por um portal anônimo, que você não sabe de nada, enquanto isso o criminoso continua trabalhando e tendo sua vida normal”, disse Cintia.

De acordo com a polícia, Carrillo tinha autorização para trabalhar no Brasil e atuava em hospitais da rede pública e privada. Ele foi levado para a Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima (Dcav), e os investigadores querem descobrir agora se há outras vítimas.

Vulnerabilidade e estupro

Cintia Lucchini afirma ainda que os estupradores escolhem mulheres e pessoas vulneráveis para cometer seus crimes. Entre elas, diz a anestesista, estão crianças e pessoas com mais idade. “Essa é a realidade porque a gente sabe que as mulheres são vítimas de violência e estupro e os agressores escolhem bem suas vítimas. Eles têm uma predileção pelas vítimas mais vulneráveis, que são as crianças e os extremos de idade. Neste caso absurdo são de pacientes extremamente vulneráveis, durante a anestesia. Parece que a sociedade vive uma espécie de negação e cegueira”, afirma a médica.

Ela cita ainda a pesquisa do Instituto Patricia Galvão, que revela que a cada 10 minutos uma mulher é estuprada no Brasil. Sendo que desses números de mulheres, 73% das vítimas eram vulneráveis, 60% tinham até 13 anos de idade e 85% desses casos o autor era um conhecido da vítima “Acho que as mulheres têm sim que ser acompanhadas em ambulatórios, tem que ter câmeras no centro cirúrgico para proteger as pacientes. A gente precisa de monitoramento nas salas cirúrgicas para também proteger o profissional de saúde”, ressalta Cintia.

Perspectivas de mudança

A secretária de Relações de Gênero da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Berenice D’Arc Jacinto, diz que com o governo do presidente Lula e um novo Congresso Nacional, é hora de melhorar a lei brasileira contra abusos sexuais e estupros nas unidades de saúde. “As leis brasileiras precisam melhorar muito, mas temos esperança que estamos diante de um novo momento da política para que a gente possa ter uma legislação que olhe profundamente para esse problema”, defende a dirigente.

Segundo ela, com a volta das secretarias de direitos humanos e das mulheres, o momento é de esperança para que os deputados pressionem o legislativo para endurecer as leis. “Não só o Congresso Nacional, mas que o governo federal tenha acompanhamento sobre esses casos, que puna essas pessoas. Devemos convencer os parlamentares na ponta para verificar a dimensão do problema que não é pequeno”, afirma.