Os prejuízos da privatização da escola pública e o fracasso nos EUA

O combate à privatização da educação pública estadual do Estado de Goiás prossegue mais forte a cada dia. Neste fim de semana, o Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Goiás (Sintego) irá realizar um ato político-cultural em defesa da educação universal, pública, gratuita e de qualidade e de apoio às ocupações, que vêm ocorrendo em Goiás, contra as Organizações Sociais (OS).
O protesto será realizado neste domingo, dia 17/1, a partir das 9h, na Praça do Trabalhador, em frente à antiga Estação Ferroviária.  A atividade contra a privatização denominada CULTURATA terá música, teatro, dança, circo, skate, artesanato, cinema, cultura afro, cultura indígena, literatura e poesia.
O Sintego pede, a quem participar, levar uma contribuição para assegurar a luta dos (as) estudantes, pais e professores (as) que estão nas 24 ocupações em todo o estado. Todo produto é importante. Os ocupantes precisam de arroz, feijão, macarrão, batata, óleo, abobora, chuchu, melancia, manteiga, farinha, sal, açúcar, massa para bolo, leite, papel higiênico, desinfetante, saco plástico, sabão, etc.
Tentativa de privatização é antiga
Os empresários da educação do Brasil não conseguiram privatizá-la e nem inserir na Constituição Federal de 1988 essa proposta. Uma das primeiras manifestações ocorreu durante a Constituinte, no fim da década de 1980, quando a rede privada sugeriu a compra das vagas ociosas de escolas particulares pelo governo.
Era uma proposta semelhante ao que ocorria no Chile, local onde se usa vouchers – créditos em dinheiro que podem ser usados pelas famílias para matricular seus filhos num sistema de ensino em que predomina a iniciativa privada. A ideia não prosperou, mas começa a ser repensada.
Em 2011, o tema foi tratado em um seminário internacional, realizado no Centro Ruth Cardoso, em São Paulo. Após isso, oito entidades empresariais se juntaram, entre elas a Casa do Saber, Parceiros da Educação e o Instituto Unibanco, e elaboraram o documento A transformação da qualidade da Educação Básica pública no Brasil, no qual apresentam a proposta rechaçada na Constituinte em 1987.
O documento trazia a proposta de se implantar, no Brasil, o chamado modelo das Escolas Chaters (contrato). No documento brasileiro, os empresários argumentam que “o que se propõe é incentivar a criação de arcabouços institucionais e normativos para regular os diferentes graus de participação de instituições não governamentais, com e sem fins lucrativos, na gestão de escolas ou sistemas de ensino público (…)” .
Para execução desse projeto, os pesquisadores propuseram a extensão do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) para as escolas privadas para que elas pudessem também receber financiamento público, e citaram como precedente o programa ProUni, que troca créditos fiscais do governo por vagas no ensino superior para jovens de baixa renda.
Vale lembrar que, no Brasil, a educação básica pública e gratuita atende à 86% da população em idade escolar. Diane Silvers Ravitch – uma historiadora da educação, analista política educacional, e professora pesquisadora na Universidade de New York University’s Steinhardt –Escola de Cultura, Educação e Desenvolvimento Humano – divulgou, em seu blog (confira aqui o blog da historiadora), um documento em que denuncia a falência das Escolas Chaters na Carolina do Norte, EUA.
No relatório (confira aqui), a pesquisadora informa que, após 12 de uso, o governo escondia o fracasso do modelo naquela unidade da confederação. Nas conclusões os autores são mais claros quanto à segregação dos estudantes. Confira a seguir um dos trechos do relatório:
“Uma característica definidora das escolas charters é que elas introduzem um forte elemento de mercado na educação pública. Neste artigo, vamos examinar a evolução do sector das escolas charters na Carolina do Norte entre 1999 e 2012 através da lente do modelo de mercado. Nós examinamos as tendências do mix de alunos matriculados em escolas charters, o desequilíbrio racial das escolas charters, padrões de qualidade de estudante emparelhados pela composição racial das escolas, e a distribuição dos ganhos de desempenho em pontuação de teste, comparados com aqueles em escolas públicas tradicionais. Além disso, usamos modelos de efeitos fixos de estudantes para examinar medidas causais plausíveis de eficácia da escola charter. Nossos resultados indicam que as escolas charters na Carolina do Norte estão cada vez mais servindo aos interesses dos estudantes brancos relativamente capazes em escolas racialmente desequilibradas, e que apesar das melhorias no setor de escolas charters ao longo do tempo, as escolas charters ainda não são mais eficazes, em média, do que as escolas públicas tradicionais”.
O Sintego, por sua vez, pontua alguns prejuízos que a educação pública e gratuita brasileira e as categorias de trabalhadores da educação irão obter com a privatização via OS.
Concurso público
Um dos prejuízos é que a gestão por OS acaba com o concurso público. O concurso público como meio para acesso às vagas de emprego no Estado é uma das conquistas dos (as) trabalhadores (as) do serviço público na Constituição de 1988. “A exigência do concurso público foi para acabar com o clientelismo e para que os trabalhadores em geral, notadamente os da educação, tivessem estabilidade”, afirma o secretário geral do Sintego, Arquidones Bites.
Com as OS, o governo quebra a Constituição e implantará a rotatividade intensa entre trabalhadores da educação. Há seis anos o governo do Estado de Goiás não promove concurso público para professor das escolas estaduais.
Salário e fim do sindicato
O modelo de gestão por OS vai trazer para os (as) trabalhadores (as) pelo menos dois grandes prejuízos nos seus salários. O primeiro: os trabalhadores que vão ser contratados pela OS não vão receber o piso salarial. O segundo: eles não terão o direito à carreira.
“Os trabalhadores efetivos, teoricamente, não terão redução salarial porque a Constituição Federal não permite. Porém, vai dificultar a nossa luta porque esse tipo de coisa divide a categoria. Ela terá, no meio dos trabalhadores da educação da rede estadual, três categorias: uma que é o contrato feito pela própria Secretaria de Educação que não serão ligados às OS; os contratos das escolas de OS; e os efetivos da educação que são por concurso”, explica o sindicalista.
Ele diz que no mesmo serviço haverá, no mínimo, três tipos de contratação, acaba formando três categorias e, isso, enfraquece a luta, que é o propósito do governo do Estado de Goiás e de qualquer governo ligado ao empresariado da educação: enfraquecer o sindicato e a categoria por buscar os seus direitos.
Ensino-Aprendizagem
Outro grande prejuízo é no campo do ensino-aprendizagem. “Entendemos que à medida que se terá uma rotatividade de professor, haverá a diminuição da qualidade do ensino. Além disso, defendemos que o (a) professor (a) tenha incentivo para estudar. No caso desse (a) professor (a) que contratado por OS, ele é temporário, se o governo oferecer um aperfeiçoamento, mesmo que ele faça esse aperfeiçoamento, não irá ser aproveitado posteriormente, visto que o (a) professor (a) logo terá de sair porque ele não é efetivo do serviço público de educação”, explica o secretário geral do Sintego.
Eleição para diretor de escola
A eleição para diretor será um dos primeiros prejuízos. Importante para a categoria docente, a eleição para diretor será duramente prejudicada com a contratação das OS. “Depois de muita luta, conquistamos o direito de eleger o diretor de escola. Hoje, o diretor de escola é eleito pela comunidade escolar”, diz o sindicalista.
Ele informa que “a secretária de Educação de Goiás disse que o diretor eleito vai continuar. A diretoria do Sintego explica que os diretores eleitos recentemente vão continuar porque será difícil, neste primeiro momento, ser retirados, porém, no futuro, a gente não sabe se vai ter eleição”.
O sindicalista diz ainda que esses eleitos e que estão hoje no cargo de diretor vão perder a condição de gestor. “Quem vai contratar, hoje, por exemplo, quem contrata é o estado e quem faz a modulação é o diretor. No caso da OS, o diretor estará lá de fantoche porque quem vai, realmente, fazer a modulação será a OS, a empresa contratada pelo governo. Ou seja, quebra outra conquista da categoria docente. O diretor não terá mais autonomia para gerir a escola. A OS, portanto, vem para ferir os princípios da educação pública de qualidade”, assegura.
Pagamento de mensalidade
Outra preocupação do Sintego é com a completa privatização de educação pública com exigência de pagamento de mensalidade dos (as) estudantes. “Neste primeiro momento, em todas as propagandas, o governo diz que não haverá pagamento de mensalidade. Mas, para adotar o modelo com aceitação popular, o governo dissemina uma publicidade institucional que não diz inteiramente a verdade. Tanto é que não aceitou em nenhum momento realizar audiências públicas para aprofundar o debate para conceituar e esclarecer todas as dúvidas sobre este modelo de gestão”, afirma Bites.
Assim, na avaliação do sindicalista, “nesse primeiro momento, não vai pagar, mas receamos que nos anos seguintes isso ocorra como tem ocorrido com as chamadas “escolas militares”. Atualmente, o Estado de Goiás já está com 25 escolas militares. As escolas públicas estaduais transformadas em escolas militares estão cobrando taxas altas pelos uniformes e outras coisas. No primeiro ano, não cobra, mas no ano seguinte, certamente vão cobrar mensalidade dos estudantes. São taxas a serem cobradas da comunidade”, denuncia.
Corpo administrativo
Há 16 anos o governo do Estado de Goiás não realiza concurso público para contratação de pessoal administrativo nas suas escolas. Isso não foi coincidência. O governador Marconi Perillo oficializa isso com as OS. “Na verdade, os (as) trabalhadores (as) da educação já estão sendo penalizados em Goiás há 16 anos, a OS vem oficializar isso. Ou seja, acaba com a expectativa da realização de concurso público para esse setor. Se não tinha antes, agora, com as OS, é que não haverá mesmo concurso público”, afirma Bites.
O sindicalista diz ainda que “o Estado de Goiás atravessa a quarta gestão do governo tucano de Marconi Perillo. Isso que está acontecendo é uma política neoliberal e vem ocorrendo nos sucessivos mandatos do PSDB que há mais de 20 anos está no poder, em Goiás. Essa privatização está orquestrada há muitos anos”.
Marconi Ferreira Perillo Júnior (Goiânia, 7 de março de 1963) é um político brasileiro, filiado ao Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). É o atual governador de Goiás, estando em seu quarto mandato. Ele foi governador nos seguintes mandatos: 1999 a 2002, 2003 a 2006, 2011 a 2014, e, atual mandato que começou em 2015 vai até 2018.
Com informações de noticiário de várias mídias da internet, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e do blog Avaliação Educacional – Blog do Freitas
Confira a seguir as matérias que estamos produzindo:
Decreto de Rollemberg de 30 de dezembro visa à privatização dos serviços públicos
Governos neoliberais lançam propaganda para dizer que adoção de OS não é privatização
Governador de Goiás inicia, em Anápolis, a privatização das escolas da rede pública estadual
Goiás e São Paulo atuam articulados para privatizar a educação