Você tem fome de quê?

Por Rodrigo Rodrigues, presidente da CUT-DF

Estudo do Dieese mostra que, para a maioria dos trabalhadores da capital federal,
a relação entre cesta básica e salário é uma conta que não fecha

Qual item de supermercado você deixou de comprar neste mês porque não coube no orçamento? Se você é trabalhador ou trabalhadora, o preço dos alimentos é um dos problemas da sua vida financeira. Para a maioria de nós, a relação entre cesta básica e salário do mês é uma conta que não fecha.

De um lado temos as estratégias de produção do agronegócio, voltadas ao mercado internacional. A atuação desse setor dificulta que as políticas públicas que garantam a segurança alimentar possam se consolidar. Além disso, ainda temos a enorme desigualdade social, gerada, sobretudo, com a concentração de renda nas mãos de muito poucos. Estes são fatores que refletem nos preços estampados nas gôndolas dos supermercados e vão contra os rumos da política socioeconômica adotada pelo governo federal; o outro lado dessa disputa entre o lucro e a segurança alimentar.

Para o povo do Distrito Federal, a situação vem se agravando. Estudo realizado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) mostra que, em agosto deste ano, das 17 capitais pesquisadas, apenas uma apresentou aumento no valor da cesta básica: Brasília. Em todas as outras, o valor conjunto dos alimentos essenciais diminuiu.

No ranking das capitais do Brasil com a cesta básica mais cara, Brasília subiu mais uma posição em comparação com o mês de julho deste ano, e está em sexto lugar. Aqui, quem comprou (ou quis comprar) os 13 itens básicos para se alimentar durante um mês, teve (ou teria) que desembolsar R$ 689,98.

A variação do preço da cesta básica de julho para a gosto foi de 0,35%. Mas antes de afirmar que este é um percentual pequeno, é importante analisar a conjuntura colocada para as trabalhadoras e os trabalhadores do Distrito Federal.

Uma das principais características socioeconômicas do DF é a disparidade de renda. Em regiões administrativas como o Lago Sul, por exemplo, a renda mensal é uma das maiores do Brasil. Em comparação, no Sol Nascente, a maior favela do país, a renda de uma família no mês é menor que um salário mínimo.

É fato que aqui no DF há um número maior de servidores púbicos do que no resto do Brasil: 22% dos trabalhadores no emprego formal estão no funcionalismo, segundo a Companhia de Planejamento do DF (Codeplan). Mas a grande maioria ainda está no subemprego, na informalidade, atuando como autônomos em carrinhos de cachorro quente, em pequenas tendas ao lado de paradas de ônibus, vendendo bolo e marmita na rua.

A Pesquisa de Emprego e Desemprego no DF (PED-DF) ainda mostra que, em maio deste ano, eram 277 mil pessoas desempregadas, um número que tem em sua maioria, jovens e negros.

Diante dos dados, é possível vislumbrar quão prejudicial é qualquer variação para cima no preço da cesta básica. De acordo com o Dieese, os R$ 689,98 pagos em 13 itens alimentares básicos representam mais de 56% do total de um salário mínimo, ou seja, mais da metade do que recebem no mês milhares de trabalhadores e trabalhadoras do DF. E o mais assustador: pela pesquisa, os produtos adquiridos são suficientes para alimentar apenas um adulto durante 30 dias. A pesquisa do Dieese ainda mostra que, para comprar uma cesta básica (estamos falando de arroz, feijão, batata, tomate), o trabalhador e a trabalhadora do DF precisam trabalhar 115 horas: mais da metade de um mês de trabalho para quem tem jornada de 8 horas diárias.

É incontestável que a valorização do salário mínimo, com ganho real, como foi neste ano, é uma das chaves para garantir que o povo possa colocar comida no prato. Entretanto, há outras ações imprescindíveis para que se chegue a esse resultado.

Uma delas é a discussão sobre os estoques reguladores de alimentos, que são mecanismos de estabilização do preço dos itens da cesta básica, pois garantem o abastecimento de alimentos em situação de escassez ou de aumento de preços.

Também é urgente questionar e combater o atual modelo do agronegócio: altamente voltado para a exportação, o que diminui a oferta doméstica e eleva o preço dos alimentos no mercado interno; monopolizado; com alto custo de produção; monocultor. Tudo isso reflete na elevação do preço de alimentos básicos.

É preciso criar cadeias globais produtivas, criar tecnologias de produção de alimentos e, sobretudo, valorizar a agricultura familiar, que gera emprego, renda e dinamiza as economias locais.

Indigna ter a certeza através de prova numérica que o direito à alimentação vem sendo negado ao povo do DF e do Brasil, no país que é uma das maiores produções alimentares do mundo. O sentimento, entretanto, torna-se combustível para fazer a luta por emprego, renda, alimentação digna e saudável, lazer, saúde, educação, habitação.

A gente quer viver e não apenas sobreviver!

“A gente não quer só comida. A gente quer comida, diversão e arte.”

Vamos à luta!

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