“Só vamos sair daqui quando o Alckmin anunciar que desistiu”

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), revestido de sua aparente inabalável imagem pública – sempre blindada pela mídia paulista -, que resistiu a escândalos de corrupção, crise hídrica, obras morosas, míngua linha férrea e a constante violência policial, acreditou que passaria incólume por mais uma atitude tirânica. Ordenou, sem qualquer diálogo prévio com a sociedade, o fechamento de 94 escolas no estado.
A resposta foi quase imediata. Duas semanas após o tucano anunciar que fecharia, de fato, as unidades de ensino, os estudantes reagiram. Na última terça-feira (10), o colégio Fernão Dias, em Pinheiros, zona oeste de São Paulo, foi ocupado pelos alunos que a frequentam. Nesta terça-feira (12), pouco mais de 48 horas após a primeira ação, já eram seis escolas ocupadas.
As outras unidades de ensino ocupadas são: A Escola Estadual Castro Alves, na zona norte, Escola Estadual Salvador Allende, na região de Itaquera, Escola Estadual Valdomiro Silveira, Escola Estadual Nelson Pizzoti e Escola Estadual de Diadema, na Grande São Paulo.
A ocupação
A Escola Estadual Salvador Salvador Allende, em um bairro pobre da zona leste da capital paulista, está entre as 94 que Alckmin anunciou que fechará. Kawane Priscylla, de 15 anos, é uma das 494 pessoas que estudam na unidade e que seguem céticas sobre seus futuros.
Kawane acorda 40 minutos antes do início da aula e segue caminhando até a unidade, junto com outros colegas. Por conta da falta de diálogo do governo com a população, desconhece seu futuro. Por isso, a estudante decidiu intervir.
“Tentamos protesto na rua, fomos até a frente da Delegacia de Ensino, pedimos reunião aqui na escola com o pessoal da Delegacia de Ensino, mas nada foi feito. Então, decidimos ocupar a escola”, explica Kawane, que faz um exercício de suposição para explicar o que acredita ser o seu futuro. “Vão me mandar para uma escola longe. Por conta disso, vou ter que acordar muito mais cedo e pegar ônibus. Minha sala já é cheia, fechando escolas em todos os lugares, é claro que vai ter sala superlotada. Além disso, aqui já conheço todo mundo, na nova escola não vou conhecer ninguém.”
A falta de diálogo é lembrada, também, pela professora de Matemática do colégio Salvador Allende, Edinilda Ribeiro, que afirma apoiar a manifestação dos alunos. “É justo que eles ocupem a escola. Antes de fechar qualquer escola, o governador precisa explicar para os professores e alunos o que vai fazer com a vida deles”, afirmou a docente.
Por volta das 5h, cerca de 20 alunos quebraram os cadeados originais da escola Salvador Allende e os substituíram. Desde então, começou a confecção de faixas e a recepção aos estudantes que chegavam para o turno que começa às 7h. “Não houve resistência, todos os alunos aderiram e estamos tomando todas as decisões em assembleias. É uma sacanagem o Alckmin fechar a minha escola”, afirma Nicole de Assis, de 16 anos.
“Nós somos dessa escola e aqui vamos ficar. Uma escola que chama ‘Salvador Allende’ tem que resistir e lutar pelo que acredita. Por isso, só vamos sair daqui quando o Alckmin anunciar que desistiu”, declarou Kawane.
Solidariedade
O diretor do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), Silvio de Souza, esteve na frente do colégio Salvador Allende, manifestando apoio à ocupação. “É legítima e importante. Precisávamos de uma posição radical contra o projeto de fechamento das escolas. O impacto dessa medida será brutal para professores e alunos”, afirmou o dirigente sindical, que lembrou do protagonismo da juventude. “Eles são os atores principais e assim deve seguir sendo. No contato com a população, temos sentido a revolta contra esse governo. A máscara do Alckmin está caindo.”
O desgaste da imagem do governador também foi comentado pela cientista política Rosemary Segurado, que é mãe de uma das alunas que ocupou o colégio Fernão Dias. “Essa manifestação é maravilhosa. Uma alegria e emoção, ver jovens defendendo uma escola pública de qualidade. Uma medida dessa mostra como o governo paulista entende a educação. Fechar escolas é algo que precisa ser comunicado e dialogado, não pode ser feito arbitrariamente”, afirmou.
O deputado estadual João Paulo Rillo (PT) foi até o colégio manifestar seu apoio e criticou a condução do caso pelo governador. “Convidado a debater com a juventude, o Alckmin, que poderia mandar qualquer assessor ou secretário, enviou a PM. O Alckmin precisa vir aqui resolver esse problema, foi ele quem colocou a faísca na gasolina, ele quem decidiu enfrentar pais e alunos”, explicou o parlamentar, que respondeu positivamente, quando perguntado sobre possíveis novas ocupações. “Não sei dizer se haverá, mas o clima é esse, a juventude está revoltada com o fechamento das escolas e está agindo. Inclusive, com mais essa inovação, que deve servir de lição para a esquerda tradicional.”
Foto: Roberto Parizotti