Sinpro homenageia Carlos Mota e honra seu legado
Dezessete anos não foram suficientes para apagar a memória e a luta do professor Carlos Mota, assassinado em 2008 por sua incansável defesa da educação pública socialmente referenciada. Seu legado, vivo nas mentes e corações de todos e todas que passaram pela sua trajetória, agora se expande com o documentário “Carlos Mota – entre arquivos e lembranças”, produzido por seu filho, Otávio Mota.
A obra, que nasceu da dor do luto de Otávio, foi apresentada na noite dessa terça (6/5), no auditório do Sinpro. A atividade recebeu a família e amigos do educador, além de sindicalistas e alunos do Centro Educacional do Lago Oeste, onde Carlos foi diretor. Hoje, a unidade leva o nome do docente.
“Histórias como a de Carlos Mota merecem ser eternizadas para que a gente nunca se esqueça de que a educação transforma vidas. Carlos mudou a vida de muita gente por meio da educação, que tanto defendia. Era um professor por vocação e espalhava amor por onde passava”, disse a diretora do Sinpro Márcia Gilda.

Além da exibição do documentário, a homenagem do Sinpro ao professor foi marcada também pela inauguração da Praça Carlos Mota, em frente à entrada do auditório Paulo Freire. “Nosso agradecimento e homenagem ao professor Carlos Mota, pela coragem inabalável de dedicar a vida à construção de uma educação pública que seja instrumento de justiça e transformação social. Seu legado de luta e esperança permanece vivo, inspirando todos que acreditam em uma sociedade livre da violência e construída sobre os alicerces da dignidade e do saber”, lembra a placa afixada no local que recebe pessoas da região.
“O Sinpro é o lugar que a gente recebe conforto desde sempre. Então, estar de volta em casa, no Sinpro, deixa a gente muito feliz. Lembrar de Carlos Mota é lembrar da necessidade de valorização da cada vez mais do professor”, disse a companheira de vida de Carlos, Rita de Cássia.
Emoção
O auditório do Sinpro estava lotado para homenagear Carlos Mota. O clima foi de emoção. O professor que acreditou e lutou para que a prática do ensino-aprendizagem ultrapassasse os muros das escolas segue incentivando novos educadores.
Inúmeras foram as palavras usadas pelos participantes para descrever Carlos Mota. Pai. Educador. Esposo. Amigo. Brilhante. Inspiração. Todas essas nuances foram relembradas por seu filho Otávio no documentário que foi seu trabalho de conclusão de curso. Ali, entre uma entrevista e outra, ele pôde conhecer, a fundo, o homem que teve a vida ceifada tão precocemente.
“Eu sempre carreguei esse luto, essa dor comigo durante muitos anos, e a forma que encontrei para colocar pra fora foi por meio desse documentário”, disse Otávio, que durante as pesquisas descobriu a grandiosidade do educador Carlos Mota.
“Foi apresentado pra mim um idealista, um poeta, alguém que usava e abusava da poesia para poder ensinar. Ensinar através do amor, do carinho e da prática. Ele morreu com um tiro no peito, e o buraco não foi só no peito dele. Foi no peito de toda uma comunidade. Com esse documentário o buraco pode dar uma diminuída, porque a dor ainda está presente”, disse.
Trabalho de memória
Para Otávio, o documentário é, acima de tudo, um trabalho de memória, para reforçar o legado de pedagogos que marcaram gerações.
“Hoje em dia, neste mundo bipolarizado, se a gente fala o nome de Paulo Freire, por exemplo, somos chamados de comunista. E isso acontece justamente por uma falta de memória sobre os nossos educadores. Carlos Mota, meu pai, assim como Paulo Freire e tantos outros educadores, merece ser lembrado, estudado e celebrado”, disse.

Para a diretora da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) Rosilene Corrêa, há várias semelhanças entre Freire e Mota, sobretudo o amor e a luta. “O legado que Carlos Mota deixou nos traz aqui e nos faz refletir todos os dias sobre a educação que transforma vidas. Nós tínhamos um Paulo Freire entre nós. Carlos nos instigava. O que a gente sentia era uma educação viva” afirmou a
Mais que um educador
Carlos Mota foi lembrado também como uma pessoa que tinha essencialmente a sabedoria de ouvir a todos. “Ele foi uma pessoa brilhante que infelizmente teve a vida ceifada de maneira muito breve, mas que deixa um legado para a educação no sentido da importância de saber ouvir as pessoas e da participação da comunidade no processo de ensino como um todo”, disse Marco Mota, irmão do professor.
O diretor de Relações Internacionais da CUT, Antonio Lisboa, que conheceu Carlos Mota na militância do movimento estudantil, lembrou que o docente foi um homem além do seu tempo. “O que me chamou a atenção no Carlos foi que ele tinha um olhar amplo do mundo. Um olhar de defesa das causas justas do mundo, não só na educação. Os temas que debatemos hoje, ele já falava há 20, 30 anos”, disse o sindicalista.
Para Jacy Peninha, professor e amigo pessoal de Carlos, o educador sempre instigou as pessoas ao seu redor a pensar. “Essas coisas ficam na memória e são um fio condutor das coisas que a gente faz na vida. O Carlos vai estar sempre na minha vida, nas minhas orientações e sempre vou estar revisitando essa amizade. Ele foi um amigo presente, um amigo para sempre”, disse.

Carlos Mota
Mota foi assassinado no dia 20 de junho de 2008, com um tiro no peito, dentro de casa, na região do Lago Oeste. Segundo investigação policial, a ação foi motivada por vingança. Dias antes, o docente havia repreendido um traficante que vendia drogas e assediava alunos(as) da escola. O acusado do homicídio foi condenado a 20 anos de prisão.
Em décadas de atuação, o docente marcou a educação pública do DF. Ele acreditava que o processo ensino-aprendizagem não se limitava ao espaço da sala de aula, pelo contrário, abrangia todos os aspectos da vida dos estudantes.
Um ano após a morte de Carlos Mota, a Câmara Legislativa do DF concedeu o título de cidadão honorário de Brasília ao professor, e o Centro de Ensino Fundamental do Lago Oeste mudou de nome: passou a se chamar Centro de Ensino Fundamental Professor Carlos Mota. O educador também foi tema do primeiro Concurso de Redação do Sinpro, criado no ano de seu assassinato.
Assista ao documentário “Carlos Mota – entre arquivos e lembranças” aqui.