Sinpro-DF realiza lançamento da Campanha Abraço Negro

“A sociedade brasileira foi forjada na lógica do racismo institucional e estrutural. O povo negro do Brasil sempre teve de lutar contra as tentativas institucionais de calar os grupos populacionais que não se enquadram no padrão embranquecido imposto desde a fundação desta sociedade”, disse Catarina de Almeida Santos, professora da Universidade de Brasília (UnB), na abertura do lançamento da Campanha Abraço Negro, nesta quinta-feira (25), no Auditório Paulo Freire, do Sindicato dos Professores no Distrito Federal (Sinpro-DF).

Na palestra intitulada “A militarização na educação e seus efeitos à política de combate ao racismo”, a professora destacou que a escola, sobretudo a escola pública, gratuita, laica e de qualidade socialmente referenciada, que é um dos principais locais de interações sociais cotidianas, ainda está marcada pelas relações ofensivas, abusivas e se colocam como espaços de desigualdade e exclusão.

Ela disse que há vários levantamentos e estudos sobre o tema do racismo e violência de gênero que mostram o aumento, a cada dia, de escolas de Ensino Fundamental, Médio e Superior como palco de violências raciais, misóginas, sexistas, LGBTfóbicas. No entendimento da professora da UnB, essas violências estão nas ruas e em todas as instituições do Brasil e destacou a militarização das escolas públicas e gratuitas como mais uma das várias tentativas de silenciamento e criminalização da população negra e pobre por nega a identidade e as subjetividades desse segmento da população.

A Campanha Abraço Negro é uma atividade de combate ao racismo nas escolas públicas, promovida pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) e executada pelos sindicatos filiados. É uma campanha anual que, este ano, começou nesta quinta (25) e terminará no dia 20 de novembro. Ela incentiva professores(as) da rede pública de ensino a realizar projetos pedagógicos de combate ao racismo nas escolas públicas e gratuitas.

“Trata-se de uma iniciativa do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado de Goiás (Sintego) e, com o sucesso obtido, foi incorporada e nacionalizada pela CNTE”, informa Jucimeire Barbosa, da Secretaria de Raça e Sexualidade. O Sinpro-DF manteve, na edição de 2019 da campanha, a mesma temática da edição de 2018 sobre o assassinato brutal da vereadora carioca do PSOL, Marielle Franco, no ano passado.  “Porque é um crime hediondo que não foi elucidado ainda. Precisamos saber quem mandou matar Marielle”, disse Élbia Pires de Almeida, coordenadora da Secretaria de Assuntos de Raça e Sexualidade e da Mesa de abertura da campanha.

Letícia Montandon, diretora da mesma secretaria, informa que a escola que desejar aderir e realizar a Campanha do Abraço Negro como atividade pedagógica pode entrar em contato com o sindicato no telefone 3343-4200 e com qualquer uma das diretoras da Secretaria de Raça e Sexualidade. “Pode falar também com algum diretor do Sinpro-DF que visite a sua escola, que nos encaminhará para conversar com a equipe pedagógica e, assim, apresentarmos o projeto e levar uma pasta com um extenso material didático mostrando como aplicar a Campanha Abraço Negro nas disciplinas e nas atividades pedagógicas, além de propostas de palestrantes e uma estrutura completa para ajudar essa escola a realizar uma educação antirracista durante o ano todo, de acordo com a Lei nº 10.639/03 e Lei nº 11.645/08, e não só na semana do 20 de Novembro, Dia da Consciência Negra.

Confira, a seguir, um pingue-pongue para o site do Sinpro-DF com a professora Catarina Santos.

Entrevista:

Catarina de A. Santos

Sinpro-DF – Qual o impacto da militarização das escolas em relação à questão étnico-raciais que é o que está sendo mais atacado e comprometido com as intervenções militares nas escolas do Distrito Federal?
Catarina de A. Santos – O que acontece é que a escola militarizada nega a diversidade. Dentre outros problemas, é a escola da padronização e, ao padronizar, força a perda das identidades. Com isso, a gente perde as identidades. A escola militarizada ataca, principalmente, a população negra, que é a que foge do padrão socialmente estabelecido. Então, as pessoas negras, cada vez mais, estão brigando por garantir a sua identidade, como são, de ter orgulho de ser da forma que são, e a escola militarizada padroniza e, ao fazer isso, nega o diverso e, quando faz isso, a população negra e as manifestações étnico-raciais desaparecem, tornando-se invisibilizadas. A escola militarizada mata a diversidade.

Sinpro-DF – Qual o quadro evolutivo das cotas raciais nas universidades públicas 15 anos  após a primeira delas, a Universidade de Brasília (UnB), tê-la implantado?
Catarina de A. Santos – Depois da Lei de Cotas houve um aumento do ingresso da população negra nas universidades federais. A população brasileira está separada entre preta e parda, mas as cores preta e parda são as cores que compõe a população negra. A taxa de ingresso dessa população nas universidades públicas vem num crescendo desde 2004, quando a UnB, primeira universidade a adotar as cotas raciais, iniciou esse tipo de política afirmativa. Mas isso não significa que não volte a cair porque a Lei de Cotas é destinada às instituições públicas. Por exemplo: se a gente conseguisse implantar a Meta 12 do Plano Nacional de Educação, que fala da elevação do número de vagas na educação superior e 40% dessas novas vagas nas instituições públicas, isso faria, por exemplo, com que entrasse mais negros e negras, uma vez que existe um percentual destinado. Mas não só negros e negras, mas também para a população de baixa renda, povos indígenas etc. Isso elevaria mais a entrada de negros e negras na universidade.

Contudo, como há uma crise, que se diga de passagem, eletiva, para o campo da educação que pode fazer com que a universidade não expanda, e isso coloca em risco o aumento da população negra na universidade. Na UnB, que tem a política de cotas desde 2004. Então, em 2006, eu, negra, estou lá na UnB como 6,7% dos estudantes que entraram por cotas e, em 2016, esse número sobe para 28%. Ainda é pouco porque temos 50% da população negra ou parda, assim, a lógica deveria ser 50%. E até hoje esse índice tem aumentado. Mas isso não significa que não venha cair porque quanto menos vagas se tenha na universidade pública, menos população negra teremos lá dentro.

Sinpro-DF – Para a senhora, qual o significado da expressão e dessa atividade denominada Abraço Negro?
Catarina de A. Santos – A questão do Abraço Negro é exatamente o fortalecimento da identidade, a união da população negra, mas também isto: a escola compreender a questão que perpassas a população negra dentro da escola; trabalhar isso; combater os processos de discriminação; os racismos; e o racismo também entre meninas e meninos porque também isso pode mudar a configuração. Quando penso no Abraço Negro, penso nesse acarinhamento da questão negra, ou seja, a escola abraça a população negra, abraça a formação pensada, fincada no antirracismo e no antissexismo e pode incluir mais sujeitos.

Sinpro-DF – Qual mensagem a senhora gostaria de passar para a categoria do magistério público do DF?
Catarina de A. Santos – Para aqueles e aquelas que estão desanimados e desanimadas, animem-se. Lembrem-se daquilo que o educador Anísio Teixeira nos dizia desde a década de 1930: “A educação é o meio para fazer com que o filho do homem se torne homem”, ou seja, é o meio para formar o sujeito. Então, o papel que nós, educadores e educadoras, temos na transformação desta sociedade é muito importante. Para os(as) que estão animados(as), que tragam outros ânimos e que a gente trabalhe na lógica da problematização das questões e não na definição de verdades estabelecidas. Que a gente coloque em questão os problemas que nós temos na sociedade e nos una, cada vez mais, para encarar essa empreitada.

Confira fotos do lançamento: