Síndrome de Burnout: professores e a pandemia do esgotamento

É praticamente impossível encontrar alguma profissão que não tenha sido afetada pela pandemia da Covid-19, que já dura mais de um ano e três meses. Mudanças na rotina, home-office e necessidade de novos aprendizados digitais se tornaram comuns para a maioria dos grupos de trabalhadores.

Os professores, contudo, são alguns dos profissionais que mais sentiram o impacto de todas as mudanças. Durante muito tempo, quem olhava de fora poderia imaginar que o trabalho dos docentes estava mais fácil. Estando todos em casa, menos esforço necessário para aplicar tarefas e colocar ordem na turma. Certo? Não mesmo!

De acordo com a psicóloga Luciane Kozicz Araujo, o número de profissionais da educação que buscaram atendimento e foram diagnosticados com a síndrome de Burnout aumentou perceptivelmente durante o período de pandemia.

“Essa síndrome é o afeto convertido em dor física, então o aumento das dores no corpo tem sido uma queixa constante nos pacientes que procuram a terapia. Esperavam que a pandemia fosse uma corrida de 100 metros e virou uma maratona. Isso tem gerado tensão, medo, fobias, tristeza e solidão. Esse afeto tem aparecido no corpo: dores nas articulações, esgotamento físico e insônia são os principais sintomas”, explica Luciane.

Os motivos para esse esgotamento são muitos, a maioria ligada a um maior número de horas trabalhadas por dia. A impotência diante das precárias condições de trabalho a que estão submetidos, a ausência de muitos alunos no ensino remoto, o fato de não possuírem equipamentos ou mesmo acesso à internet são exemplos do aumento da jornada de trabalho, de acordo com a psicóloga. “Além de inovarem no ensino remoto, precisam preparar material impresso, orientar alunos e pais, ligar para os ausentes, corrigir e verificar se o material está sendo eficiente para o aprendizado”.

A professora Érica* leciona em uma Escola Classe de São Sebastião, no DF, e experimenta sintomas do Burnout há meses, por conta da educação a distância (EAD).

“Eu sinto muita dor de cabeça, no corpo, nas juntas. Tenho a sensação de que fui atropelada. Tanto tempo na frente de um computador, do celular, sentada, sem me movimentar. Tive que procurar ajuda psiquiátrica e psicológica para aliviar as dores, aliviar a tensão, além de precisar me afastar de sala de aula”, relembra.

Para Érica, o desgaste que sente é causado pela necessidade de se desdobrar para atender todos os alunos. A profissional conta que continua em contato direto com as crianças durante todo o horário de almoço e após o encerramento da sua jornada de trabalho, já que o único meio que muitos estudantes têm de acessar a internet é através dos celulares dos pais, que passam o dia inteiro fora de casa a trabalho.

“A gente pensa no aluno, mas esquece de nós mesmos. Nos sentimos um pouquinho pai e um pouquinho mãe dessas crianças”, afirma com emoção. A professora dá como exemplo uma aluna de sua escola que é atendida poucas vezes ao mês, pois os créditos de celular se esgotam rapidamente. Ao dar aula por mensagens de WhatsApp – o único caminho viável em frente a essa dificuldade – a internet acaba em poucos dias, e o contato só é restabelecido na recarga seguinte, ao virar o mês.

As escolas públicas do DF foram fechadas no dia 16 de março de 2020 | Foto Dobrislava/Creative Commons

 

E é dessa maneira que professores brasileiros têm vivido e trabalhado durante a pandemia. Afinal, a vida e o trabalho se tornam uma coisa só. Ansiedade, esgotamento e, como consequência, o Burnout, atacam a mente e o corpo dos profissionais ao longo do último ano.

Contudo, Érica é otimista ao enxergar, no futuro, a volta às aulas presenciais. “O retorno vai ser bem favorável, vai amenizar um pouco esse nosso estresse. Vamos poder ter o contato com o aluno, o contato visual, falar de perto, identificar melhor as dificuldades. O ensino a distância não proporciona esses momentos”, finaliza.

* Nome fictício a pedido da entrevistada

Fonte: Matéria publicada originalmente no https://gpslifetime.com.br/, por Pedro Ângelo Catanhede | Foto capa: Elisa Ventur/UNSPLASH