Retorno 100% presencial de estudantes poderá provocar surto de SIM-P

No dia 30 de outubro, o Governo do Distrito Federal (GDF) comemorou o fato de estar com 80% dos adolescentes da capital vacinados com a primeira dose da Pfizer contra a covid-19. Esse número é um dos dados que levaram o governador Ibaneis Rocha (MDB) a instituir o decreto de retorno 100% presencial dos(as) estudantes da rede pública de ensino.

 

Apesar da boa notícia, ainda assim esse retorno é um risco desnecessário. Pode ser uma sentença de morte para muita gente, incluindo aí as próprias crianças e adolescentes. Na avaliação da diretoria colegiada do Sinpro-DF, isso poderia ser feito com tranquilidade e segurança a partir do ano letivo de 2022.

 

É importante destacar que a vacina é uma maneira de evitar a forma grave da doença e o óbito. Isso significa que uma pessoa vacinada – principalmente as que estão apenas com a primeira dose, como esses 80% dos adolescentes – pode se contaminar, transmitir e até desenvolver a covid-19 na forma grave, afinal, a recomendação médica mundial é completar o ciclo vacinal para garantir a imunização.

 

Além disso, mais da metade dos estudantes da rede pública de ensino é formada por crianças com idade abaixo de 12 anos que ainda não se vacinaram. Não existe vacina para elas. Para essas crianças, basta 1 segundo, o tempo de um abraço, de um espirro, uma tosse, de uma conversa rápida com o(a) coleguinha de escola para se contaminar com novo coronavírus e poucos dias para desenvolver a covid-19.

 

Essa possível vítima poderá ter a vida totalmente modificada para prior por causa dos impactos da doença e, talvez, nem isso porque poderá morrer precocemente. Um transtorno na vida ou uma morte totalmente evitável. Dentre várias previsões médicas sobre os impactos da covid-19, o neuropsiquiatra francês, Boris Cyrulnik, afirma que “os adolescentes mais afetados pela pandemia terão depressão crônica quando adultos“.

 

Levantamento da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) indica que o Brasil registrou 3.561 mortes de crianças e adolescentes de até 19 anos por covid-19 desde o início do surto, em março de 2020. Em todo o ano passado, foram registradas 1.203 mortes por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG). Em 2021, foram 2.293 óbitos. Entre 1º de abril de 2020 e 13 de fevereiro de 2021, o Brasil contabilizou 736 casos e 46 óbitos de crianças e adolescentes pela Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica (SIM-P) associada à covid-19.

 

O site PebMed (Síndrome ligada à Covid-19 é responsável por 46 óbitos de crianças e adolescentes no Brasil – PEBMED) indica que os estados com mais casos SIM-P foram São Paulo (120), Pará (65), Ceará (64), Minas Gerais (62), Distrito Federal (57), Rio de Janeiro (56) e Bahia (56). Rondônia e Amapá não tiveram nenhum caso.

 

Em matéria de março de 2021, a Secretaria de Saúde do GDF informou a existência de 80 casos de SIM-P até aquela data, dos quais, 67 eram de crianças e adolescentes residentes no DF e que a maioria dos casos ocorreu entre a faixa etária de 5 a 9 anos. Segundo a nota, pelo menos 45 casos dos 80 tiveram a confirmação da covid-19 e um óbito pela síndrome de um adolescente de 17 anos. Em setembro, a SES-DF informou que, entre janeiro e setembro de 2021 havia 15 registros de SIM-P no DF.

 

“Vale observar que esse volume de registro da síndrome ocorreu em período de distanciamento social e aulas remotas. Com a 100% presencial, e sem a vacinação das crianças, isso poderá explodir e pôr em risco de vida até pessoas com três doses da vacina”, observa Raimundo Kamir, diretor do Sinpro.

 

A SIM-P, segundo conceituação do site PebMed, é uma rara resposta inflamatória, requer cuidados intensivos que, em casos graves, pode levar ao óbito. Os sintomas incluem alergia, problemas cardíacos e de coagulação no sangue, vômito, diarreia, dor abdominal, febre persistente, erupção cutânea, olhos vermelhos, inflamação e mau funcionamento de um ou mais órgãos.

 

Alguns médicos conceituam a SIM-P como covid-19. A reação apresenta características semelhantes às da doença de Kawasaki e da síndrome do choque tóxico e costuma se apresentar com inflamação sistêmica e sintomas gastrointestinais, evoluindo com complicações cardiovasculares e levando pacientes à falência múltipla de órgãos e choque hemodinâmico.

 

“Precisamos repensar o retorno presencial para evitar um criatório de novas variantes no DF, um 2022 semelhante ao 2021 e milhares de mortes evitáveis. Nesses poucos dias que faltam para o fim do ano letivo, é importante manter o distanciamento, usar máscaras, lavar as mãos e usar álcool 70% em caso de falta de água. Além disso, cabe ao GDF resolver os problemas sanitários da rede pública de ensino, preservar o distanciamento para que a escola não se torne uma fábrica de novas variantes ainda mais resistentes que não sejam combatidas por vacinas”, alerta o diretor.