Relatório sobre contaminação em Barcarena aponta calamidade pública

O deputado estadual Carlos Bordalo (PT), presidente da Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor da Assembleia Legislativa do Pará (Alepa), apresentou à imprensa, nesta segunda-feira (05), o relatório da diligência realizada ao município de Barcarena, no dia 23 de fevereiro, com o objetivo de investigar as causas da lama avermelhada que invadiu comunidades próximas à empresa Norsk Hydro Alunorte, nos dias 16 e 17 daquele mês.
O documento, de 41 páginas, recomenda que seja decretado estado de calamidade pública em Barcarena, assim como a suspensão imediata do tratamento tributário diferenciado concedido à empresa pelo Governo do Estado e o afastamento dos executivos da Hydro por conduta dolosa. O relatório também recomenda que o caso seja denunciado ao Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ONU), à Organização Mundial do Comércio (OMC) e à Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Antes de relatar a visita ao município, Carlos Bordalo fez uma retrospectiva dos desastres ambientais ocorridos em Barcarena desde o ano 2000. Foram cerca de 20 episódios, desde naufrágios que provocaram derramamento de milhões de litros de óleo, até vazamentos de lama vermelha das bacias de rejeito.
“É preciso observar as razões estruturais da crise atual, que remontam a um processo de implementação de complexos minero metalúrgicos dentro de uma dinâmica de frouxidão institucional. Não foram estabelecidos protocolos para antecipar desastres e prever medidas de urgência para acolhimento das populações atingidas. Todos esses acidentes foram graves e comprometeram a sustentabilidade ambiental, provocando inúmeros dramas humanos e prejuízos à população. Já existem estudos da Universidade Federal do Pará sobre Barcarena mostrando que o lençol freático está comprometido, além de relacionar os crimes ambientais a doenças de pele, doenças gastrointestinais e até câncer”, disse o parlamentar.
O presidente da Comissão de Direitos Humanos da Alepa defende que seja decretado estado de calamidade pública em Barcarena, nas esferas federal, estadual e municipal, visando viabilizar ações extraordinárias e dispor rapidamente de recursos para diversas ações, como reconhecer e titular, no âmbito fundiário, os direitos de propriedade dos territórios tradicionais apropriados indevidamente por empresas, garantir uma ampla investigação da condição de saúde ambiental das populações atingidas, realizar a entrega ininterrupta de cestas básicas e assegurar a recuperação dos recursos pesqueiros, entre outras.
“Existe uma crise humanitária de implicações graves, que não podem ser minimizadas com o fornecimento de água ou de cestas básicas. É preciso garantir atendimento médico à população, com a coleta de material de cada indivíduo, para que se tenha a exata dimensão da extensão dessa contaminação no organismo humano. Além disso, é urgente que se execute programas de desenvolvimento social e econômico para essas populações, que foram destituídas dos seus meios de vida e condições de sobrevivência básica”, alertou. “O que vimos em Barcarena foi a população na miséria”.
O relatório também recomenda que o Estado reveja sua política de concessões fiscais, suspendendo imediatamente o benefício concedido à Hydro, de quase R$ 7,5 bilhões até 2030, e que seja realizada uma auditagem nas licenças ambientais do Pará.
“Já houve períodos em que essas empresas mineradoras negociavam licenças ambientais por meio de construção de casas populares. Somente em 2010 o Estado aprova sua primeira lei para regulamentar esses empreendimentos e suas bacias de rejeitos altamente poluentes. Basta lembrar que a Europa não aceita empresas deste tipo, nem a própria Noruega”, observou. “Não sou contra a atividade mineradora, mas é preciso garantir que essas empresas respeitem minimamente a legislação, e que sejam fiscalizadas com rigor, para preservar não só o meio ambiente, mas sobretudo a vida dos paraenses”.
Carlos Bordalo avalia que a atual crise em Barcarena é apenas a ponta do iceberg de um problema mais grave, que compromete a qualidade de vida e a sobrevivência humana não somente naquele município, mas em todas as comunidades que vivem no entorno de grandes projetos de mineração no Estado.
“Estamos vivenciando uma crise de sustentabilidade desse modelo de exploração. Barcarena está nos mostrando que, se não arrumarmos a casa agora, teremos crises muito piores e mais graves no futuro”.
O relatório da diligência teve contribuições dos deputados estaduais Lélio Costa (PCdoB), Jaques Neves (PSC) e Airton Faleiro (PT). A reportagem sobre a diligência pode ser conferida aqui. E o relatório pode ser baixado na íntegra neste link.