Quem comemora o 13 de maio, mesmo?

 

Os movimentos negros no Brasil não têm dia 13 de maio de 1888 como marco. Nessa data, o que deve ser lembrado é que houve todo um processo de lutas, e não concessão ou generosidade de membro algum da Coroa Portuguesa. A referência para a luta do povo negro é o 20 de novembro, Dia da Consciência Negra, que reivindica a trajetória de Zumbi e Dandara, líderes do Quilombo dos Palmares.

134 anos após a assinatura da abolição, ainda não há igualdade, e a vida da população negra brasileira é marcada pela violência, pela exclusão e pelo encarceramento. “Negros e negras foram escravizados por mais de 300 anos no Brasil. Não houve políticas de inclusão quando da abolição, o que aprofundou a marginalização e a discriminação”, pontua Márcia Gilda, diretora da Secretaria de Raça e Sexualidade do Sinpro-DF. “Mecanismos como as cotas, por exemplo, somente começaram a acontecer mais de um século depois”, completa ela.

 

Ancestralidade…

Neste mês de maio, o TV Sinpro apresentou dois programas com temática especial referente à luta e à ancestralidade negras.

No dia 11 de maio, o programa transmitiu o documentário Baobá, produzido pela Secretaria de Raça e Sexualidade e pela Secretaria de Imprensa e Divulgação do Sinpro-DF. Ambientado no plantio de baobás na Chácara do Sinpro, o minidocumentário foi produzido em novembro de 2021 quando, em comemoração ao mês da consciência negra, o Sinpro-DF criou o Recanto dos Baobás em sua chácara, em homenagem a mulheres negras brasileiras que protagonizaram a luta antirracista.

Em nove minutos, a obra traz entrevistas com especialistas e militantes históricos(as) da luta antirracista no Distrito Federal, que falam sobre a importância do Baobá para os povos africanos no continente e na diáspora.

Também foi exibido um vídeo sobre a ação realizada no Centro de Ensino Médio 01 de Sobradinho, onde estudantes se somaram ao projeto de plantio de baobás, desenvolvido pelo professor André Bento. O diálogo aconteceu diante dos três baobás mais antigos do DF, localizados em frente à Embrapa, na Asa Norte.

… e a interminável luta por igualdade

No dia 4 de maio, o programa da TV Sinpro teve como tema o racismo, a partir do lamentável caso sofrido pelo estudante Mateus Antunes, de 26 anos, vítima de injúria racial em redes sociais.

A mãe do rapaz, Muria Antunes Damasceno, contou em depoimento emocionante que a primeira injúria de que Mateus foi vítima foi ainda aos 3 anos de idade, quando chegou em casa e disse aos pais que os coleguinhas não queriam brincar com ele porque ele era “preto de gengivas pretas”. Muria lembra que foi o próprio filho quem consolou os pais que estavam aos prantos, dizendo: “Mamãe, deixa! Eles não sabem que se eles cortarem a minha pele, [vão ver que sangue é] da mesma cor!”

A injúria sofrida pelo rapaz, relatada no programa TV Sinpro de 4 de maio, é objeto de inquérito instaurado na 20ª DP. O advogado de Mateus, Dr. Elias Soares, também estava presente ao TV Sinpro, e lembrou que “o racismo não está presente na pele, mas na cabeça de todos nós”.

Márcia Gilda, que conduziu a entrevista, advertiu a todos da diferença entre o racismo e o bullying: enquanto o bullying desconstrói, o racismo desumaniza, pois trata um ser humano como bicho.

Poesia, sempre

Neste 13 de maio, é importante pensarmos no protagonismo de Oliveira Silveira, poeta afro-brasileiro que, junto com o grupo Palmares, idealizou o 20 de novembro como data simbólica do movimento negro. Deixamos, para reflexão, a íntegra do poema 13 de maio, cuja primeira estrofe ilustra este texto:

 

Treze de Maio
 
Treze de maio traição,
liberdade sem asas
e fome sem pão
 
Liberdade de asas quebradas
como
…….. este verso.
Liberdade asa sem corpo:
sufoca no ar,
se afoga no mar.
Treze de maio – já dia 14
o Y da encruzilhada:
seguir
banzar
voltar?
Treze de maio – já dia 14
a resposta gritante:
pedir
servir
calar.
Os brancos não fizeram mais
que meia obrigação
O que fomos de adubo
o que fomos de sola
o que fomos de burros cargueiros
o que fomos de resto
o que fomos de pasto
senzala porão e chiqueiro
nem com pergaminho
nem pena de ninho
nem cofre de couro
nem com lei de ouro.
O que fomos de seiva
…………………..de base
………………… de Atlas
o que fomos de vida
…………………..e luz
chama negra em treva branca
…………………..quem sabe só com isto:
 
que o que temos nós lutamos
para sobreviver
e também somos esta pátria
em nós ela está plantada
nela crispamos raízes
de enxerto mas sentimos
e mutuamente arraigamos
….quem sabe só com isto:
que ela é nossa também, sem favor,
e sem pedir respiramos seu ar
….a largos narizes livres
bebemos à vontade de suas fontes
… a grossas beiçadas fartas
tapamos-destapamos horizontes
….com a persiana graúda das pálpebras
escutamos seu baita coração
….com nosso ouvido musical
e com nossa mão gigante
batucamos no seu mapa
….quem sabe nem com isso
e então vamos rasgar
a máscara do treze
para arrancar a dívida real
com nossas próprias mãos.
(obra reunida, p. 249).