Projeto de professor em unidade de internação em Santa Maria ganha prêmio nacional

Utilizando a música e poesia do rap como ferramenta pedagógica de forma emancipadora, promovendo a cultura de paz e direitos humanos, o projeto dos integrantes do Núcleo de Ensino da Unidade de Internação de Santa Maria venceu a etapa nacional do V Prêmio Ibero-Americano de Educação em Direitos Humanos Óscar Arnulfo Romero, promovido pela Organização de Estados Ibero-Americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura (OEI) e pelo Ministério de Direitos Humanos e da Cidadania do Brasil.

O idealizador deste projeto, o RAP (Ressocialização, Autonomia e Protagonismo), que existe desde 2015 e atua com adolescentes que cumprem medida socioeducativa de privação de liberdade, é Francisco Celso, professor de história na unidade.

Ele diz que sobre a premiação, ficou “muito contente, de a gente ter sido campeão nacional, isso é importante para valorizar esses jovens, mostrar que eles não, ao contrário do que paira no imaginário social, eles não são meninos e meninas problemas, são meninos e meninas que têm muitos problemas, mas que, acima de tudo, são potência, a juventude não é o problema da nossa sociedade, a juventude é a solução, então acho que dar essa visibilidade positiva para o sistema socioeducativo, pra mim, é a maior premiação”.

Foram 141 projetos inscritos e o com esta vitória o projeto RAP vai agora disputar a fase ibero-americana, nos dias 6 e 7 de setembro, no Rio de Janeiro, com premiação de 8 mil dólares para o vencedor, 4 mil para o segundo colocado e 2 mil para o terceiro.

O projeto

Hoje ele atende cerca de 60 adolescentes, entre 12 e 21 anos, chegando ao total de 150 por ano e quase 1500 desde o início dos trabalhos, em 2015. A sigla rap significa “rhythm and poetry (ritmo e poesia), mas foi ressignificada para o sistema socioeducativo.

“O projeto RAP a gente utiliza a linguagem poética do rap como ferramenta pedagógica para tornar as aulas mais atrativas e também como ferramenta de transformação de trajetórias de vidas. É realizado em sala de aula mesmo, que eu desenvolvi uma metodologia por meio da qual eu ensino história por meio de letras de rap, a partir de aulas temáticas”, afirma o professor.

De acordo com ele, essas aulas temáticas “sempre são temas relacionados aos eixos transversais de direitos humanos, diversidade e sustentabilidade do Currículo em Movimento da Educação Básica aqui do DF e sempre fazendo as vinculações históricas. A partir dessas aulas, os meninos também começam o processo criativo, desenvolvem letras de rap, poesias, redações, desenhos. E tudo isso a gente aproveita. Nas letras de rap a gente faz um trabalho de musicalização. O que não é letra de rap, o que não é musicável, a gente compila e valoriza todas as produções e sistematiza no formato de livros”.

Inclusive, foi criada uma agenda cultural bem intensa na Unidade de Internação, com saraus, com rodas de conversa, cine e debate, e também festival de música e slam de poesia.

Em relação ao desenvolvimento dos adolescentes, Francisco avalia que “priorizamos a avaliação formativa ali no dia a dia mesmo, e aí é muito notório, assim, a melhora na escrita, no poder de argumentação, na autoestima, na expressão oral e corporal são os resultados mais evidentes, e a curto prazo a gente já consegue observar. E a longo prazo é a ressocialização de fato. Que a gente continua, a gente tem um trabalho de acompanhamento de egressos, e então, quando o menino termina de cumprir a medida socioeducativa, a gente continua acompanhando ele aqui fora, para que ele não volte a reincidir em atos infracionais, e a gente vem conseguindo bastante êxito. Entre as meninas, é quase 100% de não-reincidência. Entre os meninos, é cerca de 80%. E acima de tudo a gente consegue retirá-los de um ciclo vicioso da vida infracional e inseri-los num ciclo virtuoso, num ciclo de virtudes, por meio da arte, da cultura e da economia criativa”.