“Projeto de Nação” prevê ditadura militar, fim da democracia, privatização do SUS e da educação pública

Na semana passada, generais e outros militares das Forças Armadas, ligados ao presidente Jair Bolsonaro (PL) e ao vice, Hamilton Mourão, lançaram um documento intitulado “Projeto de Nação – O Brasil em 2035” com o qual eles traçam um projeto de ditadura militar para o Brasil a começar este ano. Com 93 páginas, o documento desenha um aparato de estrutura político-estratégica que extingue a Constituição de 1988 e prevê o fim da democracia.

 

Na avaliação do Sinpro-DF, trata-se de um documento com graves ameaças às eleições de 2022 e que precisa ser combatido porque rompe com a normalidade democrática, institui a ditadura militar, o autoritarismo e a repressão; elimina direitos trabalhistas; privatiza patrimônios públicos; mercantiliza direitos fundamentais e humanos contidos na Constituição; e, sobretudo, extingue a democracia.

 

Assinado por três organizações militares, o documento foi lançado, na quarta-feira (19), em Brasília, com apresentação do Regimento da Cavalaria de Guardas e com a música “Eu te amo, meu Brasil”, uma música insistentemente tocada nos veículos de comunicação nos anos 1970 para ditadura militar, instalada no País pelo golpe de 1964.

 

CNTE avisa que projeto prevê a privatização da educação básica e superior

 

Na avaliação da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), “o projeto é reacionário, com o pensamento voltado apenas para as classes dominantes e não prevê um projeto de nação”. Para a entidade, o conteúdo mostra, claramente, que se ele for implantado terá um imenso impacto negativo na educação básica e superior porque aprofunda as medidas neoliberais impostas ao Brasil pelo golpe de Estado de 2016.

 

“É a continuação e o aprofundamento das medidas neoliberais que já vêm ocorrendo no Brasil e em outros países da América Latina, principalmente, sobre educação básica e superior. Se na educação superior pública eles aprovam e querem a cobrança de mensalidade, a educação básica, segundo o projeto dos militares, passa pela privatização e mercantilização ainda mais profunda, portanto, só vai ter acesso à educação no Brasil quem tiver condições financeiras”, denuncia Luiz Carlos Vieira, diretor de Imprensa e Divulgação da CNTE.

 

Os militares projetam privatizar o Sistema Único de Saúde (SUS) até o ano de 2025, ou seja, daqui a 3 anos, o País não terá mais saúde pública e sim, somente, privada. O professor Vieira afirma que é um plano para dar continuidade ao bolsonarismo, diante do que está colocado, esse pensamento que une o neoliberalismo, o conservadorismo e a fake news, com tendência ditatorial e que tem alguns apoiadores no Brasil. “Porém, sabemos que o processo eleitoral deste ano está muito perto, que essa visão que eles colocaram no documento não terá condições de fazer a sua propaganda de fato e convencer a população brasileira de que essa é a saída proposta por eles. Se, de fato, for implantado, é o fim da democracia e dos processos eleitorais brasileiros, não só o deste ano. As eleições brasileiras passarão a ser mera formalidade. O que está colocado claramente é que aquilo que os militares chamam de democracia nada mais é do que uma ditadura militar disfarçada”.

 

Vieira assegura que o projeto piora também a vida de todos os trabalhadores. “Ele não traz nenhuma melhoria para o mundo do trabalho. Não vem criar mais empregos, não vem criar renda básica, não vem dar mais oportunidade àqueles que hoje estão desempregados, que são milhões, no Brasil. Esse projeto vem para aprofundar a desigualdade, colocar a meritocracia como base para algumas camadas sociais continuarem tendo privilégios dentro do mundo do trabalho e esse impacto será bem mais profundo porque isso vai gerar muito mais desempregados, sem contar que o acesso à educação, que pode minimizar e dar as condições para que haja uma disputa honesta e um lugar para muitos trabalhadores de hoje, que, apesar de ser muito excludente, ainda oportuniza espaços para que as pessoas disputem uma vaga no mercado de trabalho, isso será ainda mais difícil”, afirma.

 

O diretor da CNTE explica, ainda, que “a classe trabalhadora terá muito mais dificuldades se esse projeto, que eles chamam de projeto de nação, for implantado. O que eles chamam de projeto de nação é de nação para eles que se dizem classe dominante e para aqueles se colocam como donos do poder”.

 

Para a CUT-DF, militares ameaçam a classe trabalhadora e suas organizações

 

Assim como o Sinpro e a CNTE, a Central Única dos Trabalhadores no Distrito Federal (CUT-DF) vê o documento como uma ameaça à classe trabalhadora em todos os sentidos. “Em todos os momentos em que a força militar, a truculência, a coerção foram estabelecidas como poder político, serviram para retirar direitos dos trabalhadores, à tentativa de impedimento da organização dos trabalhadores e à própria reivindicação por direitos”, ressalta Rodrigo Rodrigues, presidente da CUT-DF.

 

Ele destaca os últimos fatos históricos que levaram a centenas de perdas de direitos dos(as) trabalhadores(as). “Tivemos, de 2016 para cá, um golpe em que a democracia foi vilipendiada e, juntamente com a democracia, a extinção de direitos dos trabalhadores avançou bastante. Isso sem que as forças militares estivessem, claramente, à frente desse projeto político e econômico em curso no País. Nós sabemos que estavam inter-relacionadas, mas não estavam abertamente envolvidas”, afirma.

 

Rodrigues adverte para o fato de que a possibilidade de os militares interferirem abertamente no processo político coloca os direitos dos trabalhadores em alerta máximo. “O envolvimento de militares na política coloca os direitos dos trabalhadores, como, por exemplo, seu direito à organização sindical, em alerta máximo, uma vez que a violência de Estado se voltará exatamente contra àqueles que se manifestam em favor dos direitos dos trabalhadores, em favor de manifestações por avanços desses direitos, e que serão duramente reprimidos. O movimento sindical enxerga esse projeto como uma forte ameaça à própria organização dos trabalhadores”.

 

Central avisa que projeto de militares sequestra a democracia

 

“Uma vez que as Forças Armadas ou as Forças de Segurança Auxiliares, que são legalmente, as detentoras do monopólio da violência do Estado, ou seja, do uso da força para o controle da ordem e da segurança, se colocam dentro da ação do processo político, formalmente, numa disputa com essa prerrogativa de serem aqueles que controlam, coercitivamente, a sociedade, eles, na verdade, estão sequestrando a democracia, até mesmo estabelecendo ameaças para a própria existência dessa”, afirma Rodrigo Rodrigues, presidente da CUT-DF.

 

No entendimento dele, esse projeto de nação dos generais bolsonaristas coloca em risco as eleições democráticas de 2022 e a democracia brasileira. “Uma das coisas que eles colocam em risco com esse documento é a não aceitação de um resultado eleitoral caso essas forças que detêm o poder coercitivo não se sintam satisfeitas com o resultado. É muito preocupante esse projeto quando o Presidente da República dá sinais em suas falas de que não aceitará um resultado diferente do que o da sua vitória nas urnas”, alerta.

 

E finaliza: “Com esse projeto, eles ameaçam de impedir que esse processo democrático da vontade popular se concretize. É preciso ter muita alerta e até mesmo observar a validade jurídica de uma intervenção das forças militares, das Forças Armadas, das forças de coerção da sociedade dentro do processo político. Entendemos que cada uma deve ocupar seu respectivo espaço político: a política deve coordenar a vida da sociedade e as forças militares e as Forças Armadas devem coordenar a segurança e não sequestrarem a democracia”.