Professoras e orientadoras educacionais também são vítimas de violência e feminicídio

Falar de violência contra as mulheres e de feminicídio também é falar de classe trabalhadora. Quando se trata da categoria do Magistério Público, essa relação é ainda mais evidente.

Professoras e orientadoras educacionais são maioria no Magistério Público. Pela sua configuração, essa é também uma categoria composta, majoritariamente, por pessoas que sofreram, sofrem ou são potenciais vítimas de violência.

No DF, esse cenário se torna ainda mais preocupante, já que a unidade da federação registrou, no país, o maior crescimento de casos de violência baseada em gênero. O aumento foi de 250%, comparado o primeiro semestre deste ano com o mesmo período de 2022, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Para se ter noção da gravidade do percentual, o segundo lugar foi para São Paulo, com 33,7%.

O reflexo desse cenário é multidirecionado, como alerta a diretora do Sinpro-DF Mônica Caldeira.

“A vítima carrega consigo dores e traumas que, muitas vezes, se mostram insuperáveis. Isso reflete na sua atuação profissional, ou seja, impacta na qualidade da educação ofertada à população. E também perde o Estado, que tem custos com tratamentos médicos, benefícios sociais”, explica.

Segundo Mônica Caldeira, essa não é a única questão que justifica o debate da violência de gênero de forma contínua e interseccional nas escolas.

“É indiscutível que ser uma categoria composta majoritariamente por vítimas de violência de gênero é, por si só, definitivo para que esse tema seja parte do nosso cotidiano. Mas precisamos ir além: educação é um dos principais pilares de uma sociedade. Portanto, se almejamos uma sociedade justa, democrática, precisamos de uma educação antimachista, antimisógina.”

Fundamentalismo religioso e patriarcado
Embora conteúdos relacionados a gênero estejam previstos tanto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional como no Currículo em Movimento, falar de educação sexual, direitos humanos, violência contra as mulheres nas escolas ainda é um desafio.

“A gente está agora em um novo momento, um momento de esperança e visão de progresso. Mas a ultradireita ainda continua atuante e perigosa como sempre. Nós, professoras, professores, orientadoras e orientadores educacionais, sabemos bem disso. O combate à liberdade de cátedra, à uma educação libertadora e, consequentemente, antirracista e antimachista, continua forte; e nós continuamos sendo alvo”, avalia a diretora da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) e do Sinpro-DF Berenice Darc.

Em entrevista para o Sinpro-DF em agosto deste ano, a Secretária de Saúde da CNTE, Francisca Seixas, disse que “o fundamentalismo religioso e o patriarcado tentam de todas as maneiras podar que as crianças e adolescentes recebam a informação adequada à sua faixa etária, sobretudo, no que envolve a sexualidade e os seus corpos, que devem ser invioláveis”.

A fala é ainda mais chocante diante Do seguinte dado da Secretaria de Segurança Pública do DF: 25% dos casos de estupro coletivo foram realizados em escola/comércio. O mesmo percentual é indicado para local ermo/via pública. O levantamento considera os meses de janeiro a setembro de 2023.

Pela vida de todas as mulheres e meninas

Dia 25 de novembro é Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra as Mulheres. A data marca o início da Campanha 16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência Contra as Mulheres. No Brasil, a campanha começa antes, no dia 20 de novembro, Dia da Consciência Negra, somando 21 dias de ativismo. Isso porque, aqui, é considerado essencial lembrar que as mulheres negras são as principais vítimas da violência de gênero.

Para a diretora do Sinpro-DF Mônica Caldeira, o dia 25 de novembro é um dos marcos da luta feminista, mas trata de um tema que deve ser abordado diariamente em todos os espaços, inclusive nas escolas.

“Não podemos achar que, porque existe uma data, o tema referente deve ser tratado exclusivamente neste dia. A violência contra as mulheres é cotidiana, infelizmente. Portanto, a luta pelo fim dessa violência e pela vida de todas as meninas e mulheres também deve ser diária e interseccional”, diz.

A dirigente sindical alerta ainda que, embora a escola tenha papel fundamental no fim da violência contra as mulheres, é urgente que o Estado supere as falhas ainda cometidas, que acarretam na falta de proteção de mulheres e meninas.

“O Estado precisa prevenir com ações educativas e culturais que rompam com os padrões sexistas; punir agressores, com o amparo das legislações vigentes; acolher as vítimas, com desenvolvimento de equipamentos públicos e treinamento de profissionais; gerar programas que resultem na independência financeira de mulheres. Esses são itens básicos, mas que não vêm sendo cumpridos como deveria, sobretudo em âmbito local”, afirma Mônica Caldeira.

A CPI do Feminicídio no DF, realizada em 2021, mostrou total desarticulação das atividades dos órgãos públicos locais que, em tese, atuam pelo fim da violência contra a mulher. O relatório da Comissão comprovou que, para além da inexistência do trabalho em rede das políticas públicas, da ausência de orçamento, de problemas diversos no protocolo de atendimento das vítimas e agressores, há flagrante deficiência de pessoal para atuação nos órgãos integrados ao processo de acolhimento às vítimas de feminicídio. E para os servidores que exercem as atividades, segundo o documento, há descaso total com as condições de trabalho.´

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