CEM 02 do Gama realiza rifa para pagar inscrição de estudantes no PAS
Em pouco mais de dois meses, milhares de estudantes realizarão a prova do Programa de Avaliação Seriada, o PAS. No último subprograma (2022-2024), foram registrados 48,5 mil estudantes inscritos no Programa. Entretanto, outros tantos milhares não puderam ou não conseguiram se inscrever em consequência de uma série de fatores socioeconômicos. O cenário se repetiu neste ano e, ao que tudo indica, será assim também no ano que vem. A comprovação é feita por quem está no chão das escolas, em unidades onde o perfil de adolescentes é de vulnerabilidade social.
No Centro de Ensino Médio 02 do Gama, unidade escolar que atende majoritariamente estudantes de baixa renda e em conflito familiar, professoras(es) e orientadoras(es) educacionais se mobilizaram para garantir que alunos e alunas estivessem na lista dos inscritos do PAS.
“No segundo bimestre, um estudante me procurou e falou: ‘professora tem como a senhora pagar a inscrição do PAS, porque eu não tenho esse dinheiro’. E o valor da inscrição dele era de R$ 133. Eu disse: ‘tudo bem, a professora paga pra você’. Só que foram aparecendo outras demandas”, conta a professora Blenda Rodrigues da Silva.
Foi aí que Blenda levou às professoras Nildes Maria e Manuela Rodrigues a ideia de realizar uma rifa para custear a inscrição dos estudantes. Elas levaram a proposta à coordenação pedagógica que, de pronto, não só aprovou o projeto, mas se empenhou em realizar a ação, abraçada por todos e todas profissionais do CEM 02 do Gama.
“Vários professores doaram kits de produtos de beleza, cesta de chocolates, livros, bolsa de crochê. E os próprios professores que se voluntariaram venderam o carnê da rifa, que custou R$ 5. Conseguimos arrecadar um total de R$ 3.750, o que vai dar para custear cerca de 27 inscrições”, explica a professora Blenda.
As inscrições para o PAS têm valor que variam de R$ 133,80 a R$ 125, dependendo da etapa. Já para participar do vestibular, é necessário fazer inscrição que custa R$ 167.
Com isso, o valor arrecadado com a rifa do CEM 02 do Gama não cobrirá o pagamento das inscrições de todos os estudantes. “A prioridade não vai ser para estudante que só tira nota 10. Vamos levar em consideração frequência, dedicação, interesse”, informa professora Blenda.
Enquanto de um lado professores(as) se empenhavam na venda das rifas, do outro, as professoras Gabriela Almeida de Lima e Milena Ribeiro se dedicaram à inscrição dos alunos no PAS, feita exclusivamente pela internet. “Um trabalho exaustivo. Elas levaram turma por turma ao laboratório de informática e fizeram inscrição por inscrição”, considera professora Blenda, que afirma: “Os estudantes se sentiram oportunizados”.
Exclusão
A UnB garante isenção de taxa do PAS aos candidatos inscritos no CadÚnico; estudantes de ensino médio matriculado na Rede Pública de Ensino do Distrito Federal que comprovarem, cumulativamente, ter renda familiar per capita igual ou inferior a um salário mínimo e meio; e candidatos que comprovarem, cumulativamente, ter renda familiar per capita igual ou inferior a um salário mínimo e meio e ter cursado o ensino médio em escola pública ou como bolsista integral em escola da rede privada.
Entretanto, quando enquadrado em uma dessas condições, o estudante tem um árduo processo para comprovar sua situação. Burocracia que, muitas vezes, inviabiliza o direito à isenção da taxa.
“São mais de vinte documentos por pessoa. E esses alunos às vezes não conseguem nem os documentos da família, dos irmãos que moram junto. Muitos têm problemas familiares graves, sequer falam com pessoas que moram na mesma casa. Tudo que podíamos fazer para juntar a extensa documentação, fizemos, mas muitos dos pedidos de isenção não foram deferidos por ter faltado uma coisa ou outra”, lamenta a professora Blenda.
Com o pedido de isenção de taxa indeferido e sem recurso financeiro, os estudantes ficam impedidos de sonhar com a entrada no ensino superior. “Eu ainda acho que o acesso ao ensino público superior é elitista, excludente. Para mim, mesmo que um ou dois não consigam pagar a taxa ou que sejam barrados por um excesso de burocracia, já deixa de ser acessível”, opina a professora Blenda.
A opinião da professora encontra respaldo na sua vivência enquanto docente. Diariamente, ela convive com jovens de 15 a 18 anos que, muitas vezes, não sabem nem que existe uma universidade federal pública. Isso mostra que, ainda que tenham sido promovidas importantes políticas de ampliação do acesso ao ensino superior, como o próprio PAS, a universidade pública continua sendo um espaço para poucos.
Em uma análise comparativa, a taxa de inscrição para o PAS é mais cara que a taxa cobrada para realizar o concurso deste ano da Câmara dos Deputados, onde a procura é feita por pessoas com nível superior completo, que, se aprovadas, ganharão salário com valores acima de R$ 25 mil.
Mas para a professora Blenda, que também viveu as barreiras socioeconômicas para entrar na universidade pública, é possível democratizar o acesso ao ensino superior. No caso do PAS, ela sugere a isenção direta de estudantes da rede pública de ensino que tenham frequência superior a 75%, além da desburocratização do processo de comprovação do pedido de isenção para todos que necessitem desse recurso.
Professora em regime de contratação temporária, Blenda espera que o projeto de auxílio aos estudantes que quiserem participar do PAS continue. Ela, que sairá da escola no final deste ano, considera que a condição de professora substituta, muitas vezes, não é favorável à solidificação de projetos como esse. “É uma situação muito difícil. Hoje você está na escola, amanhã já não está mais. Por isso, é importante uma oferta maior de concurso público para a rede pública de ensino do DF”, relata.
Esperançosa, ela encontra segurança na dedicação e no apoio de todos(as) os(as) professores(as) e orientadores(as) educacionais do CEM 02 do Gama, e tem certeza de que a luta pelo direito dos(as) estudantes à participação no PAS e ao acesso ao ensino público superior será continuada.
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