Professor no Brasil gasta 48 minutos por dia com bagunça na sala de aula

Uma pesquisa da OCDE feita com professores de 33 países ao longo de 2013 coloca o Brasil no topo de um novo ranking: o de quantidade de “alunos-problema”. Seis em cada dez professores brasileiros ouvidos no estudo internacional disseram que pelo menos 10% dos alunos são agressivos com colegas e com professores, chegam atrasados e cometem até delitos como roubo em plena sala de aula. É o maior índice de “alunos-problema” entre os países pesquisados.
Com tantas questões de comportamento entre os alunos, um professor no Brasil gasta, em média, 20% do tempo de aula para colocar ordem na sala (a média internacional é de 13%). É muito tempo. Quer ver? Imagine uma escola que tenha a carga horária mínima estabelecida pela LDB (Lei de Diretrizes e Bases, de 1996), que é de quatro horas diárias — ou 800 horas distribuídas em 200 dias letivos. Se os professores dessa escola gastarem 20% dessas quatro horas diárias colocando ordem na sala de aula, serão 48 minutos perdidos por dia. Restam apenas 3 horas e 12 minutos para o conteúdo.
Vamos fazer uma conta ainda mais cruel. Que tal multiplicar os 48 minutos gastos diariamente com a bagunça na sala de aula pelos 200 dias letivos ao longo do ano? Surpresa: são 160 horas a menos de conteúdo por ano. Sabe o que dá para ensinar de matemática, ciências ou artes em 160 horas? Nossa, muita coisa.
VELHO CONHECIDO
O resultado dessa pesquisa da OCDE, no entanto, não é novidade. O tempo gasto com comportamento dos alunos por aqui é velho conhecido da literatura de educação, das escolas públicas e privadas e das políticas públicas do Brasil.
Em um estudo publicado 2009 sobre indisciplina e autoridade, a psicanalista Catarina Angélica Santos também ouviu professores brasileiros e chegou à conclusão que o problema da educação brasileira não é conteúdo, mas indisciplina: “Nosso dilema na escola não é o conteúdo em si porque este a gente domina e dá conta. Agora dar conta desses limites, dessa diversidade, dessa  indisciplina é o que é complicado”, relata um professor nesse estudo.
Outra pesquisa, de 2011, feita por psicólogas em escolas de Minas Gerais, observou que a relação entre professores e alunos começa positiva nos primeiros anos escolares e vai se tornando cada vez mais negativa conforme a idade do aluno. Trocando em miúdos: a relação de afetividade com a escola e com os professores vai, aos poucos, sendo substituída por uma ligação de conflito. É a receita do fracasso.
VAZIO ‘DIALÓGICO’
Esse processo todo obviamente não tem apenas uma explicação. Há, pelo menos, uma dezena delas. O que se vê nas escolas hoje em dia são alunos desestimulados com conteúdos distantes da sua realidade, professores sem autonomia e sem autoridade (e sem boletim escolar) e falta de perspectiva futura do jovem.
Em artigo recente, a educadora Carminha Brant, superintendente educacional da Abramundo, que desenvolve material didático interativo para ensino de ciências, chamou esse buraco que se forma entre alunos e professores de “vazio comunicativo e dialógico”. Ou seja: o aluno continua indo às aulas, mas se distancia do conteúdo, da escola e do professor. Não vê sentido naquilo tudo. E, se não houver uma intervenção, esse mesmo aluno acaba largando a escola e ainda pode levar um monte de aluno bom junto (vale lembrar: hoje, um em cada dois jovens não termina o ensino médio no Brasil.)
Ok, já sabemos que bagunça e comportamento atrapalham –e muito– a educação no Brasil. Já conseguimos até calcular o tempo de conteúdo perdido em sala de aula. Ótimo. Mas o que estamos fazendo para lidar com essa questão?
(Da Folha de S. Paulo)