PETROBRAS | Decisão do STF pode desidratar caixa do Fundeb e barrar alcance das metas do PNE

A notícia da decisão liminar do Supremo Tribunal Federal (STF) que permite o desmembramento da Petrobras em subsidiárias – e viabiliza o processo de privatização da empresa – chegou de forma tímida à população. Sem grandes alardes pela mídia comercial, a deliberação de seis ministros tem potencial para impactar negativamente a vida de mais de 211 milhões de brasileiras e brasileiros, sobretudo quando o recorte é a educação.

Em cada estado, o Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) é composto por percentuais de diversas receitas, entre elas o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). No Distrito Federal, por exemplo, neste ano, a alíquota do ICMS é de 18%. Uma das fontes de arrecadação desse imposto são as operações de circulação de petróleo. Mas para organizações que atuam em defesa da Petrobras pública, essa fonte de arrecadação do Fundeb pode ser gravemente atingida caso a privatização das subsidiárias da estatal se efetive.

O receio das organizações que defendem o patrimônio público se respalda no histórico de inadimplência de empresas privadas. Só no DF, segundo levantamento de 2018 da Subsecretaria da Receita, os débitos referentes ao ICMS somavam uma dívida de R$ 307.994.933,38. O levantamento foi feito com base em procedimento que verificou a diferença entre os valores informados pelos contribuintes e o que eles realmente pagaram em impostos.

“Se as refinarias da Petrobras forem privatizadas, a arrecadação do estado irá diminuir. Existem estudos mostrando que as empresas privadas sonegam e pagam muito menos impostos (que as públicas). Então, principalmente nos lugares onde as refinarias serão privatizadas, a educação será afetada. E o mais grave é que a Petrobras é a principal arrecadadora em vários estados do país”, afirma o petroleiro e secretário de Comunicação da CUT Brasil, Roni Barbosa.

Manifestação em Brasília, 2015 | Foto: Arquivo FUP

 

Outra forma de minguar essa arrecadação é subutilizando as refinarias, caso essas sejam privatizadas. “É possível que empresas privadas queiram utilizar essas refinarias apenas como parque de trancagem, para armazenamento, por exemplo. E aí, a arrecadação cai e o repasse também cai”, analisa o coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Deyvid Souza Bacelar.

O petroleiro alerta ainda que a decisão do STF pode interferir no repasse dos royalties do petróleo para a educação. “O que foi autorizado pelo STF acaba atingindo para além das refinarias. A Petrobras tem vários ativos: refinarias, termoelétricas, plataformas, campos de petróleo. Do jeito que está (a decisão), a Petrobras pode criar subsidiárias de qualquer coisa, inclusive de campos de produção de petróleo, plataformas e de unidades que estão ligadas a essas plataformas. Elas podem criar essas subsidiárias e vendê-las. E isso afetaria gravemente a questão dos pagamentos dos royalties”, explica.

Já o dirigente da CUT Brasil mostra que todo caminho percorrido pelo petróleo, desde o porto até uma refinaria, gera royalties. “O risco que nós corremos é que, dependendo de quem comprar uma refinaria dessa, vamos supor que seja uma empresa privada que já tenha a produção de derivados fora do Brasil, pode simplesmente trazer todo combustível de fora. Com isso, pode zerar a geração de royalties para municípios por onde passa o petróleo até chegar na refinaria”, exemplifica.

Após o golpe de 2016, para além das ações que miram na privatização da Petrobras, diversos ataques à estatal repercutem no encolhimento da verba direcionada à educação.

Um deles é a quebra da regra de conteúdo local, criado pelo Marco Regulatório do Pré-Sal, de 2010. Pelo documento, há percentuais mínimos obrigatórios de equipamentos e serviços brasileiros para as empresas exploradoras de campos de petróleo no Brasil. “A Petrobras investia aqui no Brasil, de 2006 até 2014, algo em torno de R$ 1 bilhão em desenvolvimento de pesquisas. Isso ia para as universidades”, reflete Deyvid Bacelar.

Ação dos petroleiros na Câmara dos Deputados | Foto: ArquiVo FUP

 

O sindicalista lembra ainda que no dia 13 de setembro, o Senado aprovou por votação simbólica projeto de lei (PL 209/15) que corta pela metade os recursos destinados ao Fundo Social do Pré-Sal. Pela lei vigente, 50% desse fundo deve ser utilizado para financiar a educação pública, com o objetivo de se cumprir as metas do PNE. Segundo reportagem do Estadão, cálculos do próprio Ministério da Economia mostram que, caso o presidente Jair Bolsonaro não vete parte projeto, saúde e educação poderão perder R$ 242 bilhões nos próximos 20 anos. De janeiro a agosto desse ano, quase R$ 1,5 bilhão foi aplicado em educação através do Fundo Social.

No mínimo questionável

Por seis votos a quatro, o STF negou, nesse 1º de outubro, a liminar das Mesas Diretoras do Senado e da Câmara dos Deputados que solicitava a suspensão da venda das refinarias da Petrobras Landulfo Alves, na Bahia, e Presidente Getúlio Vargas, no Paraná. Enquanto a Reclamação originária do Legislativo denunciava a manobra da atual gestão da Petrobras ao transformar refinarias em subsidiárias, a maioria da corte considerou que não há inconformidade com decisão anterior do próprio Supremo, que vinculou a alienação do controle acionário das empresas-matrizes ao aval da Câmara dos Deputados e Senado Federal.

“A decisão do STF afronta o próprio Congresso Nacional, acentuando o caos institucional que vivemos desde o golpe de 2016”, avalia o coordenador-geral da FUP, Deyvid Bacelar.

Aniversário com luta

Neste 3 de outubro, a Petrobras comemora 67 anos. Para marcar a data, CUT, Frente Brasil Popular, Frente Povo Sem Medo e entidades que integram a Plataforma Operária e Camponesa da Água e da Energia realizarão uma série de manifestações em defesa da soberania nacional, contra a privatização das estatais e em defesa dos serviços públicos.

Além de atos presenciais na parte da manhã, será realizado o ato virtual “Pela soberania nacional, em defesa do povo brasileiro”, a partir das 15h. Participarão mais de 50 entidades, além de lideranças políticas e sociais, como o ex-presidente Lula e a ex-presidenta Dilma Rousseff, o teólogo Leonardo Boff e o presidente da CNBB, Dom Walmor Oliveira de Azevedo.

O ato será realizado nas redes sociais, com transmissão ao vivo no canal da Rede TVT.