O fracasso das escolas cívico-militares

Por Gabriel Magno *

A vitória de Lula à Presidência da República reacendeu na maioria dos brasileiros e, de forma especial em nós educadores, a esperança da retomada de um projeto nacional com foco na reconstrução da Educação no Brasil, destruída de forma orquestrada na gestão Bolsonaro. Os resultados apresentados recentemente pelo Grupo de Trabalho (GT) de Educação à equipe de transição de Governo são um bom exemplo disso.

Além de apontar práticas diversas de corrupção, como desvios de recursos, o relatório aconselha ao presidente Lula um “revogaço” no Ministério da Educação, com a revogação de decretos que criaram programas considerados marcos desse desmonte da Educação Pública.

Destaco nessa lista as políticas nacionais de Alfabetização, de Educação Especial e o programa de Escolas Cívico-Militares. Os projetos têm incomum a falta de método, desconhecimento dos temas, ausência de proposta pedagógica eficiente, além de propiciar o aumento de exclusão e violências, só para citar alguns. Uma delas, a Política de Educação Especial do governo Bolsonaro foi suspensa pelo STF por “facilitar a exclusão” de crianças com deficiência do sistema regular de ensino, segundo a decisão dos ministros.

Já o Programa de Escolas Cívico-Militares comprovou o que especialistas já alertavam. É um completo fracasso. Não cria novas vagas, não tem projeto e, o pior, não forma cidadãos.

É uma constatação de que os governantes trataram a escola pública e a comunidade escolar como um problema do qual precisam se livrar. Em vez de investir na gestão democrática, nas estruturas das escolas, construir novas e valorizar os profissionais, optaram por terceirizar a gestão para os militares.

Os defensores da proposta argumentam que a simples presença de policiais militares e bombeiros auxiliaria na diminuição da violência, o que também não aconteceu. Ao contrário, piorou. Levantamento da Promotoria de Justiça de Defesa da Educação (Proeduc), do Ministério Público do DF, revelou que a média de atos infracionais registrados nessas unidades dobrou nos três primeiros anos do governo Ibaneis Rocha. Só em 2019, foram 119 registros em delegacias envolvendo estudantes. Ou seja, considerando os dias letivos, ocorreu um conflito a cada 48 horas.

Os mais recorrentes foram ameaças (20,43%), seguidas por vias de fato (11,91%), posse de substância entorpecente (9,79%), lesão corporal (7,66%) e desacato (6,38%). Os números incluem também denúncias de agressões de militares a estudantes, que nunca tiveram as apurações concluídas. O próprio relatório da Polícia Militar do DF caracteriza a militarização das escolas como um fracasso.

Os dados são nítidos e comprovam que o modelo de gestão compartilhada não traz solução e piora o ambiente escolar, como demonstram os registros que apontam relações conturbadas entre militares, professores e estudantes.

Escola é lugar de democracia, cultura, de aprendizagem, de debate, de formação, de liberdade para pensar. Estudantes não são soldados. Precisam de acolhimento e estrutura para desenvolverem seus talentos. O principal problema das escolas não é a falta de disciplina, mas a desvalorização dos profissionais combinada com a falta de investimentos.

Para além desses problemas, pesa ainda a questão legal. Não existe fundamentação para sustentar a militarização. O modelo implementado por Bolsonaro e Ibaneis é uma afronta à Constituição Federal e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB).

Infelizmente, no imaginário de boa parte das famílias, a militarização serve para resolver uma série de problemas relacionados a baixos resultados, indisciplina, drogas, evasão escolar e índices de violência. Mas vimos nesses últimos anos que a militarização da política não resolve os problemas estruturais da sociedade, pelo contrário. É preciso repensar inclusive o papel das forças de Segurança, bem como a estruturação da Política Educacional. Uma das principais tarefas do novo governo Lula é a de reconstruir um país com centro no fortalecimento da educação pública com mais investimentos públicos, valorização dos(as) profissionais e gestão democrática.

Serão muitas as nossas lutas pela Educação a partir de nosso mandato na Câmara Legislativa do DF que se inicia em janeiro. Mas acabar de uma vez por todas com as escolas cívico-militares será uma de nossas principais batalhas. Não vamos descansar enquanto os ambientes das escolas do DF não forem devolvidos aos trabalhadores e trabalhadoras da Educação, estudantes e comunidade escolar que devem ser sempre os protagonistas do processo de ensino e aprendizagem.

 

* Gabriel Magno é deputado distrital pelo PT, professor da rede pública do DF e diretor da CNTE