Nota do Grupo Consciência em apoio aos estudantes vítimas de racismo em escolas privadas do DF

A recorrência do racismo não é surpreendente na sociedade brasileira contemporânea, último país da América do Sul a abolir a escravidão no dia 13 de maio de 1888, com a “famosa” Lei Áurea, que teve como função prática alijar a população negra de direitos amplos, universais, interdependentes e indivisíveis. O racismo vivenciado por estudantes em escolas privadas do Distrito Federal, no contexto de jogos escolares – GALOIS, em 03 de abril de 2024; PÓDION, em 19 de abril de 2024 e PROJEÇÃO, em 02 maio de 2024 – acende um alerta ao fato da ocorrência ter sido em espaço escolar e em disputa de prática esportiva, uma vez que há experiências concretas de racismo no esporte brasileiro, sendo o atleta Vinícius (Vini) Jr. Um exemplo recente e emblemático de vítima de relações sociais racistas no futebol.

O avanço da extrema-direita no Brasil (racista, homofóbica, sexista, fascista) tem deixado rastro de atrocidade nos campos político, social, econômico, cultural, cientifico, educacional, etc. A elite/burguesia brasileira sempre teve e tem dificuldade de lidar com a dignidade humana como princípio constitucional dos Direitos Humanos, visto que sendo concentradora de riqueza no país produz desigualdades de toda ordem. A luta entre classes se funde à opressão das identidades. As expressões racistas dos estudantes são traduções do modus operandi da branquitude, fortalecida pelo capitalismo e as culturas racistas dominante dominantes.

Ao desumanizar o/a negro/a, atribuindo-lhe a condição de “macaco”, nada mais é do que uma retomada da colonização-escravista, que subjetivou e objetivou a população negra com finalidades de mercado, exploração, dominação e opressão. Chamar o/a negro/a de “pobrinho” e “filho de empregada” expressa, entre outras coisas, como a burguesia racista vê o/a trabalhador/a, especialmente a funcionária doméstica que é, invariavelmente, mulher negra. A postura racista dos estudantes tem, portanto, uma raiz histórico-estrutural. Dito de outro modo, o racismo individual não ocorre cindido do estrutural, institucional, ambiental, religioso, etc.

No Brasil, vivemos o que Cida Bento chama de pacto da branquitude, um sistema de dominação e opressão estrutural/estruturante, em que o racismo tem sua força e manifestação na manutenção de privilégios dos brancos em detrimento da população negra e de outros segmentos das camadas populares. Esse pacto ocorre nas duas formas: na subjetivação e objetivação da população negra como “inferior, incapaz, feia, religião do diabo, cabelo ruim e, sem dúvida, nas expressões racistas usadas contra negros e negras em jogos escolares nas escolas supracitadas: “macaco, pobrezinho, filho de empregada, preta gorda”.

Escola, também espaço de produção do conhecimento contra hegemônico, da emancipação/libertação humana e do respeito às diferenças não pode ser vencida por discursos do ódio, por comunicação violenta, pelo racismo e outras formas correlatas de violência, como o chamado bullying. A educação antirracista deve ser eixo estrutural no âmbito do currículo e não somente tema, sobretudo na chamada semana da Consciência Negra. Ao estarmos diante do racismo com suas origens e manifestações atrozes, não dá para ficarmos apenas na retórica do “repudiamos e não coadunamos com práticas racistas”, em níveis institucionais (Escola, Ministério do Esporte, etc).

É urgente a adoção de políticas públicas efetivas de combate ao racismo em sua origem estrutural-institucional, para promover relações individuais e societárias solidárias, respeitosas e amorosas. É momento, mais do que nunca, de ações institucionais (escolas) e outras no combate ao racismo, a começar problematizando as razões pelas quais há uma diminuta presença negra nas instituições escolares privadas e como são as relações dentro da escola e de seu entorno.

 

“A conscientização da opressão ocorre, antes de tudo, pela racial” (Lélia Gonzalez)

Nota escrita pelo Grupo de Estudos e Pesquisas em Materialismo Histórico-Dialético e Educação.