No Dia Nacional de Luta dos Povos Indígenas, originários lutam pela manutenção dos direitos constitucionais

“Dia do índio é todo dia. Todo dia é dia de luta, de resistência, de consagração com os nossos rituais para fortalecer os nossos espíritos perante essa luta enorme que não está perto de acabar. É uma luta constante”. Essa é a declaração que Alan Miguel Alves Apurinã — cuja grafia no seu idioma é Ewyryky Pupykary —, liderança social da Nação Apurinã, Sul do Estado do Amazonas, deu ao Sinpro-DF na manhã desta segunda-feira (7), Dia Nacional de Luta dos Povos Indígenas.

 

A comemoração é no dia 7 de fevereiro, e, neste ano, a principal luta da pauta dos povos originários e do povo brasileiro é assegurar a manutenção dos direitos conquistados e formalizados em lei na Constituição Federal de 1988 perante os ataques sistemáticos do governo Jair Bolsonaro (PL) e demais políticos, principalmente, os da bancada ruralista, eleitos em 2018, que estão nos poderes para sustentar, ilegalmente, esses ataques.

 

“Neste dia temos a oportunidade de refletir e tomar uma atitude em favor do humanismo, em defesa do meio ambiente e dos direitos dos povos a ter seus próprios territórios. É o momento de engrossar as fileiras da luta dos povos originários pelo direito à terra, aos costumes, aos seus próprios idiomas e cultura, à saúde e educação, à preservação dos seus direitos, usurpados e atacados pela bancada ruralista e pelas violências do governo Jair Bolsonaro. É o momento de a gente dar um passo definitivo pelo direito de preservar a natureza e pelo direito à vida. Pelo direito de existir”, pondera Márcia Gilda Moreira Cosme, coordenadora da Secretaria de Raça e Sexualidade do Sinpro-DF.

 

Alan Apurinã lembra que os artigos 231 e 232 da Constituição são atacados todo dia pelo governo Bolsonaro e a bancada ruralista. Esses artigos foram conquistados ainda na Assembleia Constituinte, realizada na década de 1980, com massiva participação e apoio generalizado da população brasileira, após os 21 anos do sanguinário regime de exceção imposto ao Brasil pela ditadura civil-empresarial-militar. “Esses artigos afirmam que todo território indígena deve ser demarcado e cuidado pelas políticas públicas de saúde, educação, proteção territorial e ambiental. Que nossas línguas, costumes e crenças devem ser preservados. O problema é que o governo Bolsonaro não executa essas leis e, por isso, a nossa luta atual é para manter esses direitos”, afirma.

 

A luta contra o PL 490: o marco temporal

 

Ele ressalta que ao longo da luta e datas históricas dos povos originários, “a gente já tem 522 anos de resistência e tudo que desejamos é o básico: o nosso território, crenças, saúde e a nossa organização social. Queremos nos manter em pé. Mas isso parece ser muito difícil no capitalismo, no governo Bolsonaro, no Estado brasileiro porque a ganância econômica está acima de tudo e tem nos prejudicado e tentado destruir nossos territórios”.

 

O líder indígena afirma que a maior prova disso não são apenas as investidas dos grileiros e jagunços nas terras indígenas, mas também os vários Projetos de Lei (PL), Propostas de Emenda à Constituição (PEC) elaborados ao longo dessas datas para legalizar a destruição e a usurpação dos territórios indígenas. “Uma das piores propostas é o PL 490, que desrespeita os territórios e o direito à vida dos nossos povos indígenas”, denuncia.

 

O PL 490/2007 é de autoria do ex-deputado Homero Pereira (PSD-MT), um empresário do agronegócio mato-grossense, falecido em 2013 vítima de um câncer. No entanto, anos depois da morte do indivíduo, o PL foi ressuscitado no governo Bolsonaro pela bancada ruralista eleita em 2018. O PL 490 legaliza a grilagem e abre os territórios indígenas a políticos, empresários e multinacionais do agronegócio, da pecuária, da mineração e outras coisas obscuras que só geram destruição do meio ambiente e privatização dos rios, das matas, das riquezas nacionais. 

 

“A nossa principal luta tem sido, portanto, contra o PL 490, que desrespeita muitas terras e o estilo de vida dos seres indígenas. Esse PL permite a entrada de ‘empreendimentos’ que destroem os territórios, cultura, trazendo tráfico, prostituição, doenças, violências, pobreza e uma série de impactos ruins para dentro das bases indígenas do nosso Brasil. Hoje há mais de trezentas nações com mais de duzentos idiomas ameaçados de extinção”, informa Alan.

 

Ele destaca que uma das maiores preocupações é com a destruição das culturas. “A gente vê que muitos líderes estão morrendo, muitas crianças sendo abusadas e, principalmente, a nova geração aliciada pelas seduções capitalistas, exatamente como nos anos 1500, época da invasão europeia, quando os portugueses e outros europeus seduziam os povos nativos com o chamado ‘escambo’. A nova geração é levada a ter outro norte e é encantada por novos costumes não indígenas”, alerta.

 

Apurinã observa ainda que a situação envolve, também, uma mudança no ciclo indígena. “Uma mudança no campo social que será muito ruim para nossa sociedade, que já está destruindo povos, culturas e diversos aspectos de extrema relevância para a sociedade indígena. A nossa luta é para mantermos o que, de direito, é nosso. Temos tido muitos problemas graves com este governo e, principalmente, com a bancada ruralista, que é quem promove as invasões e a destruição dos nossos territórios e estão sempre em conflito com a população local, assassinando líderes, crianças e, para a gente, é motivo de tristeza e de luta”, afirma.

 

O problema da Funai


Outro problema muito sério que tem afetado os povos originários é a gestão da Fundação Nacional do Ìndio – a Funai. Criada para materializar a proteção dos povos originários, ela passou a ser, no governo Bolsonaro, um organismo de ataque aos direitos indígenas. 

 

Apurinã afirma que a Funai tem negado, diuturnamente, a proteção territorial às TI que não estão demarcadas ainda, não cumpre suas competências e insiste em negar o suporte de saúde, educação, fiscalização, proteção dessas áreas. “Mesmo sendo não demarcadas ainda, essas terras estão no rol e na lista de territórios a serem demarcados há anos e, sobretudo, porque lá existem populações. Merecem receber todo o respeito e o cuidado porque lá tem vidas, biodiversidade, sociedade e também grandes problemas”.

 

Ele diz que os problemas só não pioraram porque o Supremo Tribunal Federal (STF) impediu vários atos. “Seguimos mitigando os impactos deste governo, que não pode continuar. Estamos juntos, estamos organizados, porém, a bancada ruralista precisa ser reduzida dentro do Congresso Nacional para que se garanta uma correlação de forças capaz de impedir os desmandos ambientais e a violência contra povos indígenas do País”, finaliza o líder indígena.