Não à militarização, privatização e entrega das escolas públicas às OS

Assim como nos tempos de exceção, a Educação pública brasileira está hoje seriamente ameaçada por setores políticos reacionários e oportunistas – aliado à falta de compreensão do que está em jogo por parte das pessoas.
Travestidas de “salvadoras”, medidas como “militarização”, entrada de Organizações Sociais (OS) na gestão escolar ou mesmo a privatização estão em alta, reafirmando a lógica empresarial em que se prioriza metas ao invés de questões pedagógicas, abre brechas para cobrança de mensalidades, precariza e desestabiliza as condições de trabalho dos professores, entre outros inúmeros problemas.
As chamadas Organizações Sociais, a princípio, foram vendidas como estruturas capazes de dar mais agilidade à gestão, escapando dos entraves criados para entidades públicas. Começaram na área da saúde e agora estão sendo “testadas” na educação.
O roteiro nós já conhecemos. O Estado irá terceirizar escolas que já têm boa infraestrutura e qualidade razoável de ensino. Algumas organizações darão um verniz nessas escolas a fim de dar a impressão, à opinião pública, de que o modelo é um sucesso.
Quando a sociedade civil se der conta, ela terá um serviço generalizado com professores precarizados, que podem ser facilmente substituídos e submetidos a planos decididos por burocratas.
O professor Wanderson Ferreira Alves – doutor em educação pela USP e coordenador do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Goiás – faz seriíssimo alerta sobre os perigos deste tipo de gestão das escolas. Em Goiás, trágicas experiências das OS e da militarização estão em estado avançado
Ele afirma que o “ano de 2016 tem um gosto amargo para a educação goiana: o governo do Estado (Marconi Perillo, PSDB) decidiu que escolas serão transferidas para Organizações Sociais (OS). Mas, atenção com o remédio: quando o diagnóstico é equivocado, as ações ao invés de ajudarem, prejudicam”.
Neste sentido, cita pesquisa do Center for Research on Education Outcomes, ligado à universidade de Stanford, nos EUA. Esse órgão publicou um estudo intitulado National Charter School Study, o qual aponta que alunos matriculados em escolas públicas com gestão privada em 26 estados daquele país, em grande escala, tinham desempenho semelhante aos das escolas públicas tradicionais e, em alguns casos, até inferior.
Mas o alerta maior do doutor Wanderson não é esse. Ele pondera que escolas militarizadas ou privatizadas tendem, naturalmente e com o tempo, a excluir alunos com perfil socioeconômico mais baixo, negros ou os que apresentem alguma deficiência. Por quê? Ora, para justificar a militarização ou a privatização, os governos querem mostrar à sociedade que esse modelo é eficiente e que os estudantes se destacam nos exames feitos pelo próprio poder público, como o IDEB ou ENEM, por exemplo.
Com isso, investem nos alunos mais destacados (que existem em qualquer escola), e nos de famílias mais estruturadas, porque estes, por razões óbvias, têm melhores oportunidades de acompanhamento também em casa. Os demais são deixados de lado ou até sutilmente convidados a sair.
É aí que negros ou alunos com alguma deficiência são discriminados, por conta do preconceito que sofrem ainda praticamente no mundo todo. A pesquisa do Center for Research on Education Outcomes traz dados sobre isso.
“A escola pública tradicionalmente, pondera o doutor, nasceu em oposição a tudo o que foi anteriormente descrito. O ideário da escola pública, aquele que animava Condorcet à época da Revolução Francesa, é o de uma instituição que acolhe a todos, promove a igualdade entre desiguais e serve de fundamento para a democracia. É a escola que acolhe brancos e negros, homens e mulheres, não importando credo religioso, nível cultural ou perfil socioeconômico. Essa escola é a que precisa ser fortalecida. Ela contribui na promoção da igualdade, não de desigualdade. Ela aproxima, não afasta pessoas”.
Por fim, o educador cita o caso de empresários que passaram a gerir escolas, desviaram dinheiro público e desapareceram fechando os estabelecimentos de ensino. O jornal New York Times publicou matérias sobre isso.
Implantação de modelo americano nas escolas públicas
No âmbito mercadológico, vários fatores colaboram para a privatização da educação pública. Com base no modelo das charter schools americanas (modelo americano que o governo de Goiás coloca como padrão a ser adotado no estado), Marconi Perillo tenta privatizar a educação pública de forma autoritária e unilateral sem dialogar com a categoria, com o sindicato que a representa, muito menos com a comunidade escolar a melhor opção para a melhoria da escola pública. Algumas razões para esta mudança podem ser analisadas abaixo:
– Reduzir investimentos na área educacional, pois as charters são mais baratas;
– Controlar os professores para ensinar para o teste e melhorar médias;
– As charters não têm estabilidade e o professor que não melhora a média é demitido;
– Eliminar servidores públicos e reduzir gastos com aposentadoria;
– Atender à Lei de Responsabilidade Fiscal, reduzindo servidores (OS não conta na Lei de Responsabilidade Fiscal)
– Livrar-se das escolas de maior dificuldade e com pior avaliação. Tendo fracassado com estas escolas, o estado as abandona.
Fora isto, a privatização traz sérias consequências:
– Destruição da escola pública de gestão pública (não é fácil voltar a ter gestão pública depois que se privatiza, pois os gastos com educação se acomodam em um patamar mais baixo);
– destruição do magistério público e de sua dignidade, precarizando o professor que pode ser demitido a qualquer hora ao sabor do diretor de turno;
– produção de alta rotatividade de professores, pelos salários mais baixos e excessiva pressão;
– transformação da educação em treino para o teste para aumentar média da escola e permanecer com o contrato;
– estreitamento curricular marcado pela atenção somente a disciplinas que caem nos exames: português e matemática, com prejuízo das demais;
– desnacionalização progressiva da formação da juventude com a entrada de grandes corporações nos processos de disputa por concessão da gestão das escolas, após constituído o mercado;
– as terceirizadas procuram não atender pessoas com necessidades especiais e evitam os mais pobres por serem mais difíceis e caros de ensinar.
O fato é que o magistério público do País enfrenta uma política neoliberal e de privatização de vários setores. O estado de Goiás é apenas um destes exemplos. Os professores do país e os sindicatos estão mobilizados para travar este projeto. “É uma situação que prejudica toda escola pública, especialmente os professores que perdem a carreira e a estabilidade. Ao perder a carreira e a estabilidade, a condição da qualidade da escola pública de Goiás é bastante reduzida. Não podemos aceitar que o dinheiro público seja repassado para a iniciativa privada cuidar de uma atividade que é dever do governo”, enfatiza a presidente do Sintego, Bia Lima.
Segundo o presidente da CNTE, Roberto Leão, a terceirização e a entrega das escolas para gestão de organizações sociais só pioram o quadro. “Organização Social é privatização da educação. É entregar a escola pública para organizações que, na verdade, como é o caso de Goiás, onde as OS que se candidataram a participar do programa de privatização do governo de Goiás foram criadas há pouco tempo e todas são de propriedade de donos de escola particular, portanto são entidades interessadas no dinheiro público, e nós temos que combater isso. Isso é fazer com que um direito da sociedade, da população, da classe trabalhadora, principalmente, que é quem se utiliza da escola pública, sirva pra subsidiar lucro de empresário de escola, que vê a educação somente como mercadoria”, afirma Leão. >>> Confira o Manifesto da CNTE contra a militarização e contra a privatização da escola pública por meio de Organizações Sociais (OS).
Militarização da gestão
Outro ponto contrário ao pleno desenvolvimento do direito das crianças é o crescente número de escolas cuja gestão foi entregue para a Polícia Militar. Ao todo, mais de 50 escolas estão sendo geridas pela Polícia Militar em Goiás, Minas Gerais e Bahia.
Nesse modelo, os diretores civis são substituídos por policiais armados que passam a administrar essas escolas com o objetivo de garantir a ordem e a disciplina escolar. Em Goiás, os alunos são obrigados a comprar fardas que custam entre R$ 500 e R$ 700, e as liberdades de professores e estudantes são restringidas.
“Sob o pretexto de pacificar a escola e melhorar os indicadores educacionais, as escolas estão sendo entregues para gestão da PM e isso é uma violação do dever de formar para a cidadania, é incompatível com a gestão democrática e, na maioria dos casos, restringe o direito de liberdade dos professores e estudantes”, adverte a diretoria colegiada do Sinpro.
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