MP aciona Justiça para obrigar Ibaneis a manter isolamento social

O governador Ibaneis Rocha (MDB) deverá suspender o relaxamento das medidas de contenção da pandemia do novo coronavírus. Uma ação civil pública conjunta do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT), Ministério Público Federal no DF (MPF/DF) e Ministério Público do Trabalho (MPT), acionada nessa terça-feira (28), pede a suspensão imediata de todas as atividades não essenciais do DF por causa do estado de emergência em saúde causado pela pandemia do novo coronavírus.

Os MP acionaram conjuntamente a Justiça Federal porque o governador Ibaneis não atendeu à Recomendação Conjunta com a qual os quatro ramos do Ministério Público solicitaram explicações científicas que justificassem o afrouxamento da quarentena no Distrito Federal. Na ação civil dessa terça, os MP pedem para que todas as atividades não essenciais do DF sejam suspensas imediatamente.  Entidades da capital federal, como o Sinpro-DF, foram referência na peça processual por lutarem pela vida.

Também requerem que a União apresente mecanismos para orientação, acompanhamento e cooperação técnica e financeira para o DF e Entorno, quando relacionadas à retirada das medidas de distanciamento social durante a covid-19. O pedido liminar estabelece o prazo de 5 dias para a União agir e impõe multa diária, em caso de descumprimento, de, no mínimo, R$ 100 mil.

Ação Civil Pública e Distanciamento social
No documento de 90 páginas, os membros do Ministério Público alertam que o Distrito Federal tem descumprido Convenção Internacional, aprovada pelo Congresso Nacional. Nesse sentido, o DF tem ignorado o Regulamento Sanitário Internacional, no que se refere à Recomendação Temporária da Organização Mundial de Saúde (OMS), sobre o relaxamento das condutas de distanciamento social. A opção por descumprir as recomendações estabelecidas pela entidade deve ser fundamentada com dados e evidências científicas. Não é o que tem acontecido no DF.

A Recomendação da OMS, reconhecida com força de lei no Brasil e descumprida pelo GDF, diz que as restrições de aglomeração social só devem ser suspensas em países onde o número de casos de covid-19 esteja em queda. Ressalta que o isolamento deve ser removido estrategicamente e não simultaneamente. Nesse contexto, é necessário que a transmissão da doença esteja controlada e que os ambientes de trabalho e demais locais tenham a capacidade de proteger as pessoas diante da retomada das atividades.

Diferentemente de todas essas recomendações, o governador Ibaneis iniciou a reabertura das atividades não essenciais muito antes do pico da pandemia e projeta reabrir as escolas e suas atividades educacionais presenciais, consideradas serviços não essenciais, exatamente no pico da pandemia. Para os Ministérios Públicos, a liberação de atividades não essenciais pode resultar na perda dos ganhos até então obtidos com o distanciamento implantado pelos primeiros decretos.

Nesse cenário, o resultado é apenas a postergação do colapso, com a falta de UTI. O entendimento é respaldado por estudo realizado por pesquisadores da Universidade de São Paulo e da Universidade de Brasília. A questão central não é apenas a taxa de mortalidade da doença, mas a velocidade da transmissão, que aumenta o número de pacientes graves e leva os sistemas de saúde à falência.

Natureza especial do Distrito Federal
A ação destaca a natureza especial característica do DF. Capital do País, serve como ligação terrestre e aérea internacional. Abriga 197 embaixadas e consulados estrangeiros e o terceiro aeroporto mais movimentado do Brasil. O rápido avanço do vírus na região pode comprometer o funcionamento dos Poderes da República e de organismos internacionais.

Além disso, segundo dados da Codeplan, 72% dos trabalhadores do Distrito Federal laboram em região diversa da que residem. Quase metade trabalha no Plano Piloto – local com o maior número de infectados – e a utilização massiva do transporte público, à medida que as atividades retornarem sem estrutura para isso, pode acelerar os contágios.

Condições de trabalho na pandemia
Outros pontos levantados pelos procuradores são a falta de segurança e o risco de contágio dos trabalhadores da saúde. O MPT vem recebendo diversas denúncias sobre más condições de saúde e de segurança da classe. Pesquisa realizada pelo órgão e respondida online por funcionários da área, diagnosticou falta de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) – incluindo aí a simples máscara N95 –, insuficiência de roupas, alimentação e repouso para esses profissionais, ausência de local separado para triagem de suspeitos de covid-19 e aumento da demanda sem redimensionar a força de pessoal.

O MPT ressalta as condições de trabalho dos médicos e demais profissionais da saúde, além da falta de estrutura verificada nos hospitais, são incompatíveis com a situação emergencial da saúde pública. A mesma preocupação se estende pelos demais ramos do MP para os trabalhadores dos estabelecimentos comerciais, industriais e de serviços em geral. Outras entidades e associações manifestaram apoio às medidas de isolamento ou preocupação com o relaxamento da conduta. Entre elas a Associação Médica Brasileira, o Conselho de Saúde do DF, o Sindicato dos Médicos do DF, o Sindicato dos Professores no DF (Sinpro-DF) a Ordem dos Advogados do Brasil no DF e o Conselho Regional de Medicina no DF.

O Sinpro-DF divulgou estudos científicos nacionais e internacionais em várias matérias e reportagens mostrando a gravidade do retorno às aulas na rede pública de ensino exatamente nas semanas de pico da pandemia apenas para atender ao Presidente da República. Nas matérias, a entidade faz projeção do contágio e mortes por covid-19 caso o isolamento seja afrouxado entre abril e junho. O sindicato também pôs nas ruas a campanha “Não somos cobaias! Fique em casa. A educação não pode morrer”.

Em artigo publicado na imprensa, o SindMédicos alerta também para as condições de trabalho dos profissionais de saúde – de médicos a técnicos de enfermagem – subempregados, todos com contratos de pessoa jurídica e sem nenhum direito trabalhista garantido em caso de contágio e afastamento do trabalho. No documento, os procuradores e promotores de Justiça afirmam que “o governo não pode expor a risco o direito à saúde das pessoas diante da pandemia da covid-19, contrariando determinações de outras autoridades que apontam em sentido contrário”.

A ação aguarda recebimento na 3ª Vara da Justiça Federal e tramita sob o número 1025277 20.2020.4.01.3400