Educação do campo, antirracista e não-sexista está entre eixos de luta da Marcha das Margaridas

Dias 15 e 16 de agosto, mulheres do campo, da floresta, das águas e das cidades de todo o Brasil estarão em Brasília na 7ª Marcha das Margaridas. O evento terá como lema a reconstrução do Brasil e o Bem Viver, sustentado em 13 eixos de luta, entre eles “Educação pública não sexista e antirracista e direito à educação do e no campo”.

A maior ação de mulheres da América Latina entende que “a luta por educação também diz respeito à garantia do direito das diferentes gerações de mulheres, sobretudo as negras e indígenas, a terem condições de acesso e permanência na escola e universidades”.

Além disso, para as Margaridas, “o direito à educação exerce papel fundamental para reparar as desigualdades por elas vividas”. A garantia de creches para crianças, a oferta de educação infantil e de todos os outros níveis de ensino pela rede pública são essenciais para que as mulheres do campo, da floresta, das águas e das cidades possam se inserir no mundo do trabalho e terem autonomia financeira.

Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua: Educação 2022, do IBGE, 25,8% das mulheres que estão no grupo de 49 milhões de pessoas de 15 a 29 anos não estavam ocupadas, nem estudando ou se qualificando. Entre os homens, esse índice era de 14,3%.

Ainda de acordo com a pesquisa, dos 9,5 milhões de jovens com 14 a 29 anos que não completaram o ensino médio, seja por terem abandonado a escola antes do término dessa etapa ou por nunca a terem frequentado, 58,8% homens e 41,2% mulheres. Para os homens (51,6%) o principal motivo para figurar neste grupo é a necessidade de trabalhar. Para as mulheres, há o fato da necessidade de trabalhar (24%). Entretanto, o grupo abrange também outros motivos que têm flagrante recorte de desigualdade de gênero: 22,4% delas apontam a gravidez como principal motivo por terem abandonado a escola antes do término dessa etapa ou por nunca a terem frequentado; e 10,3% das mulheres apontam a obrigação de realizar afazeres domésticos ou cuidar de pessoas – em comparação com 0,6% dos homens que apontaram esse mesmo motivo.

Em todos os índices da PNAD Contínua: Educação 2022, as pessoas negras são maioria quando levantadas questões relacionadas aos prejuízos educacionais, como analfabetismo, por exemplo. Pela pesquisa, no ano passado, 7,4% do número de pessoas pretas ou pardas com 15 anos ou mais eram analfabetas: mais que o dobro da taxa encontrada entre as pessoas brancas (3,4%). “No grupo etário de 60 anos ou mais, a taxa de analfabetismo dos brancos foi de 9,3%, enquanto entre pretos ou pardos ela chegava a 23,3%”.

“Nós, Margaridas, temos consciência da nossa missão pela reconstrução do Brasil, com democracia e soberania popular, justiça e livre de violência. Depois do golpe político que tirou injustamente a presidenta Dilma Rousseff e dos últimos governos marcados por retrocessos e a exclusão de direitos, programas e políticas públicas das mulheres, nossa luta segue ainda mais forte para enfrentar as desigualdades de gênero, de classe e de raça, e contra tudo que nos ameaça à vida”, afirma a secretária de Mulheres da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Mazé Morais, em matéria publicada no site organização.

 

DF não faz o dever de casa

O Distrito Federal é a unidade da federação com menor índice de analfabetismo (1,9%), na frente do Rio de Janeiro (2,1%), de São Paulo (2,1%) e de Santa Catarina (2,2%). Entretanto, discute-se – e questiona-se – o modelo de educação que vem sendo implementado nas escolas públicas.

A diretora de Raça e Sexualidade do Sinpro Márcia Gilda diz que, no Distrito Federal, por iniciativa de alguns professores(as) e orientadores(as) educacionais, tem-se hoje “uma pedagogia de projetos antirracistas instituída em algumas escolas”. “É preciso avançar, pois temos um dispositivo legal que garante que a pauta antirracista não é uma sugestão de trabalho, é uma questão que deve ser cumprida”, avalia.

Segundo ela, iniciativas do próprio Governo do Distrito Federal vão contra a lei que garante uma educação antirracista nas escolas. É o caso da militarização das escolas. Em vigor desde janeiro de 2019, o projeto implementado por decreto pelo governador Ibaneis Rocha teve revogada sua legalidade a partir de nota técnica do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), mas continua sendo implementado em várias unidades escolares.

Pelo Regulamento Disciplinar para as Unidades de Ensino do Distrito Federal participantes do Programa Colégios Cívico-Militares, um cabelo Black Power ou o uso de guias de religiões de matriz africana, por exemplo, podem ser considerados infrações. “A militarização das escolas compactua com o racismo uma vez que não respeita a identificação pessoal do estudante, já que padroniza a apresentação desses e dessas estudantes”, avalia Márcia Gilda.

O DF também não faz o dever de casa completo quando o tema é educação pública não sexista. Mônica Caldeira, diretora de Política para as Mulheres Educadoras do Sinpro-DF, diz que, assim como a pauta antirracista, a educação não-sexista existe em algumas unidades escolares enquanto projeto e, além disso, é componente curricular obrigatório da Educação Básica.

Entretanto, a sindicalista destaca que, mais uma vez, projetos políticos geram o avesso do que diz a própria lei. “É o caso do Escola Sem Partido, defendido por parlamentares alinhados à direita e ao governador Ibaneis Rocha. Com o projeto, temas como a cultura do estupro, por exemplo, são banidos de sala de aula. E é importante a gente lembrar que milhares de meninas e mulheres são estupradas e nem sabem que estão sendo, justamente por falta de conhecimento sobre o tema. Definitivamente, a escola precisa ser terreno de luta por equidade de gênero e pelo fim da violência contra as mulheres”, destaca Mônica Caldeira.

Berenice Darc, também diretora do Sinpro-DF, diz que a educação do campo no DF é marcada por diretrizes importantes que promovem uma educação que proporciona ao estudante a continuidade da vida no campo, caso seja esse o desejo dele.

Segundo ela, uma das questões que precisam ser aprimoradas é o tempo escolar. “Tempos da educação do campo são os mesmos da escola urbana. Entretanto, as crianças da escola do campo vivem junto com suas famílias o momento de plantio, de colheita. Então, deveria se pensar um calendário escolar diferenciado”, avalia.

Também diretora do Sinpro-DF, Letícia Montandon, que já atuou em escola do campo, alerta quanto ao problema do transporte escolar para essas áreas. “São ônibus precários. Muitas vezes, a gente recebe alunos de assentamento. E em épocas de chuva, tem aluno que fica todo o período inteiro (de chuva) sem ter como ir para a escola porque os ônibus não passam perto de onde ele mora, ou porque os ônibus podem atolar”, lembra.  Segundo ela, outro problema flagrante é o da especulação imobiliária, que força uma outra configuração para o campo, gerando consequências para a vivência nessas regiões.

 

Benfeitoria

A 7ª edição da Marcha das Margaridas lançou campanha de crowdfunding para apoiar o evento. O objetivo é levar ao menos 100 mil Margaridas para marchar em Brasília.

As doações podem ser feitas a partir de R$ 10. A cada R$ 100, está garantida a ida de mais duas Margaridas, e o doador ganha recompensas exclusivas.

Para mais informações sobre a campanha, o endereço é www.benfeitoria.com/marchadasmargaridas2023.

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