Mais da metade dos alunos de colégios particulares não sabe qual carreira seguir

Maioria diz que pais influenciam decisão; para psicólogos, dúvida reflete falta de maturidade e de autoconhecimento
No começo de 2013, Maria Vitória do Nascimento Barbosa, de 18 anos, pensou em prestar Medicina e Arquitetura. Chegou a fazer um curso para treinar para a prova de habilidades específicas de Arquitetura, mas acabou desistindo. Quando as inscrições da Universidade de São Paulo (USP) abriram, Maria estava decidida: queria fazer Letras e trabalhar como tradutora. Nos últimos meses, porém, acha que sua vontade é seguir a profissão da mãe e se formar em Direito.
A confusão que Maria Vitória está passando em um período tão próximo de terminar o colégio – ela está no 3º ano do Ensino Médio – é mais comum do que muitos podem pensar.
De acordo com pesquisa feita pela Teenager Assessoria Profissional com 3.718 estudantes de colégios particulares de São Paulo, mais da metade dos alunos do ensino médio está indecisa ou não tem ideia de qual carreira deseja seguir.
Os dados apontam que, dos entrevistados, 46,99% estavam indecisos e 12,16% não tinham ideia da profissão a ser seguida. Apesar dessa indecisão, 87,71% queriam fazem um curso universitário.
É o caso de Maria Vitória. Mas a adolescente está tranquila quanto a indecisão. Estudante do Colégio Etapa, ela diz que os pais sempre apoiaram que ela fizesse uma viagem e um ano de cursinho para pensar melhor na escolha profissional.
Greiciane Gonçalves, de 17 anos, está na mesma situação: vai reservar 2014 para pensar no futuro. Sua dúvida é entre Moda ou Publicidade.
“Eu gosto muito de moda. Além de já fazer trabalhos como modelo, também gostaria de ser estilista, tenho muita criatividade. Mas fico indecisa com publicidade. Tenho amigos que fazem e converso muito com eles, acho que é uma coisa que eu gostaria também”, diz.
Para o consultor em profissões da Teenager, Tadeu Patané, a escolha de Maria Vitória e de Greiciane vai depender do autoconhecimento.
“O aluno tem que pesquisar, conhecer o curso e, mais, saber o que faz o profissional. Os jovens ainda ficam muito confusos com o que o profissional faz, como é o dia-a-da da profissão”, diz.
Para perceber que Artes não era apenas um passatempo, Bruna Mayer, 17 anos, teve que passar por esse período de “autoconhecimento”. “Sempre desenhei e fiz cursos na área, mas só no ano passado comecei a pensar nisso como uma profissão. Eu gosto muito de Exatas e pensava que faria Matemática ou Engenharia”.
A decisão pelas Artes veio quando Bruna passou a pesquisar as possibilidades pela internet, fazer perguntas no colégio onde estuda e para antigos professores de desenho e pediu para conhecer o trabalho de amigos na área. “Hoje sei que é que quero fazer”.
A idade do jovem
Para Miguel Perosa, especialista em psicologia do adolescente e professor da PUC-SP, essa indecisão apontada pela pesquisa tem tudo a ver com a maturidade. “Sempre digo que faculdade deveria ser obrigatória depois dos 21 anos”, diz rindo.
Para ele, os jovens deveriam ter uma experiência profissional antes de ter que escolher uma carreira. “Ainda mais que estamos em uma época em que a identidade pessoal está cada vez mais difícil de exercer, em que as pessoas estão muito mais voltadas para a aceitação do grupo”, pondera.
Se o grupo social em que os estudantes vivem pode ser um fator de influência, a pressão dentro de casa e o medo de decepcionar os pais também aparece na pesquisa.Os dados da Teenager apontam que do total de entrevistados, mais de 50% afirmaram que os pais têm total ou muita influência na hora da escolha profissional. Menos de 10% disseram que os pais não interferem em nada.
Experimentação
Para trabalhar o lado profissional desde o início do Ensino Médio, o Colégio Santa Maria faz um projeto com os alunos para que eles comecem a pensar desde cedo na carreira. No 1º ano, ajudam o aluno a se conhecer e a perceber as áreas que tem mais afinidade; no 2º, eles passam a conhecer as profissões e carreiras; no 3º, devem se preocupar com a escolha da universidade.
“Já no segundo ano, a gente percebe alguns grupos entre os alunos. Alguns – mais maduros – começam a ter noção do que querem e há aqueles que ainda não se preocupam com esse universo e com vestibular. Mas, mesmo entre os que se preocupam, há quem tenha gostos totalmente diferentes, como música, engenharia ou direito”, explica Maria Soledad Más Gandini, orientadora da 2ª série do Ensino Médio do Santa Maria.
Para ajudar a sanar esta confusão, a escola promove o Projeto Semana na Empresa, que leva os estudantes a passar alguns dias vivenciando uma profissão. “O retorno que tenho tido é interessante. Às vezes o aluno tinha certeza do que queria e acaba voltando dizendo que não quer mais”, afirma Maria.
A orientadora ressalta que é importante que as escolas participem ativamente nesse aspecto da vida dos alunos. “Não dá pra separar a escola da decisão profissional do aluno. Por sinal, é uma pena que a gente só consiga mexer nesse assunto quando o estudante entra no Ensino Médio, porque cada vez se torna mais necessário fazer esse acompanhamento mais cedo. Esse projeto existe há 15 anos e no começo os alunos já tinham mais definição do que queriam. Hoje eles têm mais dúvidas, até porque o número de profissões aumentou”.
 
Fonte: Último Segundo