Musical Afro-Brasileiro da EC 05 do Cruzeiro comemora o Dia da Consciência Negra

A Escola Classe 05 do Cruzeiro (EC 05 Cruzeiro) comemorou o Mês da Consciência Negra com literatura, música e dança. Diferentemente das atividades pedagógicas de anos anteriores, cuja a culminância ocorria no dia 20 de novembro, este ano, a escola apresentou o Musical Afro-Brasileiro com a participação de todas as turmas de 5º Ano, cerca de 47 estudantes.

 

A apresentação mostrou que é possível, do ponto de vista pedagógico, a escola aplicar a Lei nº 10.639/03, que obriga as escolas de Ensino Fundamental e Médio de todo o Brasil a ensinarem a história e a cultura afro-brasileira e a história africana, por meio de um musical.

 

Além disso, o trabalho foi uma resposta alegre e agregadora a um ataque racista que a escola sofreu este ano. No fim, a atividade deixou impressa a mensagem de que, apesar de ser estrutural, o racismo deve ser combatido com veemência e eliminado do dia a dia de todos(as), dentro e fora da escola. 

 

Ataque racista

 

Entre setembro e outubro, durante a execução do projeto musical de percussão com turmas de 5º Ano, o qual era financiado pelo Fundo de Apoio à Cultura do Distrito Federal (FAC-DF), a EC 05 do Cruzeiro sofreu vários ataques racistas. A ouvidoria recebeu telefonemas com reclamações de cunho preconceituoso e o grupo de percursionistas africanos sofreu várias agressões. A escola resistiu e manteve o projeto, que iria contar também com um trabalho também de percussão da Fundação Palmares.

 

Mas, os ataques foram cada vez mais fortes e a escola o suspendeu. A resposta a isso foi a realização do Musical Afro-Brasileiro, que, além da alegria e festividade, trabalhou a consciência negra com arte, musicalidade e literatura. Simone conta que o musical foi um sucesso e uma forma, também, de explicar aos estudantes do 5º Ano os motivos do encerramento abrupto do projeto de percussão.

 

“Ao ser chamada à escola, fiz questão de convidar a companheira de trabalho, Márcia Gilda, coordenadora da Secretaria de Raça e Sexualidade do Sinpro. Lá conversamos a respeito da importância de se trabalhar o tema da Lei nº 10.639/03, para além de sua obrigatoriedade nacional. Colocamo-nos à disposição para qualquer tipo de orientação que pudesse levar a escola a permanecer firme em seus projetos, inclusive apontamos para que um projeto dessa grandiosidade histórica e pedagógica deve estar no PPP da unidade escolar porque, permanentemente, a Educação tem que ser antirracista. Foi uma alegria acompanhar a atividade final, o musical veio cheio de boas intencionalidades e @s estudantes estiveram muito envolvid@s. O que pudemos observar é que a resistência, o profissionalismo, a nossa cultura e a nossa História caminharam juntos”, afirma Regina Célia Pinheiro, diretora do Sinpro e integrante da Secretaria de Assuntos e Políticas para Mulheres.

  

O “Musical Afro-Brasileiro” e a metodologia do projeto

 

Simone conta que, além de uma resposta antirracista aos ataques, o musical foi uma atividade pedagógica destinada a cumprir a Lei 10.630/03. As sete músicas utilizadas garantiram o ensino da história e da cultura afro-brasileiras e a história africana. “A gente contava para as crianças a história daquela música e fazia um paralelo do conteúdo poético e rítmico com a história de vida delas hoje”, conta.

 

Com isso, os(as) professores(as) que atuaram nesta edição da atividade escolar conseguiram pôr em prática as exigências da lei. “O que a gente tem hoje na nossa vida que veio da África? Essa era a indagação e o fio condutor do projeto. “Com essa questão, a gente trabalhou o conteúdo da lei, sempre com o olhar pedagógico e à luz da África”, explica Simone. Esse projeto cresceu. Simone produziu um conteúdo, apresentou ao FAC e conseguiu verba para sua realização em 2024.

 

“Conseguimos os recursos do FAC e, com isso, vamos realizar nosso projeto: eu e mais três professoras da EC 05. Como eu criei, na pandemia da covid-19, o canal no YouTube “Histórias de Griô”, demos o nome ao grupo de “Histórias de Griô”. A direção da EC 05 está mudando, mas a próxima já diretoria já está apoiando o projeto e uma das reivindicações que eu fiz no dia da exposição para a nova direção foi a de que o nosso projeto entrasse no Projeto Político-Pedagógico (PPP) da escola e a nova diretoria disse que irá fazer de tudo para que ele seja incorporado ao PPP”.

 

 

Literatura: “Tiarinha Vermelha e o povo mau”

 

A professora diz que a centralidade do musical foi a história da “Tiarinha Vermelha e o povo mau”. Trata-se da obra do escritor Marcos Reis, na qual ele, que está sempre nas atividades da consciência negra da EC05, faz uma releitura da história medival e eurocêntrica de “Chapeuzinho Vermelho e o lobo mau”.

 

“No conto de Reis, a Tiarinha ensina que o combate ao racismo só acontece com sabedoria, conhecimento e aprendizagem e mostra que é preciso aprender a história da África para se combater o racismo com propriedade. O texto está todo sedimentado na Lei 10.639/03 e mostra, principalmente às crianças pretas, como se empoderarem para saber responder por que elas têm cabelos crespos, a pele negra, de onde vieram, quem são seus ancestrais”, informa a professora.

 

Ela explica que a obra ensina à criança que, ao conhecer a história, ela conseguirá se defender do racismo e de qualquer tipo de preconceito. “A história também trabalha com as crianças não pretas e mostra a elas por que nós, pessoas negras, somos diferentes e quem, dentre outros, construiu o Brasil foram negros da África e povos indígenas sob o comando do povo português e que a gente tem de respeitar a diversidade”.

 

“Na história, o povo mau são as pessoas racistas, preconceituosas e, a personagem Tiarinha, faz o papel de Chapeuzinho Vermelho, que vai para a casa da avó para que a avó faça tranças nela para prepará-la para comemorar seu aniversário. No caminho, Tiarinha encontra com Chapeuzinho Vermelho, o lobo mau, a bruxa, o caçador e todas as personagens da história europeia, as quais passam a trilhar o caminho com Tiarinha. Contudo, nesse percurso existe o povo mau, que a questiona com indagações semelhantes às que, no conto europeu, o lobo faz à Chapeuzinho Vermelho, porém com as modificações de sentido para destacar o problema do racismo: ‘Por que essa pele tão negra? Por que esse cabelo tão crespo?’. Com suas respostas, Tiarinha ensina que só se combate o racismo com sabedoria”, explica a professora da Sala de Leitura. 

 

O combate ao racismo na escola pública

 

Uma matéria deste ano publicada pelo G1 <https://g1.globo.com/educacao/noticia/2023/01/21/lei-que-obriga-ensino-de-historia-afro-brasileira-completa-20-anos-mas-esta-longe-de-ser-realidade-nas-escolas-dizem-especialistas.ghtml> diz que educadores e historiadores ouvidos pelo site destacam a importância de a Lei nº 10.639/03 ser debatida em sala de aula como forma de combater o racismo, valorizar a diversidade e reconhecer a contribuição e o papel fundamentais do povo negro na construção da nossa sociedade.

 

O Sinpro-DF, por sua vez, recebe denúncias de racismo dentro da rede pública e, com isso, enfrenta, diariamente, o desafio de combater o racismo. Para a diretoria do sindicado, esse combate é uma tarefa cotidiana que visa a modificar a realidade para criar, a partir da escola, um país mais justo. Não é à toa que, há muito tempo, a entidade instituiu uma Secretaria de Raça e Sexualidade e tem uma produção sistemática de materiais antirracistas para adequação nas atividades pedagógicas de professores.

 

No DF, ao mesmo tempo em que rede pública contempla e adota projetos antirracistas em seus PPPs, com culminância no Mês da Consciência Negra, também reflete, em suas comunidades escolares, as características de uma sociedade marcada pelo preconceito, que resiste às ações e atuações de combate ao racismo. Na EC 05 do Cruzeiro, a professora Simone tem realizado um projeto antirracista para cumprir a Lei nº 10.639/03, e, sobretudo, para ir mais fundo no combate ao racismo, tentando, principalmente, ajudar a escola a formar crianças e adolescentes em cidadãos e cidadãs antirracistas.

“Não há dúvida alguma sobre a necessidade da continuidade de projetos pedagógicos como esse da EC 05 do Cruzeiro. Dialogam com a lei, com o Currículo e Diretrizes da Educação Pública do DF e cumprem importante função social”, finaliza a diretora do Sinpro.

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Musical Afro-Brasileiro da EC 05 do Cruzeiro