Linguagem neutra é adotada em eventos do governo Lula

O governo Lula adotou a linguagem neutra em seus eventos. Um levantamento do jornal O Globo dá conta de que o uso do termo “todes” foi observado em pelo menos seis cerimônias de posse de novos ministros e ministras. Os cerimonialistas de eventos têm utilizado a expressão “todes” juntamente com os demais pronomes todos e todas.

Quem assistiu à posse do ministro dos Direitos Humanos, Sílvio Almeida, percebeu que a linguagem neutra foi usada o tempo todo durante o evento. A linguagem neutra, ou seja, o uso do pronome “todes”, foi usada nas posses de vários ministros(as/es), tais como da Fazenda, Direitos Humanos e Cidadania, Cultura, Mulher e das secretarias Geral da Presidência e de Relações Institucionais da Presidência da República.

Trata-se de um processo de inclusão que o governo Lula se propõe a instituir e naturalizar, definitivamente, no País. Estudos sobre gestão organizacional têm revelado que a adoção da linguagem neutra permite às empresas, organizações e entidades cumprirem com sua função social e de inclusão.

Os movimentos LGBTQIA+ afirmam que a linguagem neutra ou não binária é uma ferramenta para incluir pessoas de uma mesma sociedade que interagem entre si. Mais do que isso, a linguagem neutra é uma velha reivindicação dos grupos historicamente segregados da sociedade e alijados da norma gramatical do País.

O uso do “todes”, por exemplo, pode ser considerado um passo inicial para a instituição da linguagem neutra no País, uma mudança profunda e radical nas relações humanas. A adoção da linguagem neutra é uma atitude tão profunda que é um tema de muito debate dentro e fora da comunidade LGBTQIA+.

“O Sinpro procura usar essa linguagem nas produções jornalísticas. Entendemos que o uso dela é fundamental e fazemos isso nos nossos discursos em Assembleias, reuniões, textos etc. A linguagem neutra é fundamental na inclusão de pessoas que não se identificam com os gêneros feminino e masculino, quer seja no campo da identidade quer seja no da expressão de gênero quer seja pessoas agênero ou não bináries”, afirma Letícia Montandon, coordenadora de Imprensa do Sinpro-DF.

Ela acredita que as escolas deveriam discutir e se aprofundar para conhecer melhor a importância da utilização do termo. A mudança na linguagem partiu das comunidades LGBTQIA+ e das Pessoas com Deficiência (PCD). Nessas comunidades, há debates sobre acessibilidade que passam pela discussão de gênero. No caso das PCDs, por exemplo, a reivindicação é pela inclusão da linguagem de neutra nos programas de audiotranscrição.

Letícia explica que há estudos, sobretudo no campo da linguística, que comprovam o poder da linguagem na inclusão e na exclusão social. Segundo ela, o preconceito linguístico é decorrente de uma linguagem excludente e isso justifica a necessidade de o setor da educação discutir a diversidade linguística e seu impacto social. E, a partir daí, construir e adotar uma nova política de linguagem nas escolas com o intuito de tornar o Brasil mais plural. “A linguagem neutra tem essa função e é um tema que precisa ser discutido e compreendido como uma necessidade social”, afirma.

Linguagem não binária vai além e propõe mudanças no idioma

Márcia Gilda Moreira, coordenadora da Secretaria de Raça e Sexualidade do Sinpro, explica que a adoção da linguagem neutra pelo governo Lula é natural porque é um governo que representa toda a sociedade brasileira. “Em seu discurso, no dia da vitória, ele disse que ia governar para todos e não para alguns. E quando a gente diz ‘todo o povo brasileiro’ estamos falando de todas as minorias. E como costumamos dizer: inclui as maiorias que foram minorizadas por essa sociedade hipócrita, que é a sociedade brasileira. Nesse sentido, ele adotou também o termo da linguagem neutra ‘todes’ que é para incluir também a comunidade LGBTQIA+”, afirma.

A linguagem neutra pode parecer um grão de areia no oceano. Mas é nela que reside uma das grandes ações de resistência à exclusão. “É aqui que reside a grande resistência: como construir uma nova base da sociedade brasileira se esta foi fundamentada e estruturada sobre o racismo e o patriarcado. Estamos numa sociedade que reconhece como modelo padrão de família aquela formada apenas por uma mulher e um homem. A partir disso, a gente encontra todo tipo de resistência contra a adoção de um termo neutro no nosso idioma, não só na escola, mas também no nosso cotidiano, em todos os espaços”, pondera a diretora.

Márcia diz ainda que a adoção da linguagem neutra é a prática de uma nova reconfiguração da sociedade brasileira. “Seria uma nova reconfiguração para esta sociedade patriarcal aceitar a linguagem neutra seria aceitar as diversas composições familiares. Daí reside essa resistência e a criminalização da pauta de gênero no Brasil”, afirma.

A diferença entre linguagem neutra e linguagem inclusiva

A diretora do Sinpro explica que há uma diferença entre linguagem neutra não binária e linguagem inclusiva. “A linguagem inclusiva é aquela que não altera o idioma. Quando alguém discursa e vai falar, por exemplo, ‘bom dia a todos e todas’, ela faz uma linguagem inclusiva, mas não altera o nosso idioma. Já a linguagem neutra ou não binária tem essa proposta também de incluir pessoas, mas traz também a proposta de alterar o idioma”

A linguagem neutra ou não binária teve incialmente a proposta de usar o X no lugar das vogais A e O em substantivo, porém, pela dificuldade de pronúncia e leitura, a proposta foi a substituição pelas vogais E e U. No caso dos pronomes, o uso atual são: ‘elu’, ‘delu’, ‘ile’ e ‘dile’”.

O site Terra também lembra que o poeta brasileiro Olavo Bilac (1865-1918) afirmou que a língua portuguesa é algo vivo. A fala é, até hoje, reproduzida por linguísta e aplicada para praticamente todas as línguas. Termos e expressões são somados ao vocabulário, assim como reformas gramaticais realizadas ao longo das décadas”.

Já o jornal O Globo lembra que, nos últimos 6 anos, os grupos fundamentalistas, neofascistas e conservadores atacaram diretamente a linguagem neutra por ser um dos símbolos dos debates de gênero e uma ferramenta de inclusão e diversidade. “A proibição da linguagem neutra nas escolas é tema de 58 Projetos de Lei (PL) propostos desde 2019 em 20 estados no Brasil”, diz o levantamento de O Globo.

O jornal também mostra que “apenas o projeto do Sargento Eyder Brasil (PL), de Rondônia, foi aprovado, em outubro de 2021, porém, foi derrubado quando a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee) entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF), alegando que a legislação apresentava preconceitos e intolerâncias incompatíveis com a ordem democrática e os valores humanos”.

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