Justiça Federal suspende reajuste do piso do magistério em municípios gaúchos, mas cabem recursos e CNTE busca atuar nos processos

2022 09 08 capa site nota justica
Em 29 de agosto último foi publicada a sentença proferida pelo juiz de direito da 1ª Vara da Justiça Federal de Santana do Livramento – JFRS, Dr. Lademiro Dors Filho, a qual confirmou a liminar concedida em âmbito da base territorial do município gaúcho, em 03/05/2022, suspendendo os efeitos da Portaria 67/2022, do Ministério da Educação, que anunciou o reajuste de 33,24% ao piso nacional do magistério, neste ano de 2022.

Também nos últimos dias 18 e 25 de agosto, respectivamente, foram concedidas liminares pela juíza substituta da 6º Vara Federal de Porto Alegre, Dra. Daniela Cristina de Oliveira Pertile Victoria, suspendendo a aplicação do reajuste do piso do magistério nos municípios representados pelas associações da Zona Sul do Estado do Rio Grande do Sul e do Litoral Norte gaúcho.

Tanto a sentença como as liminares se pautam em fundamentações similares de ausência de legislação específica para definir o reajuste do piso em 2022, tese da qual discordamos.
Ainda no mês de julho, a CNTE debateu esse assunto em seu Coletivo Jurídico e traçou estratégias para a atuação judicial. De modo que a entidade tem buscado auxiliar os sindicatos não filiados à Confederação para ingressarem nas ações como terceiros interessados (pedido esse indeferido pelo juiz de Santana do Livramento), devendo, também, a própria CNTE protocolar petição no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, onde tramitarão os recursos das varas federais antes de seguirem para o Superior
Tribunal de Justiça – STJ e para o Supremo Tribunal Federal – STF, eventualmente.

A CNTE entende que o novo FUNDEB permanente, através da Emenda Constitucional nº 108 e da Lei 14.113, não interferiu na legislação autônoma do piso do magistério, uma vez que os critérios de atualização do piso continuam inalterados e vinculados ao crescimento do valor aluno ano do ensino fundamental urbano – mecanismo disposto tanto na EC 53 como na EC 108. Por outro lado, a substituição do antigo FUNDEB pelo atual – de caráter permanente – jamais poderia significar quaisquer retrocessos nas políticas educacionais e de valorização dos profissionais da educação, primeiro, porque se trata de uma política contínua, e segundo, porque o piso do magistério possui previsão constitucional não apenas no art. 212-A, mas também no art. 206, inciso VIII da Constituição Federal, fato ignorado nas decisões de primeira instância das varas federais do Rio Grande do Sul.

A vigência irrestrita da Lei 11.738 foi também corroborada pelas Comissões de Educação e de Cultura da Câmara dos Deputados e por outras três Frentes Parlamentares do Congresso Nacional defensoras da educação pública, em nota publicada no mês de janeiro. E mais: o julgamento de mérito da ação direta de inconstitucionalidade (ADI) nº 4848, no plenário do STF, em 01/03/2021 (portanto na vigência do novo FUNDEB permanente), que declarou a constitucionalidade do art. 5º da Lei 11.738, demonstra de maneira irrefutável que o critério de atualização do piso do magistério continua vigente, caso contrário a Suprema Corte teria declarado a perda de objeto da ação por fato superveniente, o que efetivamente não ocorreu! E essa é mais uma demonstração de lacuna jurídica nas decisões proferidas na JFRS.

Ainda que a sentença de Santana do Livramento tenha ratificado a liminar de efeito circunscrito àquela municipalidade, o fato de a mesma ter declarado a nulidade da Portaria nº 67/2022 do Ministério da Educação poderá ensejar repercussão geral sobre a validade do ato governamental substanciado na Lei 11.738, de modo que orientamos as entidades filiadas à CNTE a manterem a luta pelo reajuste do piso do magistério no valor de R$ 3.845,63, neste ano de 2022, por não se tratar de decisão judicial definitiva e pela ampla possibilidade de reversão da mesma. Ademais, nenhum gestor público está impedido de pagar o piso estabelecido pela Portaria nº 67/2022, tal como já fez a maioria dos entes estaduais e mais da metade dos municípios brasileiros.

Neste momento em que comemoramos o bicentenário da Independência do Brasil, é importante resgatar parte da luta dos trabalhadores e trabalhadoras da educação pela efetividade e valorização do piso do magistério, além do piso destinado a todos os profissionais da educação, também garantido no art. 206, VIII da Constituição. A primeira Lei Geral da Educação, de 15 de outubro de 1827, cuja data serviu para homenagear os/as professores/as brasileiros/as, ficou marcada pela negação da principal conquista da categoria à época. O piso nacional do magistério, instituído naquela legislação, sucumbiu diante dos pseudo-argumentos das províncias de que não haveria recursos suficientes para remunerar os/as
docentes. Com a Lei 11.738, de 2008, os ataques foram e continuam sendo os mesmos. Primeiro com as duas ADIs movidas por governadores no Supremo Tribunal Federal (4167 e 4848), nas quais a lei foi declarada integralmente constitucional, e, agora, com as ações de prefeitos na Justiça Federal questionando a vigência do dispositivo da lei que trata do reajuste anual. E esperamos que os tribunais do país reformem as decisões de primeira instância da JFRS.

Num contexto mais amplo da luta de classes, presenciamos, no último domingo, a suspensão cautelar da Lei 14.434/2, que aprovou o piso nacional da enfermagem, numa decisão monocrática do ministro relator no STF, Roberto Barroso. Trata-se de um duro golpe imposto às enfermeiras e aos enfermeiros que se dedicaram e colocaram suas vidas em risco durante a pandemia da Covid-19, cuja irresponsabilidade do governo federal já ceifou quase 700 mil vidas no Brasil.

A luta da classe trabalhadora é inerente e necessária no sistema capitalista e nas estruturas das democracias burguesas. E cabe aos trabalhadores e trabalhadoras entenderem esse contexto da dialética materialista que move a luta de classes, a fim de fortalecer cada vez mais seus sindicatos e as mobilizações sociais para alcançar conquistas trabalhistas, mesmo diante das enormes adversidades potencializadas pelo ultrajante e injusto neoliberalismo vigente no país desde o golpe de 2016.

Conclamamos, portanto, os/as profissionais da educação a manterem a luta pela efetivação do piso do magistério, independentemente das ações judiciais em curso – as quais serão devidamente questionadas no poder judiciário -, fortalecendo a posição da categoria em defesa dessa conquista histórica e que mais uma vez tentam subtrai-la.

Nenhum direito a menos!

Brasília, 7 de setembro de 2022
Diretoria Executiva da CNTE

Fonte: CNTE