Governo Ibaneis superlota escolas e mantém ambientes favoráveis à contaminação

As escolas da rede pública de ensino do Distrito Federal vão iniciar o ano letivo de 2022 com salas de aula superlotadas e com todo tipo de inadequação que prejudica o aprendizado dos estudantes, as condições de trabalho dos(as) professores(as), orientadores(as) educacionais e servidores(as) técnico-administrativos(as) e a põe em risco a saúde de todos e todas.

 

Este ano, segundo dados da Secretaria de Estado da Educação do Distrito Federal (SEE-DF), 26,5 mil novos estudantes ingressaram na rede pública de ensino, os quais se somam a 458.805 estudantes já matriculados na rede. Vale destacar que esse  número (458.805) é de 2020 porque no site da SEE-DF não há atualização de dados do sistema de educação pública desde 2020 e nenhuma previsão para 2022.

 

Assim, na avaliação do Sinpro-DF, levando em conta a nova onda da pandemia de covid-19, o número “oficial” de estudantes do Governo do Distrito Federal (GDF) com 2 anos de defasagem e considerando que esse número não representa a realidade, ao todo, em 2022, a rede pública de ensino terá de acolher, no mínimo, mais de 470 mil estudantes em 685 escolas fora algumas creches.

 

“Infelizmente, ao não atualizar os dados do sistema público de educação do DF, a Secretaria de Educação coloca em risco os princípios democráticos de transparência da Administração Pública”, observa. E lembra que a política educacional adotada pelo governo Ibaneis Rocha (MDB) se assemelha à do ex-governador Joaquim Roriz, que, dentre algumas desumanidades, superlotou as salas de aula e criou o turno da fome.

 

“O DF, hoje, caminha para essa forma de política descontextualizada da dos países desenvolvidos ao fazer a superlotação com pouca ampliação de unidades escolares, inclusive em áreas novas da capital, como é o caso do Sol Nascente. Recentemente transformada em Região Administrativa XXXII, e em processo de urbanização, é considerada a maior favela da América Latina. Com mais de 130 mil habitantes, o Sol Nascente tem apenas duas Escolas Classes, um Centro de Ensino Fundamental (CEF) e duas creches. Não oferece escola de Ensino Médio”, critica Mônica Caldeira, diretora do Sinpro-DF.

 

Assim, sem novas unidades, basicamente sem ampliação física das escolas existentes e sem concurso público para ingresso de novos professores e orientadores educacionais concursados, a “Estratégia de Matrícula 2022” do governo Ibaneis para 2022, segundo a diretoria colegiada do Sinpro-DF, é a de promover um sucateamento acelerado e  a destruição total da escola pública da capital do País, local em que a rede já foi modelo de ensino para o Brasil e o mundo.

 

No entendimento da diretoria, a estratégia é o sucateamento apressado do patrimônio público por meio de uma evidente falta de empenho do dinheiro do Estado em políticas públicas. Na educação, a tática é a superlotação das salas de aula para impor um ensino de massa e prejudicar, deliberadamente, o aprendizado dos(as) estudantes, que já estão extremamente lesados pela reforma do Ensino Médio do governo Bolsonaro. Também visa a piorar cada vez mais as condições de trabalho na educação.

 

As reformas do GDF para receber aulas presenciais

É certo dizer que as escolas públicas do DF passaram por algumas reformas, mas, notadamente, essas reformas foram centradas, basicamente, na colocação de câmeras de circuito de controle interno para monitoramento de professores. Houve pouca ampliação das salas de aula e quase nenhuma adequação para o enfrentamento à pandemia e nem para as futuras ondas de contaminações já previstas e anunciadas pela ciência. Também não houve construção de novas escolas para atender à demanda que aumenta todo dia.

 

Vale destacar também que as ampliações de salas de aula de que fala o governo Ibaneis não visam a atender à política de redução do número de estudantes por sala para garantir qualidade de aprendizagem e garantir um ambiente adequado sanitariamente, e sim para não construir novas unidades. A ideia é mesmo a de superlotar. Em Samambaia, por exemplo, a Escola Classe 614 tem previsão de ampliação do número de salas de aula para pôr em curso essa política de não construir novas escolas e de encher o espaço de estudantes e de servidores. Essa escola tem pouco espaço físico para todos, até mesmo para a sua própria diretoria.

 

O número de estudantes aumenta e a escola encolhe em tamanho no espaço físico e na oferta de professores concursados. “O fato é que temos, hoje, no DF, quase meio milhão de estudantes na rede pública de ensino e é muito bom saber que ainda podemos atender mais de 26 mil novos. No entanto, pensando da perspectiva da qualidade de ensino e de acolhimento isso ainda é muito ruim”, avalia a diretoria. Importante destacar que o Plano Distrital de Educação (PDE) prevê a redução de estudantes em sala de aula, o que, comprovadamente, melhora a qualidade do ensino e a aprendizagem dos estudantes. Essa redução do número de estudantes em sala é também uma reivindicação histórica da categoria, o que demanda a construção de novas unidades.

 

Berenice Darc, coordenadora da Secretaria de Política Educacional do Sinpro-DF, afirma que é importante ressaltar que o acolhimento aos novos e aos estudantes que já estão na rede, com conforto e segurança em salas de aula pensadas com medidas possíveis para um momento de pandemia, não vai se materializar. “Na maioria das unidades escolares temos muitas dificuldades. Em primeiro lugar, não há construção de novas unidades; e, em segundo, o ambiente em que atuamos nos últimos anos não muda para receber os novos”, afirma.

 

“Se tivemos problemas com protocolos no ano passado, este ano vamos ter mais ainda. Infelizmente, no DF e no Brasil, o que estamos vendo é mais uma onda muito forte da pandemia da covid-19, com o DF, novamente, entre as unidades federativas que lideram número de internações e de mortes no País. A Secretaria de Saúde e os órgãos de controle mostram que a capital está tendo muito mais contaminação do que o registrado oficialmente. No entanto, que bom que temos muito menos gente morrendo por causa da vacina. Mas ainda há muita gente morrendo. É preciso vacinar e tomar todas as doses. É preciso vacinar as crianças todas urgentemente antes do retorno às aulas”, destaca.

Esse problema é apontado por órgãos internacionais. Um estudo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) intitulado  “Políticas Eficazes para Professores: Compreensões do PISA”, publicado em 2018, mostrou que as salas de aula do Brasil são lotadas e há pouca valorização do corpo docente. O Brasil aparece no ranking global como o Estado com maior desgaste de professores(as) e com um dos maiores números de estudantes por sala de aula no Ensino Médio entre mais de 60 países analisados no estudo.

 

Estudo da OCDE, novas pandemias e distanciamento

Cláudio Antunes, diretor do Sinpro-DF e da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação (CNTE), diz que o aumento do número de estudantes na rede pública compromete ainda mais as poucas possibilidades de  distanciamento neste momento da pandemia.”Era preciso que o Governo do Distrito Federal já tivesse feito reformas significativas e, no mínimo, já tivesse projetado a construção de novas escolas para adequar o sistema ao número ideal de estudantes por sala de aula, uma vez que, nos próximos 5 anos ou, quem sabe, 10 anos, como têm dito os cientistas do mundo inteiro, teremos de conviver com um vírus de dano respiratório por um longo período”, alerta.

 

Além disso, ele informa que, historicamente, desde os anos 2000, a rede pública de ensino do DF mantém um público flutuante entre 450 a 500 mil estudantes. Esse aumento de 2022 se deve ao ingresso de novos estudantes que estão começando o percurso escolar e à eventual queda do poder aquisitivo e fuga da classe média da rede privada para a rede pública. “Mas essa flutuação não está destoando da média histórica de 20 anos de matrículas da rede pública”, garante.

 

O que preocupa o diretor é o fato de o problema ser a falta de reformas e de construção de novas escolas na rede pública que garantam distanciamento por causa da pandemia e também para assegurar o aprendizado. “Temos de considerar ainda que os prédios das unidades escolares seguem um ‘projeto arquitetônico’ terrível, destinado mesmo a fazer aglomeração e dedicado à chamada ‘educação de massa’, quando na Europa, nos EUA e em outros países desenvolvidos, a adequação foi feita e reduziram o número de estudantes por sala de aula não por questões sanitárias, mas, muito antes da pandemia, para garantir a qualidade do ensino. Aqui no Brasil isso não é feito. E não está sendo feito agora nem por causa de uma necessidade médico-sanitária”, denuncia.

 

Antunes afirma que, em termos de qualidade da educação, se o Brasil quiser ocupar os mesmos lugares dos países da OCDE terá de fazer alguma coisa para resolver o problema da educação, a começar pela eliminação da superlotação das salas de aula. “O Brasil não faz nada para que isso ocorra. E uma das coisas que fazem muita diferença é a quantidade de estudantes por sala de aula. Essa lição, o Brasil ainda não aprendeu”, afirma. 

 

E, de fato, não aprendeu. Atualmente, a média é de 40 estudantes por sala de aula. Em 2012, a Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado aprovou um projeto para modificar a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e instituiu o número máximo de estudantes em sala. O projeto ajustou as leis brasileiras às orientações dos órgãos internacionais dos quais o Brasil é signatário, como a OCDE, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), Organização Pan-Americana para a Saúde (Opas). Estabeleceu 25 estudantes por professor, durante os 5 primeiros anos do Ensino Fundamental; e, 35, nos 4 anos finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio.

 

Um relatório da OCDE, divulgado no ano passado, indica que, entre 32 nações com dados disponíveis, o Brasil tem o décimo maior número de estudantes por sala de aula até o 5º Ano do Ensino Fundamental e o sexto maior número de estudantes por turma do 6º ao 9º Ano. Nos dois casos, o País está acima da média dos analisados com 23 estudantes, em média, por turma no Ensino Fundamental 1, quase 10% acima da média de 21 estudantes por turma do resto do mundo desenvolvido. No Ensino Fundamental 2, o tamanho da turma brasileira é na média de 27 estudantes, número 17% maior do que os 23 da média de 32 países avaliados.

 

Teoria matemática

Há uma previsão de que, a partir de 2030, haverá uma implosão demográfica no Brasil, ou seja, a população irá reduzir. Em outubro de 2012, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgou esse estudo no Comunicados do Ipea nº 156 e 157, que tratou da demografia e do mercado de trabalho brasileiros com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) e indicou a possibilidade de ocorrer essa redução populacional. A pandemia da covid-19, que começou em março de 2020, pode acelerar essa queda demográfica, dado que ainda precisa de confirmação científica.

 

O País precisa de um novo estudo do Ipea que analise e meça o impacto da pandemia nessa queda demográfica. De março de 2020 a janeiro de 2022, mais de 624 mil brasileiros morreram de covid-19. Ou seja, se a pandemia acelerou essa queda demográfica e ela começou antes de 2030, conforme previsão do instituto, os governos já deveriam estar com políticas de Estado preparadas para aproveitar a queda demográfica para melhorar a qualidade das escolas, reduzindo o número de estudantes por sala de aula como os países de primeiro mundo fizeram.  

 

“Por que estou destacando essa teoria matemática? Porque em alguns país, os gestores eleitos aproveitaram essa implosão demográfica não para fechar escolas já que a redução populacional gera sobra de prédios, mas sim para reduzir o número de estudantes por sala de aula. Mas, no caso do DF, aproveitar um patrimônio que eventualmente venha a ficar ocioso, não é da nossa vocação porque, na primeira década do século XXI, tivemos salas de aula ociosas no Plano Piloto, em Ceilândia e outras Regiões Administrativas, e, em vez de usar esses espaços para desafogar as salas de aula, os governantes fecharam turnos. Por isso que quando eu falo que o Brasil não aprendeu a lição é porque não aprendeu mesmo porque até em momentos como esses perdeu a oportunidade. Hoje o argumento para não fazer é de que não há dinheiro para construir escolas e nem salas de aula nas que já existem por falta de espaço, mas quando teve salas de aulas ociosas, a opção foi a de manter as salas de aula lotadas”, finaliza.

 

Segundo o estudo do Ipea, “desde 2007 a taxa de fecundidade total do Brasil está abaixo dos níveis de reposição: 1,7 filho por mulher. Isso implica a desaceleração do crescimento da população brasileira, que poderá diminuir de fato a partir de 2030. A queda da taxa ocorreu em todas as faixas etárias. A taxa de fecundidade entre as adolescentes vem caindo desde 2000. Para efeito de comparação, em 1992 a taxa era de 91 filhos nascidos vivos por 1000 mulheres; em 2011, de 51. Nessa linha, a população brasileira deverá chegar a 208 milhões em 2030 e, a partir daí, reduzir. Em 2040, são esperados 205 milhões de habitantes”.

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