Governo Bolsonaro quer mudar Censo para justificar ausência de políticas públicas

Sem qualquer tipo de análise de dados, o novo diretor de pesquisas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Eduardo Rios Neto, disse que pretende retirar uma série de perguntas do questionário básico do Censo 2020. Rios Neto ocupa o cargo de Cláudio Crespo, exonerado por não se alinhar à política bolsonarista. A possível mudança na aplicação do questionário encontra resistência dos servidores do Instituto, já que impactam gravemente na promoção de políticas públicas direcionadas, principalmente, às pessoas em situação de vulnerabilidade social.

De acordo com o dirigente da ASSIBGE (sindicato que representa os servidores do IBGE), Luis Almeida, o objetivo do governo ao tentar aplicar a mudança no questionário é “esconder” a realidade brasileira. “O governo quer esconder várias questões, como desigualdade social – que aumentou após o golpe de 2016, problemas de saneamento básico, desemprego, evasão escolar”, explica.

Como exemplo da essencialidade do Censo para a reestruturação da sociedade de forma mais justa, Almeida dá como exemplo o reconhecimento da união estável para casais do mesmo sexo pelo Supremo Tribunal Federal, em 2011. “Em 2010, foi a primeira vez que o Censo perguntou se o cônjuge era do mesmo sexo. O resultado dessa simples pergunta foi o reconhecimento da união homoafetiva pelo STF”, conta o dirigente do ASSIBGE.

Embora ainda não se tenha batido o martelo sobre o que exatamente sairá do questionário feito pelo Censo, Luis Almeida alerta que a mudança que poderá ser feita vai prejudicar setores da sociedade já marginalizados, como as comunidades quilombolas, os indígenas, negros, mulheres, pessoas com deficiência.

Em nota publicada no último dia 13 de maio, a ASSIBGE afirma: “Qualquer proposta poderia ter sido cotejada em períodos já superados do planejamento do Censo. Resgatar esses pontos agora significa uma desestruturação completa deste planejamento e a inviabilização do Censo. Isso fere duramente os princípios fundamentais de estatísticas oficiais, a independência e a qualidade do trabalho, com as mudanças bruscas que estão querendo impor ao corpo técnico da casa”.

A mudança ainda indica que vai afetar o repasse do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), feito pela União, cujo cálculo leva em consideração a quantidade de habitantes levantada pelo IBGE nas estimativas anuais, na contagem populacional e no censo demográfico.

Audiências públicas e manifestações

Os servidores do IBGE ainda se defrontam com o anúncio do corte de 25% do orçamento do Instituto, o que agravará inda mais o reduzido número de servidores do Instituto e a verba destinada às pesquisas.

“Estamos fazendo uma série de ações para barrar tanto o corte orçamentário como a mudança no questionário do Censo. A última manifestação foi feita no dia 2 de maio, em frente à sede do IBGE, no Rio de Janeiro. A presidenta do IBGE, Susana Cordeiro Guerra, disse que só ia nos atender depois da nomeação de todos os diretores. Todos os dias mandamos mensagem cobrando que ela nos receba ”, afirma o dirigente da ASSIBGE, Luiz Almeida. Ele ainda diz que, além de manifestações, o Sindicato vem realizando uma série de audiências públicas na Câmara dos Deputados para denunciar os desmandos do governo Bolsonaro junto ao IBGE.

No calendário de ações, está programado para a próxima terça-feira (21), audiência pública na Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público (CTASP) da Câmara dos Deputados. O encontro, que pautará os riscos impostos ao Censo, será às 14h, no Plenário 10.

O Censo

A contagem oficial da população no Brasil é feita pelo Censo, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Nesta pesquisa, são levantadas informações sobre a população do país e sua condição de vida. Qual o número de desempregados, quantas mulheres, quantas pessoas vivem na área urbana, qual a renda salarial dos brasileiros e várias outras questões são registradas. Ainda são coletadas informações que servirão de base para a criação de políticas públicas nas áreas de saúde, previdência social e educação da população, além de assistência a grupos específicos como mulheres, crianças, adolescentes e idosos.

Os censos demográficos são planejados para serem executados a cada 10 anos (sempre nos anos de finais zero). O último censo realizado no Brasil foi no em 2010. Entretanto, no intervalo entre dois censos demográficos, é feita a contagem de população que, segundo o IBGE “tem como principal objetivo atualizar os contingentes populacionais municipais e subsidiar no cálculo das estimativas populacionais dos municípios nos anos subsequentes”. A partir dessa contagem, é possível orientar políticas e ações públicas com informações atualizadas sobre a população.

Fonte: CUT Brasília, por Vanessa Galassi | Foto: Lucas Souza (reprodução – Terra de Direitos)