Gestores são alvo de perseguição no Paranoá

Em tempos de “fake news”, o termo falsa polêmica também ganhou novos significados. Considerando que o presidente da República é um dos principais propagadores de mentiras embaladas em papel de notícia sobre temáticas variadas, e considerando que ele conta, para isso, com parlamentares em âmbito distrital e federal que se beneficiam dessa postura, chegamos a uma realidade alarmante para aqueles e aquelas que apenas querem desenvolver bem e verdadeiramente seu trabalho.

Nesta semana, o alvo da vez foi a Escola Classe 01 do Paranoá e sua equipe gestora. A escola, que está em processo de reforma de seus banheiros, virou “notícia” quando alguns pais de alunos acionaram um perfil de notícias no instagram para “denunciar” que um banheiro unissex estava sendo oferecido aos alunos e alunas da educação infantil. O centro da polêmica era uma simples placa que estabelecia que a utilização de determinado sanitário era permitido às meninas e aos meninos.

“A placa apenas indicava o uso comum, mas nunca ao mesmo tempo. Era apenas uma identificação. Papais e mamães podem trazer seus filhos sem preocupação alguma”, tranquilizou o representante do citado perfil de notícias depois de visitar a escola, acompanhado do diretor, professor Claudinei Batista. Em vídeo postado por esse perfil, Claudinei destacou que as crianças vão ao banheiro acompanhadas por monitores ou professores.

Entretanto, uma questão que poderia ser tão corriqueira ganhou notoriedade pela intromissão – ou desastrada ou mal intencionada – de quem deveria zelar pela educação pública, pelo bem-estar das crianças e pelo respeito aos profissionais do Magistério. O deputado federal Júlio César (Republicanos-DF), por exemplo, pronunciou-se por suas redes sociais, jogando luzes sobre o caso e incendiando a polêmica: “Não iremos admitir medidas impositivas lideradas por um determinado grupo de pessoas que não respeitam o desenvolvimento psicológico de nossas crianças”, bradou ele, demonstrando desconhecer completamente a realidade da escola.

Os fatos

O professor Claudinei explica que a EC 01 dispõe de banheiros feminino e masculino para a Educação Infantil. Entretanto, depois de reformar os banheiros de uso dos estudantes do Ensino Fundamental, chegou a vez de reformar o dos pequenos. Portanto, a utilização do mesmo banheiro por meninos e meninas – separadamente, ressalta-se – foi uma solução organizativa provisória adotada enquanto dura a reforma. Mais do que isso: uma solução que expressa zelo e cuidado com as crianças de 5 e 6 anos, para que não precisem dividir o banheiro com crianças maiores.

Ao mesmo tempo, podemos constatar que diversas escolas no DF oferecem banheiros unissex – em alguns casos, dentro da própria sala de aula, que são utilizados sempre sob supervisão de um monitor ou monitora. Cabe enfatizar que esses banheiros nunca foram palco de situação de assédio, violência ou constrangimento, ao contrário de outras instituições da nossa sociedade, que podem parecer “acima de qualquer suspeita”. A convivência e o compartilhamento do mesmo espaço tem potencial, inclusive, para fortalecer valores como respeito, empatia e alteridade, requisitos para construir uma sociedade mais tolerante e mais igualitária, diferente daquela representada na figura do deputado Júlio César, por exemplo.

Nas redes sociais, fala-se na possibilidade de exoneração do diretor e da vice-diretora. Tal arbitrariedade se constituiria numa profunda afronta aos valores da democracia e ao método democrático, sobretudo em se tratando de escola e de educação. A equipe gestora não foi ouvida e nem sequer foi convidada a explicar a situação. A destituição dos gestores da escola seria consequência, então, da deturpação dos fatos, não do verdadeiro cuidado com as crianças.

Situação acende alerta

A repercussão que o caso da EC 01 do Paranoá ganhou alerta para pontos importantes que representam bem a nossa triste conjuntura. Um deles é o reacionarismo de alguns setores, que estão sobre-representados nas casas legislativas, entre outras razões, por terem acesso a fartos recursos para suas campanhas eleitorais. Outro deles é a importância de se defender a gestão democrática das escolas e da educação, para que intervenções externas tenham menos força que a comunidade escolar para definir seus rumos.

Enquanto o país e o DF se mantêm reféns da propagação da covid-19, da influenza e outras enfermidades, enquanto a carestia é cada vez mais agressiva e evidente e o povo passa fome, enquanto os desastres naturais lembram que a relação predatória com a natureza custa vidas humanas, enquanto tudo isso acontece, aqueles que deveriam garantir os direitos do povo estão mais interessados em distrair a atenção das pessoas gerando e propagando fake news e falsas polêmicas para continuar como sempre estiveram: à parte dos reais problemas da nossa população.