Esvaziamento do orçamento da Educação impacta fortemente a EJA

O auditório do Sinpro lotou na noite da quarta-feira (28/8), para o Seminário sobre os desafios da EJA no DF. Diversos(as) estudantes compareceram para a discussão do tema, e os dados apresentados pelos especialistas são estarrecedores.

O evento foi transmitido ao vivo nas redes do Sinpro (confira o link ao final desta matéria), e é mais um movimento do sindicato em defesa da Educação de Jovens e Adultos, que vem sendo sistematicamente negligenciada pelo governo Ibaneis / Celina. A EJA é tema de campanha permanente do Sinpro, que entende essa modalidade como fundamental para a emancipação de pessoas que sofrem com a baixa escolaridade, muitas vezes resultado de falta de oportunidade de estudos e necessidade de ingresso no mercado de trabalho.

O presidente da CUT-DF, Rodrigo Rodrigues, lembrou que a EJA é assunto a ser discutido na entidade, uma vez que essa modalidade é a educação do trabalhador, que não teve todas as oportunidades de permanecer na escola, por diversas razões – a grande maioria porque teve que deixar de estudar para trabalhar, por necessidade da vida.

O diretor do Sinpro Cláudio Antunes denunciou que o governo do Distrito Federal muitas vezes fecha os olhos para o público da EJA, mas o Brasil e o DF ainda tem muita necessidade dessa modalidade de ensino.

 

A demanda existe, mas não é mapeada

O coordenador do Fórum Distrital de Educação, Júlio Barros, trouxe uma série de dados para se pensar e analisar a EJA no Brasil e no DF.

De acordo com o último censo, o número de brasileiros(as) com 15 anos ou mais sem alfabetização é de 11,4 milhões de pessoas. A grande maioria dessas pessoas têm cor: dentre as pessoas maiores de 18 anos que não concluíram a educação básica, 62% são negras. Nos dados do analfabetismo no Brasil, a taxa de pretos(as) não alfabetizados é de 10,1%; entre pessoas pardas, esse índice é de 8,8%. Entre as pessoas brancas, a taxa de analfabetismo é a metade: 4,3%.

Outro recorte importante: 81% das pessoas privadas de liberdade no Brasil não concluíram a educação básica. Enquanto isso, no Distrito Federal, o percentual de oferta de matrículas da EJA na forma integrada à educação profissional no sistema prisional é de 0%.

Júlio aponta ainda o desastre do golpe de 2016 e os subsequentes governos Temer e Bolsonaro para a educação brasileira. O golpe de 2016 congelou os investimentos em educação e resultou em anomalias como o chamado “Novo Ensino Médio”. Os governos Temer e Bolsonaro promoveram uma série de retrocessos na educação, como o Escola sem Partido, o Novo Ensino Médio, tentativa de privatização do Fundeb, militarização de escolas. Tudo isso também teve reflexos importantes na EJA: em 2022, a oferta de matrículas na modalidade, na forma integrada à Educação Profissional foi de 1,5% (486 matrículas) – a meta prevista no Plano Nacional de Educação era de 57,5% (17.883 matrículas).

“Com a eleição de Lula, não chegamos ao paraíso, mas saímos do inferno. Em 2023, a EJA foi reinserida na agenda do MEC com a retomada da SECADI – Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão, e a Comissão Nacional de Alfabetização e Educação de Jovens e Adultos (CNAEJA)”, aponta o coordenador do FDE.

O atual Governo Federal também destinou R$ 4 bilhões para investimentos com vistas à superação do analfabetismo e a qualificação da EJA.

 

Dados e documentos destruídos

A professora Dorisdei Valente Rodrigues, coordenadora do Grupo de Trabalho Pró-Alfabetização (GTPA Fórum EJA), após denunciar que a SEE-DF não aceita conversar com o grupo, lamentou que a Capital Federal ainda esteja discutindo alfabetização de pessoas maiores de 15 anos. Ela lembrou que, em 2014, o DF foi considerado território livre do analfabetismo. “O que aconteceu nesses últimos 10 anos para que retrocedêssemos tanto?

Dorisdei conta que, nos governos passados, não só políticas, como também documentos referentes à EJA, foram destruídos. O site dos Fóruns EJA em todos os estados brasileiros é o maior repositório de informações da EJA no Brasil.

“Pesquisadores têm muitas dificuldades em obter os dados do Distrito Federal. Havia a Codeplan, que coletava esses dados. A Codeplan tornou-se o IPDF, cuja última coleta de dados data de 2021.”

A professora Dorisdei aponta outro dado: de acordo com o Censo, em 2023, dos quase 174,6 milhões de brasileiros(as) com 14 anos ou mais, 25,1 milhões já haviam frequentado algum curso de qualificação profissional – 14,4% desse universo. A busca por qualificação profissional é um fato, logo, existe demanda para a EJA. Por que não existe oferta por parte do GDF?

Dorisdei denuncia que, num intervalo de 12 anos, o DF não avançou: “tínhamos toda a estrutura para avançar. Continuamos do mesmo jeito, com uma grade curricular defasada, pois a grade atualizada não é aplicada pela SEE-DF.”

Ela contou que o Fórum GTPA solicitou em 7 de março de 2023 à SEE-DF audiência para tratar de 18 pontos de pauta referentes à EJAIT no DF, e nunca obteve resposta. Dentre os assuntos a serem discutidos, destacam-se:

– O diagnóstico da evasão da EJAIT no pós-pandemia;

– Chamada pública (anúncios e campanhas intensas), que não existiu e não atingiu a demanda social de trabalhadores para matricula na EJA;

– A busca ativa contínua, que consiste em sempre verificar o que aconteceu para que os e as estudantes da EJAIT deixassem de frequentar as aulas, e o que fazer para contornar essas adversidades;

– A criação de uma bolsa permanência e de uma série de políticas que permitam o acesso à educação noturna, como transporte, alimentação e saúde – como atendimento oftalmológico e fornecimento gratuito de óculos.

–  Pesquisas para identificação da demanda social, a partir do Cadúnico do Bolsa Família, que ajudam a mapear a demanda da EJA no DF;

– Cumprimento das diretrizes operacionais da EJA, como atualização da matriz curricular da modalidade.

– Implementação do primeiro segmento com alfabetização emancipadora de trabalhadores;

– Expansão da EJA integrada à Educação Profissional;

– Formação de professores para a EJA;

– Avaliação da oferta da EJA à distância.

– Avaliação da EJA interventiva.

 

Reprovação para evitar contratação de professores

EM sua participação no debate, o deputado distrital Gabriel Magno denunciou que o estrangulamento do orçamento da educação no DF impacta muito fortemente a EJA. “Para o governo distrital, alguns tem menos direitos que outros”.

Ele trouxe uma séria denúncia de uma escola em São Sebastião: a escola ofertava EJA Interventiva, e foi instruída a alterar o processo de avaliação de estudantes, de forma a reprovar quem estivesse concluindo o primeiro segmento. Com esse artifício, não haveria a necessidade de contratação de professores para o novo segmento.

Veja as fotos do evento: VEJA O ÁLBUM

Confira a íntegra do Seminário Os Desafios da EJA no DF: