Empresário defende reforma tributária capaz de reduzir desigualdades sociais

Fundador e diretor-executivo da Petz, o empresário Sergio Zimerman defendeu uma reforma tributária capaz de reduzir as desigualdades sociais. A declaração foi dada em entrevista ao jornal Estado de S. Paulo, publicada nessa segunda-feira (7). “Pago menos imposto do que um operador de caixa da empresa. É uma vergonha”, diz o fundador da Petz.

Segundo a matéria, Sergio Zimerman acredita que a reforma tributária é a melhor forma de reduzir a desigualdade social. Ele também considera que, para além dos programas sociais de distribuição de renda, a reforma tributária deve ser encarada como uma ferramenta de justiça social. Em sua visão, hoje os ricos pagam impostos de menos e os pobres acabam sendo penalizados.

“Eu, enquanto CEO [Chief Executive Officer, em inglês; e, diretor-executivo, em português], da companhia, pago menos imposto do que um operador de caixa da minha empresa. Isso é uma vergonha. Não acho que um país pode dar certo com esse tipo de mentalidade”, disse Zimerman. “Fico preocupado quando vejo todas as propostas de reforma que foram discutidas até o momento… Vejo que nenhuma toca no assunto mais central, que é essa brutal concentração de renda”.

“É impossível reconstruir um país e torná-lo soberano sem uma reforma tributária justa, destinada a promover justiça social. A denúncia do empresário é semelhante à que temos feito há décadas no movimento sindical e político-partidário e que, agora, está mais à vista por meio da campanha ‘Tributar os Super-Ricos para Reconstruir o País’. O sistema tributário brasileiro é um monstro que enriquece cada vez mais os mais ricos e empobrece cada vez mais os mais pobres. Precisamos mudar isso radicalmente”, afirma Rosilene Corrêa, diretora da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), ex-candidata a senadora pela federação Brasil da Esperança no Distrito Federal e vice-presidenta do PT-DF.

“Acho importante, inclusive, que uma reforma do sistema tributário brasileiro pode e deve ser com destino definido da arrecadação para as áreas que, efetivamente, trarão o equilíbrio social e econômico do nosso País”, afirma a diretora da CNTE. Ela informa que o alerta do empresário expressa muito das propostas e análises que os economistas e auditores fiscais vêm veiculando por meio da campanha “Tributar os Super-Ricos para Reconstruir o País”.

“Nos unimos a parlamentares e a várias organizações do movimento sindical e da sociedade civil e lançamos, em agosto de 2020, essa campanha, que tem sido apoiada e realizada por muitas entidades nacionais. Temos divulgado nossas propostas e sugestões de alteração do sistema tributário nacional nas redes sociais”, informa Rosilene.

A campanha tem um projeto fiscal para o Brasil e, dentre os destaques, estão a isenção de impostos para quem ganha até três salários mínimos e para as micro e pequenas empresas com faturamento anual de até 360 mil reais. Além disso, defende o aumento na taxação de pessoas físicas com salários acima de 60 mil por mês; bem como o aumento no imposto sobre heranças, que teria variação progressiva de 8% a 30%. Segundo os autores da proposta, essas medidas vão gerar um acréscimo na arrecadação de R$ 292 bilhões, onerando apenas os 0,3% mais ricos da população.

Além disso, criou a Niara, uma personagem que está sempre divulgando e explicando as propostas da campanha para a construção desse novo sistema de tributação. Nira divulga análises e comparações com base na realidade nacional e internacional. Nesta semana, por exemplo, Niara divulgou o tema da transição para um tempo de justiça social. Conectada com a eleição de Lula, a personagem afirma que o mundo celebra um tempo mais esperançoso para o Brasil e animador para tantos países frente aos desafios comuns. “A democracia revigorada fortalece sonhos e semeia possibilidades. O momento exige ajustes, colaboração, entendimento para uma transição para mais igualdade com a colaboração de todes”, diz.

E continua: “O Brasil pode oferecer dignidade a toda sua gente e ser o gerador de mais igualdade e justiça social. A justiça fiscal é o instrumento para harmonizar os desequilíbrios. O Brasil tem déficit de cidadania e a população precisa caber no orçamento. Momentos cruciais de crise no mundo comprovaram que a solidariedade tributária superou os piores momentos da história e geraram nações vigorosas. É hora da transição para a solidariedade tributária e a justiça fiscal”. Confira a publicação nas redes:

 

Para conhecer a opinião do empresário Sergio Zimerman, lei a entrevista na íntegra a seguir:


‘Pago menos imposto do que um operador de caixa da empresa. É uma vergonha’, diz fundador da Petz

 

O que o resultado das urnas diz para o senhor?

 

O resultado revela o que o é processo democrático de alternância de poder. Infelizmente estamos vendo esse ruído, mas se Deus quiser isso passa, e passa rápido. Não acho que isso deva se estender. Eu vejo sempre um novo governo como uma esperança renovada. Esperança renovada em um tema que, para mim, é central: a desigualdade social brutal que existe no Brasil. Quando se considera um novo governo com as características de liderança que o (presidente eleito Luiz Inácio) Lula (da Silva, do PT) tem, acho que, talvez, eu possa encontrar um pouco mais de eco nesse tema. No entanto, tenho a sensação de que essa questão pode ser mal endereçada.

 

Em razão do viés econômico do governo eleito?

 

Muitas vezes, uma parte significativa dos políticos imagina que a melhor forma de resolver o problema da desigualdade social é por meio de programas sociais ou por um estado gigante, com muito assistencialismo e somente isso. Algum grau de assistencialismo é necessário, principalmente para as pessoas que estão abaixo da linha da pobreza. No entanto, para realmente interferir na desigualdade e promover oportunidades de elevar a condição de vida das pessoas de uma forma estruturada, para mim, a mãe de todas as reformas é a tributária.

 

Por quê?

 

O sistema atual brasileiro concentra renda. Ou seja, aqui, quanto mais dinheiro se ganha, menos se paga impostos. Eu como CEO da companhia, pago menos imposto do que um operador de caixa da minha empresa. Isso é uma vergonha. Não acho que um país pode dar certo com esse tipo de mentalidade. Então, fico preocupado quando vejo todas as propostas de reforma que circulam até hoje, que foram discutidas até o momento, e vejo que nenhuma toca no assunto mais central, que é essa brutal concentração de renda. É um sistema regressivo, com tributação no consumo. No Brasil, há uma média de 50% de impostos sobre os bens consumidos que não se verifica no resto do mundo. No resto do mundo, a média é de 20%. Isso dá a dimensão de como quem tem menos recursos paga mais impostos [pois quanto menos recursos se tem, mais eles são destinados ao consumo]. O que agrava a situação é que o sistema de impostos é embutido. As pessoas não têm consciência da carga tributária que suportam. Saber o quanto se paga por produto provocaria uma revolta. Podemos ainda citar outro aspecto que no governo atual foi negligenciado o tempo todo que é o não reajuste da tabela do Imposto de Renda.

 

Essa era uma proposta de campanha de Jair Bolsonaro (PL) em 2018.

 

Era uma proposta de campanha. O problema é que isso não é uma concessão, um favor que o governo atual ou o próximo fariam. Isso é uma obrigação, porque a inflação gera mais arrecadação para o governo federal. É uma maneira disfarçada de aumentar impostos. Há 10 anos, só pagava imposto de renda quem tinha cargos de gerente para cima. Não basta a brutal carga sobre o consumo, ainda se faz esses salários mais baixos pagarem imposto de renda. Esse montante poderia estar circulando na economia. Tenho renovadas esperanças com o governo Lula, pois espero que se tenha a visão correta de como empoderar os mais pobres, como fazer justiça de distribuição de renda com a mentalidade correta. Naturalmente ele teve oportunidade de fazer isso em seus mandatos e não fez, mas sempre será tempo de fazer. É preciso encontrar outras bases de tributação. A tributação sobre dividendos, por exemplo, é um absurdo alguém defender que não deveria acontecer.

 

Isso não costuma ser mal visto no empresariado?

 

Não posso falar em nome de todo o empresariado, mas acho que o empresariado que tem consciência, não pode imaginar que tributar dividendos seja uma coisa equivocada. Da mesma forma, se por um lado o Brasil não tributa dividendos, por outro, o imposto sobre o lucro das empresas é o imposto mais alto do mundo. O ministro Paulo Guedes fez uma proposta absolutamente coerente, que era a diminuição dessa alíquota sobre as empresas e a tributação sobre dividendos. A lógica é tratar de forma diferente o dinheiro que é reinvestido na economia versus o que vai para o bolso do acionista. Assim, se o dinheiro vai para o acionista comprar um avião, perfeito, paga-se um imposto adicional. Agora, se o empresário vai abrir mais lojas, uma fábrica e gerar empregos, paga-se menos.

 

E como é possível fazer isso?

 

O que eu estou dizendo não é simples de fazer. Meu ponto é que se planejarmos o modelo ideal, com fases de transição e um prazo de 20 anos entre o que temos hoje e a proposta final, é possível. Vai se evitar muitas resistências. É muito tempo? Sim, mas se tivéssemos feito isso em 2000, estaríamos colhendo os frutos.

 

Há um nome preferido do empresariado para o ministério da Fazenda ou da Economia?

 

Prefiro não falar em nomes. Penso mais em políticas públicas do que em políticos. Qualquer ministro, seja de qual partido ou corrente for, que pense nessas questões, é o meu preferido. Tem nomes que o mercado adora, mas será que agora vão fazer o que não fizeram antes? Eu tenho dúvidas. Prefiro apostar na defesa de uma ideia e apoiar qualquer um que compactue com isso e saiba respeitar o empresariado e suas reivindicações justas, sem se curvar à miopia de alguns empresários que acham que distribuição de renda é assunto de comunismo. Essa é uma visão míope. Acredito nisso como cidadão, mas também como empresário. Minha companhia será mais forte, à medida que a sociedade for mais forte. Quanto mais renda houver no Brasil, mais lojas eu vou abrir.

 

O bloqueio de estradas por apoiadores do atual presidente traz riscos de desabastecimento?

 

Potencialmente traz riscos, já que temos caminhões nas estradas todos os dias. Isso é lamentável e gera prejuízos econômicos. Espero que seja controlado o mais breve possível e de forma pacífica. A eleição acabou domingo. A divisão no país deveria ter acabado domingo. Na segunda-feira, a cabeça deveria ser de construção de políticas públicas.

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