Educação de qualidade passa pela valorização dos educadores
“Há um modelo de educação que não dialoga com os desafios do século 21 , mas, de certa maneira, com os séculos 19 e 20. Estamos diante de uma transição da sociedade do conhecimento e, ao mesmo tempo, uma transição demográfica que faz com que as pessoas devam viver mais tempo. Isso implica em reconhecer que os desafios da educação hoje é para a vida toda.”
A afirmação do economista e docente do Instituto de Economia da Unicamp (SP), Marcio Pochmann, nesta quinta-feira (15), dia dos professores, durante 12º CONCUT, aponta que não basta pensar o hoje. É preciso olhar a construção a longo prazo.
Para a professora Fátima Silva, vice-presidenta da Internacional da Educação para América Latina (IEAL), é preciso observar as características do setor no continente. “No Brasil, os professores ganham por sua formação e não por seu nível de atuação [para qual ciclo o educador leciona], o que faz com que os salários sejam melhores”, relata.
Por outro lado, Fátima afirma ser necessário consolidar o piso salarial nacional nos estados e municípios e cumprir todas as metas do Plano Nacional de Educação (PNE), dentre as quais estão os 10% do PIB (Produto Interno Bruto) para a educação. “Isso só acontecerá se houver forte mobilização e unidade da categoria”, disse, ao lembrar que os royalties do petróleo também devem ir para a educação.
Cumprimento da jornada do piso
Apesar de estar em vigor desde 2009, a Lei n° 11.738, de 2008, que institui o piso salarial para professores da rede pública de educação básica, é a pauta do dia. Diferentes estados e municípios no Brasil ainda não adotaram o pagamento, nem tampouco adequaram suas redes de ensino para que 1/3 da jornada dos educadores seja direcionada às atividades extraclasse.
Segundo o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Roberto Leão, essas questões tornam a luta e o cotidiano mais difíceis. “Estamos sendo obrigados a fazer greve pelo cumprimento da lei do piso nos estados. E é importante estarmos no 12º CONCUT porque a sociedade brasileira e todos os trabalhadores precisam assumir a defesa da educação como luta própria”, diz.
Com relação ao salário, estudo internacional feito pela consultoria Gems Education Solutions aponta que os educadores brasileiros recebem 14,8 mil dólares por ano (Paridade de Poder de Compra – PPC). A disparidade em relação a outros países é acentuada. Na Suíça, o salário chega a 68,8 mil dólares e na Bélgica a 51,4 mil dólares. A pesquisa considerou uma média de 15 anos, a partir do final da década de 1990.
Triste realidade da escola pública
Para o professor e presidente da CUT São Paulo, Douglas Izzo, não há o que comemorar nesta data quando o assunto é o estado paulista. “O governador não cumpre a lei do piso, não negocia, responde com violência e, agora, quer reestruturar o ensino”, alerta o dirigente, que esteve em greve neste ano por 92 dias contra baixos salários e condições precárias de trabalho.
Ao falar sobre reestruturação do ensino pretendida pelo governo paulista, Douglas se refere ao anúncio do governador Geraldo Alckmin (PSDB) de fechamento de escolas. Segundo levantamento do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), desde o início do ano foram eliminadas 3.390 classes.
O objetivo do governo é separar as unidades por ciclos: ensino médio, anos iniciais (1º ao 5º) e anos finais (6º ao 9º). Hoje (15), estudantes da rede pública paulista protestaram contra a reestruturação anunciada pelo governo Alckmin, em frente ao Palácio dos Bandeirantes.
No site do governo de São Paulo, há uma chamada para a população acessar as informações com o título “Tire todas as suas dúvidas sobre a nova reorganização escolar”, mas, ao clicar no link, a página não é encontrada.
A professora e vice-presidenta da CUT-GO, Iêda Leal, relata que a situação é semelhante no governo de Marconi Perillo, também do PSDB. “Ele quer terceirizar a educação, como ele já fez na saúde. Não vamos aceitar o absurdo de quem não assume compromisso algum com os trabalhadores”, relata.
Por outro lado, Iêda diz que a luta estadual também se dá com a ausência da aplicação da Lei 10.639, de 2003, “para combater o racismo de forma adequada”, pontua, em referência ao ensino da história e cultura africana e afro-brasileira.
Mudar é preciso
A professora Maria Consuelo, presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Educação (Sinteal), de Alagoas, diz que o estado tem o pior índice de analfabetismo e culpa o governador Renan Calheiros Filho (PMDB) pela atual condição. “Por falta de investimento na educação, temos alunos fora da escola. Faltam profissionais e motivação. Queremos uma escola em tempo integral com práticas que aproximem a juventude”, propõe.
Já a professora e presidenta da CUT Minas Gerais, Beatriz Cerqueira, afirma que a realidade mineira é de tentar recuperar o que o estado viveu na última década com três gestões tucanas, sendo duas de Aécio Neves e uma de Antônio Anastasia. “Eles desmontaram a educação pública. Em MG, tivemos experiências como escola funcionando em motéis desativados e em posto de gasolina. Sem falar que mais 60% das escolas não têm quadra de esporte e nem refeitório”.
Para Beatriz, o choque de gestão representou baixos salários e desvalorização. “Nossa tentativa agora é recuperar a escola pública. Em 2015, tivemos um acordo inédito que foi o reconhecimento do piso salarial para a jornada existente na carreira, de 24 horas, e uma progressividade para que até 2018 recebamos o piso salarial para esta jornada existente no estado”, conta.
Violência contra os trabalhadores
O Paraná, estado governado por Beto Richa, do PSDB, ficou conhecido mundialmente neste ano por conta do enfrentamento feito contra professores.
Durante o 12º CONCUT, os educadores ficaram emocionados ao lembrar da resistência da categoria que sentiu na pele a bala de borracha, a exemplo do que aconteceu com o professor Antônio Marcos Rodrigues.
“Fui atingido no Paraná no dia 29 de abril pela Polícia Militar. Estávamos numa manifestação para defender a nossa carreira e a nossa previdência. Fomos recebidos com bomba de gás lacrimogêneo, entre outros artefatos. Parecia um campo de guerra onde tivemos mais de 300 feridos. Claro que as consequências físicas, emocionais e psicológicas não têm reparação”, enfatiza.
Segundo o presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Educação do Paraná (APP-Sindicato), Hermes Leão, a greve que durou 73 dias desmascarou o modus operandi dos tucanos. “O que passamos expôs o modo e o modelo de gestão de estado mínimo e de políticas neoliberais no serviço público, padrão semelhante ao estado de São Paulo, que como nós enfrenta neste final de ano o fechamento das escolas. Vem agora mais um período de intensa resistência”, alerta