Editorial | Bolsonaro adota modelo econômico que até o FMI diz estar em xeque

O neoliberalismo não gerou crescimento e aumentou as desigualdades sociais nos países em que foi adotado desde a década de 1980. Isso é o que diz um artigo publicado pelo próprio Fundo Monetário Internacional (FMI), que supervisiona o sistema monetário internacional e indica que esse modelo econômico pode estar no início do fim.

Intitulado “Neoliberalism: Oversold?”, os autores, Jonathan D. Ostry, Prakash Loungani e Davide Furceri, afirmam que, em vez de gerar crescimento, algumas políticas neoliberais aumentaram a desigualdade, por sua vez, colocando em risco a expansão duradoura e que alguns aspectos também impediram o crescimento das economias que adotaram o neoliberalismo, causando exatamente o contrário do que prevê a agenda neoliberal.

Os autores apontam a remoção das restrições na circulação de capital (chamado de liberalização da conta capital) e a consolidação fiscal (chamada de austeridade), que compõem a agenda neoliberal, são dois entre os principais aspectos responsáveis pelo aumento das desigualdades sociais nos países que adotaram esse tipo de modelo econômico e fatores impeditivos para o crescimento de tais economias.

O artigo indica que políticas de austeridade, como a Emenda Constitucional 95, de 2016, (EC95/16), que congelou investimentos em áreas sociais, iniciadas no Brasil pelo governo ilegítimo de Michel Temer e aprofundadas no governo Bolsonaro, não só geram custos sociais substanciais, reduzindo seus canais de oferta, como também prejudicam a demanda e, assim, pioram o emprego e desemprego. Mostra também que investimentos em políticas públicas de inclusão e desenvolvimento sociais são essenciais para promover o crescimento da economia de um país.

“[…] Na prática, os episódios de consolidação fiscal foram seguidos, na média, por quedas em vez de expansões de resultados. Em média, uma consolidação de 1% do PIB aumenta a taxa de desemprego de longa duração em 0,6 pontos percentuais e aumenta em 1,5 por cento, dentro de 5 anos, o Índice de Gini de desigualdade de renda”.

Ao analisar a liberalização da conta capital e a política de austeridade, os autores do artigo dizem ter chegado a três conclusões inquietantes:

1 – Os benefícios, em termos de crescimento, parecem bastante difíceis de estabelecer quando se olha para um amplo grupo de países.

2 – Os custos, em termos de aumento da desigualdade, são proeminentes. Tais custos resumem a compensação entre os efeitos no crescimento e na igualdade de alguns aspectos da agenda neoliberal.

3 – O aumento da desigualdade, por sua vez, prejudica o nível e a sustentabilidade do crescimento. Mesmo que o crescimento seja o único, ou o principal propósito da agenda neoliberal, os defensores de tal agenda precisam ter atenção aos efeitos distributivos.

O jornal The Guardian informa que, no artigo, os pesquisadores do FMI admitem a necessidade de uma revisão no modelo neoliberal, sobretudo nas políticas de austeridade, e afirmam que o “neoliberalismo não entregou o crescimento econômico conforme prometido – ele só fez algumas pessoas muito mais ricas, provoca falhas épicas que deixam para trás destroços humanos e custam bilhões de dólares para limpar”.

De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), “o Índice de Gini, criado pelo matemático italiano Conrado Gini, é um instrumento para medir o grau de concentração de renda em determinado grupo. Ele aponta a diferença entre os rendimentos dos mais pobres e dos mais ricos. Numericamente, varia de zero a um (alguns apresentam de zero a cem)”.

O neoliberalismo é um modelo econômico fomentado pela Escola de Chicago, que é uma escola de pensamento econômico que defende o mercado livre e que foi disseminada por alguns professores da Universidade de Chicago. Os líderes dessa escola são George Stigler e Milton Friedman.

As teorias da “Escola de Chicago” embasaram a administração econômica da ditadura de Pinochet, no Chile, na década de 1970-80, com os chamados Chicago boys. Um deles é Paulo Guedes, ministro da Economia do governo Bolsonaro. Posteriormente, as teorias da Escola de Chicago (neoliberalismo) foram adotadas, nos anos 1980, por Margaret Thatcher, na Inglaterra (thatcherismo), e, por Ronald Reagan, nos Estados Unidos (reaganomics).

James Tobin, professor da Universidade de Yale, e Joseph Stiglitz, ex-vice-presidente do Banco Mundial, criticaram, violentamente, em suas publicações, as ideologias defendidas pela “Escola de Chicago” e pelo Consenso de Washington.

A conclusão é a de que o governo Bolsonaro insiste em um modelo de economia comprovadamente fracassado nos aspectos sociais e que não irá, por causa disso, gerar crescimento para o Brasil. O próprio FMI demonstra que o neoliberalismo está no início do fim, ou seja, é obsoleto e incapaz de gerar crescimento. Basta ver as crises da Argentina, do Chile, da Tailândia,da Grécia, do Brasil e de todos os outros países, quer sejam ricos quer sejam pobres, para comprovar o início do fim do modelo de transferência de renda para banqueiros e rentistas.

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