Desprestígio ou estratégia? A relação entre a secretária de Educação e o governador

Hélvia Paranaguá é a quinta pessoa a assumir a Secretaria de Educação (SEEDF) no governo de Ibaneis Rocha. Na pasta desde julho de 2021, a secretária não protagonizou nenhum grande feito para a carreira do magistério público, seja na pauta financeira ou pedagógica, o que reflete no processo de ensino junto aos estudantes e, na ponta, na sociedade.

Diante da imposição de um congelamento salarial de sete anos para professores(as) e orientadores(as) educacionais, Hélvia Paranaguá, que é da categoria, não se mostrou como articuladora de ações que garantissem recomposição salarial aos trabalhadores e às trabalhadoras do magistério público. Em entrevista a uma das principais rádios do DF, no último dia 23 de fevereiro, a secretária de Educação não apresentou qualquer proposta econômica à categoria, mesmo questionada pelo jornalista.

A agenda pública deste ano de Hélvia Paranaguá também não registra nenhuma reunião com o governador Ibaneis Rocha que tenha como pauta – pelo menos de forma explícita – a recomposição salarial da categoria do magistério público.

“Nas reuniões que tivemos com a secretária de Educação, ela sempre afirmou que nossas pautas econômicas, assim como as pedagógicas, tinham sido levadas ou seriam levadas para o governador Ibaneis. Entretanto, não houve avanço, principalmente nas questões econômicas. Não podemos ser categóricos, mas a situação nos leva a pensar que há um certo desprestígio da secretária junto ao governador”, aponta a diretora do Sinpro-DF Luciana Custódio.

A teoria fica ainda mais próxima de ser comprovada como fato diante do anúncio desta quinta-feira (15/03) do governador Ibaneis Rocha, que garantiu recomposição salarial para as forças de segurança do DF, com reajuste salarial de 10%. Motivado pelo secretário de Segurança Pública do DF, Julio Danilo, o governador solicitará ao presidente da República, Jair Bolsonaro, o envio de projeto ou medida provisória que altere a Lei de Diretrizes Orçamentárias 2022 da União (LDO) para viabilizar o reajuste, o que depende da aprovação de crédito adicional de R$ 800 milhões.

Além do aparente desprestígio da secretária de Educação do DF, Hélvia Paranaguá, junto ao governador Ibaneis Rocha, há também a análise de que o travamento da pauta da educação seja estratégico.

“Se não for desprestígio (da secretária junto ao GDF), então pode-se avaliar que é projeto. Além de gestora, a secretária é da nossa categoria, e sabe bem que não há ensino público de qualidade sem a valorização dos profissionais da educação. E, até hoje, o que o governo Ibaneis vem apresentando é uma política de total desvalorização da educação pública”, avalia o diretor do Sinpro-DF Cleber Soares.

Falta de vontade política
A comissão de negociação do Sinpro-DF apresentou diversas vezes ao governo do DF alternativas para contemplar a pauta econômica da categoria do magistério público.

Uma das ações que podem ser tomadas para valorizar a categoria é o atendimento da meta 17 do Plano Distrital de Educação (PDE), que equipara o vencimento básico de professores e professoras à média da remuneração das demais carreiras de servidores públicos do DF com nível superior.

Na lista de ações para a recomposição salarial do magistério, está também a incorporação da Gratificação de Atividade Pedagógica (Gaped) ao vencimento, a exemplo da Gratificação do Regime de Tempo Integral e Dedicação Exclusiva do Magistério da Secretaria de Educação do DF (Tidem), de 1992, incorporada ao vencimento em 2013.

Outra iniciativa que a Secretaria de Educação pode tomar é reforçar junto ao governador o pleito do Sinpro-DF de pagamento retroativo da sexta e última parcela do reajuste salarial conquistado pela categoria em 2013. Devida desde setembro de 2015, a parcela será paga em maio deste ano, segundo anúncio do GDF, mas sem a adequação dos valores devidos.

Para viabilizar a pauta do magistério público, ainda há a necessidade de reforçar a realização de reunião entre a comissão de negociação do Sinpro-DF e o governador Ibaneis Rocha. A solicitação vem sendo feita reiteradamente pelo sindicato, e chegou a ter indicativo de data, mas sem concretização. A última vez que Ibaneis recebeu a comissão foi no início de 2020.

“As propostas foram apresentadas e formalizadas há muito tempo. Entretanto, falta vontade política”, avalia a diretora do Sinpro-DF Berenice D’arc.

Remendo
Diante de um cenário de congelamento salarial de sete anos, o GDF anunciou com pompa o reajuste de gratificações de gestores escolares e a criação da Gratificação de Atividade de Coordenação Pedagógica (Gacop).

“Tanto o reajuste na gratificação de gestores e gestoras como a criação da gratificação para coordenadores e coordenadoras são essenciais. Entretanto, o que realmente precisamos é de recomposição salarial para toda a categoria. Cargos são transitórios. Remendos que atingem uma minoria da categoria não são solução”, avalia o diretora do Sinpro-DF Luciana Custódio.

De 2015 a janeiro de 2021, a perda salarial da carreira do magistério público é de 49%, se considerada a inflação pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor).

Pauta pedagógicas travadas
Embora o estanque na pauta econômica da carreira do magistério público seja alarmante, as pautas pedagógicas apresentadas pela categoria através do Sinpro-DF também estão sem os devidos encaminhamentos.

Por causa da crise econômica que atinge as famílias do DF, já era esperada a entrada de mais estudantes na rede pública de ensino, inclusive estudantes com deficiência, neste ano letivo. Foram 26 mil novas matrículas em 2022.

Sem planejamento prévio, a “saída” para atender a demanda foi superlotar salas de aula. Há escolas com até 47 estudantes por turma. Paralelamente, o déficit aproximado de monitores é de 3 mil, o que prejudica frontalmente o processo de aprendizado.

Nos dois anos de pandemia, o GDF também não estruturou um planejamento eficaz de construção e reforma de escolas. O Centro de Ensino 10 da Ceilândia, por exemplo, está fechado desde 2016.

Escolas estão sem professores. No Centro de Ensino Fundamental 214 Sul, na Asa Sul, por exemplo, que atende estudantes do 6º ao 9º ano (de 10 a 15 anos), há carência de professores(as) de matemática, português e inglês. Ao todo, o déficit é de 11 docentes; e o reflexo desse problema recai sobre, em média, 200 estudantes.

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Paralelo às questões estruturais, o projeto de militarização das escolas, que não apresentou nenhum resultado positivo, deslanchou e o novo ensino médio foi implantado diante de uma série de dúvidas para o corpo docente, que não recebeu formação adequada para desenvolver o método.

Não é possível bater o martelo sobre a relação entre a secretária de Educação, Hélvia Paranaguá, e o governador Ibaneis Rocha, se de desprestígio ou estratégia. Independente de qual for, os resultados disso recaem sobre o setor estrutural para um Estado democrático: a educação. E, no fim das contas, quem paga o pato é a sociedade.

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