Desafio e práxis no uso das Tecnologias em tempos de pandemia: um olhar de professor

por Sonia Cerqueira Alves*

O uso das Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação trouxe a possibilidade de uma reorganização do trabalho pedagógico, e trouxe também o redirecionamento da compreensão do papel do professor e da organização do tempo e espaço de sala de aula.

Durante o ano letivo de 2020, o surgimento da Pandemia de Covid-19 trouxe também o desafio do trabalho com os estudantes no Ensino Remoto, que abarcou todas as etapas do processo de ensino.

Sempre houve a preocupação com relação à formação dos professores para a utilização pedagógica do computador. O objetivo era a elaboração de uma Política Nacional de Informática Educativa. Mas, com a Pandemia de Covid-19, o uso dos recursos computacionais tornou-se imprescindível. Aqui no Distrito Federal, a formação continuada dos professores foi realizada de forma “rápida” pela EAPE, numa tentativa de tornar acessível uma forma de ensino que até então era realidade de poucos, quer docentes quer discentes.

As barreiras que sugiram no uso dessas tecnologias foram desde a formação dos professores que se sentiram despreparados para lidar com as tecnologias e com o ambiente virtual, até os estudantes que não tinham acesso nem aos aparelhos nem à conexão à Internet.

A necessidade existia, empurrava todo o corpo docente a adotar as tecnologias digitais de informação e comunicação em seus ambientes virtuais de aprendizagem, mas não houve, em nível nacional ou distrital, nenhuma adoção de políticas que facilitassem a aquisição de equipamentos ou de acesso à internet aos educadores ou educandos.

Para o aluno com deficiências, a dificuldade ampliou-se pela necessidade da intervenção, quase sempre indispensável, de um responsável que auxiliava com o uso das Tecnologias. Assim, ainda que a aprendizagem acontecesse com algumas limitações para os estudantes com desenvolvimento típico, para o estudante com deficiência o desafio se fez ainda maior.

Na Regiões da Periferia de Brasília, juntaram-se às barreiras de acesso, as de formação para o uso de tecnologias. Avaliamos que tal realidade foi muito prejudicial para o desenvolvimento do processo ensino – aprendizagem.

Há outras avaliações que apontam que a aprendizagem aconteceu, ainda que ficando aquém do esperado, ou mesmo não coincidindo com o desenvolvimento. Educadores, em Sala de Recursos, indicam que houve um retrocesso nas aprendizagens de forma global, principalmente para os estudantes que permaneceram apenas com o material impresso. Vale ressaltar que tivemos estudantes com acesso a plataforma e recursos digitais, e estudantes cujo único recurso nesse período foi o material impresso.

No retorno ao Ensino Híbrido, com menos estudantes em sala de aula, os professores conseguiram avanços significativos com todos os discentes. A atenção direcionada e individualizada trouxe ganhos de aprendizagem que não são possíveis em turmas com muitos estudantes.

Os professores afirmam ter sido significativo o trabalho desenvolvido junto aos estudantes com deficiência durante o período de Ensino Híbrido. Porém, quando se referiam à continuidade dos usos da Tecnologias em suas aulas, eles ressaltam a necessidade de formação continuada e de garantir e ampliar o acesso dos estudantes a uma atenção mais individualizada.

Com o retorno ao Ensino 100% Presencial dos estudantes, processo ao qual os professores no chão de sala não tiveram sequer direito a questionamento ou ponderação, vivenciamos a dificuldade de um retorno inseguro por toda a comunidade escolar.

Em relação a estes aspectos, torna-se imprescindível que a Escola reaprenda as dimensões de seu papel e que os professores reavaliem sua práxis compreendendo essa nova escola dentro do contexto em que nos encontramos. Também é imprescindível avaliarmos se nos apropriaremos ou não das tecnologias digitais, que faz parte do universo real para uma parte dos brasilienses, mas é a representação da completa forma de exclusão para outros.

Apesar das dificuldades, a maioria dos professores acredita que o processo ensino – aprendizagem dos estudantes com deficiência pode ser favorecido com a incorporação das tecnologias para além do período de Pandemia.

No ano do Centenário de Paulo Freire, é importante reforçar a importância do comprometimento do professor com a concepção de que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar possibilidades para a sua própria produção ou sua construção. Devemos não nos tornar alheios à realidade, e sem tornar possíveis todos os acessos ao conhecimento.

Sinto a necessidade de destacar o quão heroica foi a atuação de meus colegas professores nesse período: na sensibilidade, no acolhimento das dificuldades, nas quais muitas vezes se sentiram inseridos, e na superação de todas as barreiras possíveis para fazer “acontecer” aprendizagens significativas. Me compadeço com suas perdas, com seus medos e anseios que foram deixados de lado para amparar e apoiar seus pais e alunos.

Não poderia finalizar o ano sem compartilhar esse olhar tão meu, tão seu e tão nosso na esperança de dias melhores sem que nos esqueçamos de lutas e das conquistas.

Sônia Cerqueira Alves é Pedagoga pela UnB, com especialização em Gestão em Temas Contemporâneos pela UFT/Sinpro, e Psicopedagoga pela FASG