Deputados aprovam reforma do Ensino Médio e MP segue para o Senado

Os deputados federais concluíram, nessa terça-feira (13), a votação da Medida Provisória 746/16, que reformula o Ensino Médio. A MP aprovada na Câmara dos Deputados segmenta as disciplinas de acordo com as áreas do conhecimento e propõe a implantação do ensino integral com apoio financeiro da União ao setor público. A matéria segue, agora, para ser votada no Senado Federal.
A MP 746/16 foi transformada em Projeto de Lei de Conversão nº 34 (PLV 34) na Câmara porque sofreu alterações no texto original. O senador Pedro Chaves (PSC-MS), por exemplo, acrescentou que o currículo do Ensino Médio será composto pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e por itinerários formativos correspondentes a essas áreas do conhecimento: linguagem e suas tecnologias; matemática e suas tecnologias; ciências da natureza e suas tecnologias; ciências humanas e sociais aplicadas; e formação técnica e profissional.
Cada sistema de ensino organizará essas áreas e as respectivas competências e habilidades esperadas do estudante segundo seus próprios critérios. Poderá haver uma integração de componentes curriculares da BNCC com disciplinas dessas áreas e, após a conclusão de um itinerário formativo, os estudantes poderão cursar outro, se houver vaga.
De acordo com o texto aprovando na terça, todas as regras valerão para as redes de ensino público e privado, mas o cronograma de implantação terá de ser elaborado no primeiro ano letivo seguinte à data de publicação da BNCC. Ou seja, a implantação só ocorrerá no segundo ano letivo depois da homologação da Base.
O texto aprovado na Câmara também mantém a obrigatoriedade da oferta de conteúdos de filosofia e sociologia. O texto original da MP, apresentado em setembro deste ano, havia excluído essas e outras disciplinas, que são previstas como obrigatórias pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), que ainda rege a educação no país.
O novo texto foi aprovado por 324 deputados federais que votaram a favor de que o ensino de filosofia, sociologia, artes e educação física seja ofertado nesta etapa e apenas cinco contrários.
A MP é um conjunto de medidas que alteram o modelo de educação aplicado no Ensino Médio que, além de desconstruir a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), altera o  Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) e outras legislações em vigor, como o Plano Nacional de Educação (PNE) e os Planos Estadual e Distrital de Educação (PEE e PDE).
O governo diz que o objetivo é tornar essa fase mais atrativa para o estudante e diminuir os altos índices de evasão. Contudo, desestrutura o ensino de forma a enfraquecê-lo ainda mais em todo o país.
Em nota pública editada no dia 30 de novembro, a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) emitiu opinião sobre o relatório do relator Pedro Chaves (PSC-MS) acerca da Medida Provisória nº 746 (PLV 34).
Na nota, a CNTE informa que ela “e as entidades contrárias à MP estão mobilizadas no sentido de pedir o adiamento da votação e a ampliação do debate parlamentar sobre temas polêmicos da proposta contida no relatório da Comissão Mista que deu origem ao PLV 34. E destaca os pontos de discordância. Confira os pontos apontados na nota da CNTE:
1 – Flexibilização do direito à educação básica universal (conceito da MP 746 e do PLV 34, combinado com o art. 36, §§ 6º, II e 11): a redução da parte geral de conhecimentos proposta para os estudantes do ensino médio das escolas públicas, em comparação aos das escolas privadas, constituirá verdadeiro apartheid socioeducacional com implicações nas condições de acesso às universidades públicas, onde os mais prejudicados serão os estudantes da rede pública. Está se institucionalizando no Brasil dois tipos de escolas: uma para os ricos e a classe média mais abastada, que podem pagar os colégios de alto padrão; e outra para os pobres, focada na formação reducionista, inclusive do ponto de vista da parte técnica-profissional, com a adoção de métodos à distância que poderão aproveitar quaisquer cursos, experiências e atividades do educando, sem a devida problematização da formação escolar.
2 – Carga horária geral do ensino médio (art. 24, § 1º): o aumento da jornada diária para 5 horas, em até cinco anos, está longe da perspectiva de implementação da escola integral em tempo integral reivindicada pela sociedade para toda a educação básica, inclusive na etapa do ensino médio. O PLV 34, portanto, é duplamente restritivo ao excluir a educação infantil e o ensino fundamental desse compromisso, e de alongar demasiadamente a obrigatoriedade do aumento da jornada do ensino médio para 5 anos, num contexto em que a maioria das redes privadas e parte dos entes públicos já a praticam.
3 – Carga horária para aplicação da Base Nacional Comum Curricular (art. 35-A, § 4º): o texto original da MP 746 previa até 1.200 horas para a BNCC e o PLV 34 dispõe de até 1.800 horas. No cenário atual, onde a carga horária total do ensino médio é de 2.400 horas (em três anos), o limite proposto para a BNCC pode chegar a 75% desse tempo. Porém, quando a jornada escolar do ensino médio for ampliada para 1.000 horas anuais (3.000 no total), esse percentual não poderá passar de 60% do total do curso, podendo até ser menor. Já na projeção para a escola de tempo integral (1.400 horas anuais e 4.200 no total), as 1.800 horas propostas no PLV 34 limitará o currículo da BNCC a menos da metade da carga horária do ensino médio (42,8%), podendo.
4 – Obrigatoriedade de disciplinas curriculares (art. 26 e art. 35-A): embora o PLV 34 retome a obrigatoriedade das disciplinas de Artes e Educação Física, continuam excluídas do currículo a Sociologia, a Filosofia e a Língua Espanhola. As duas primeiras são essenciais para a formação humanística e cidadã dos estudantes e a língua espanhola, não obstante a importância do inglês, cumpre o objetivo de ampliar os canais de integração regional, especialmente nos estados que fazem fronteira com os países de colonização espanhola. Por outro lado, a obrigatoriedade apenas da Matemática e da Língua Portuguesa ao longo de todo o ensino médio não disfarça o caráter instrumental que a MP 746 pretende aprofundar do currículo do ensino médio, focando a formação dos jovens para os testes de proficiência nacional e internacional e para as demandas essenciais do “mercado de trabalho”.
5 – Sistema de crédito de disciplinas (art. 36, § 10): essa experiência trazida dos Colleges americanos requer acompanhamento sistemático dos estudantes por equipes de profissionais que não existem nas escolas públicas brasileiras. Tal como se encontra no PLV 34, o sistema de crédito fragmenta e compromete o aprendizado estudantil, possibilitando, ainda, camuflar os índices de evasão escolar, pois basta o estudante estar matriculado numa única disciplina (cursando-a ou não, efetivamente) para ter considerada a sua matrícula ativa.
6 – Ampla certificação de competências (art. 36, §§ 8º e 11 da LDB): um rol extenso de cursos e atividades extracurriculares, muitos sem a devida problematização escolar, é considerado para a certificação de saberes dos estudantes, incentivando o aligeiramento da formação.
7 – Expansão da privatização do ensino médio (art. 36, § 11 da LDB, art. 10, XVIII da Lei 11.494 – Fundeb e art. 10 do PLV 34): os entes públicos ficam autorizados a repassar recursos públicos para escolas e instituições privadas que ofertarem cursos técnico-profissionais, sobretudo através da rubrica do Fundeb. O MEC, por sua vez, poderá financiar emissoras privadas de rádio e televisão que transmitirem programas e ações educacionais do tipo Telecursos. Portanto, a reforma cria novos “ralos” para as verbas públicas educacionais.
8 – Oferta de itinerários formativos específicos (art. 36, § 3º da LDB): embora a redação do PLV 34 considere a possibilidade de os sistemas poderem compor itinerários formativos integrados entre a BNCC e a parte diversificada do currículo, faz-se necessário garantir que em todas as unidades da federação os estudantes tenham acesso a todos os itinerários previstos na legislação.
9 – Amplia a precarização da formação docente (art. 61, IV e V da LDB): o PLV 34 vai na contramão das recentes políticas de valorização do magistério e dos demais profissionais da educação que propiciaram a aprovação do piso do magistério, a profissionalização dos funcionários e a formação inicial e continuada dos profissionais da educação (PIBID, Plataforma Freire, Plafor etc) como forma de atrair a juventude para a profissão e de manter os atuais profissionais. De forma equivocada, o PLV 34 opta por flexibilizar a formação do magistério, descaracterizando e desvalorizando a profissão docente no país e os cursos de Licenciatura e Pedagogia. Ao invés de atacar os problemas da falta de professor/a, sobretudo para áreas de exatas, biologia e língua estrangeira, opta-se por meio da valorização profissional, o PLV 34 sugere institucionalizar uma regra de exceção, qual seja, a capacitação aligeirada de bacharéis de diversas áreas para ser professores, inserindo esses profissionais e mais os de “notório saber” – totalmente sem habilitação pedagógica – no rol do art. 61 da LDB que trata dos “profissionais da educação”. Uma verdadeira afronta aos profissionais habilitados para o magistério e à perspectiva de valorização da educação e da escola pública por meio de profissionais valorizados e com jornada única nas escolas ou nas redes de ensino.
Mesmo com as considerações pontuais acima destacadas, a CNTE mantém posição de suspender a tramitação da MP 746 (PLV 34), em função dos vícios de origem, de forma e de conteúdo que situam a reforma do ensino médio no contexto de uma reforma neoliberal mais ampla do estado brasileiro, que desconsidera as metas do Plano Nacional de Educação e o direito de todos os estudantes, indiscriminadamente, de terem garantido o acesso, a permanência e a conclusão da educação básica, pública, gratuita, democrática, laica e de qualidade socialmente referenciada.
Confira como ficou o texto após aprovação no Plenário da Câmara dos Deputados
O texto aprovado nessa terça indica também que todas as escolas das redes pública e privada que atendem ao Ensino Médio serão obrigadas a cumprir as novas diretrizes. Os mais afetados serão os governos estaduais, responsáveis pela maior parte dos estudantes desta etapa da formação (84% das cerca de 8 milhões de matrículas).
O governo federal diz que o Ensino Médio precisa ser mais aberto e menos engessado e, para isso, instituiu como um dos principais pontos das mudanças a ampliação da grade obrigatória de 800 horas anuais para 1.400, tornando o ensino integral – que, hoje, é restrito a apenas 6% dos estudantes do país, mas a meta é alcançar 25% dos matriculados em 2024.
Outra item muito polêmico é a flexibilização no currículo. Parte da grade de disciplinas será comum a todos, contudo, posteriormente, o estudante poderá optar por áreas de seu interesse, como linguagens, matemática, ciências humanas, ciências da natureza e/ou ensino técnico.
O Ensino Médio poderá ainda ser estruturado por módulos, o que permitiria ao estudante cursar algumas disciplinas por sistema de créditos. Além disso, cerca de 50% do currículo seguirá a BNCC, quando ela for aprovada, e o restante deve ser definido pelas redes de ensino.
A MP começa a ter força de lei após ser publicada no Diário Oficial da União (DOU) nesta sexta (23/12). Ela será ainda levada ao Congresso Nacional, que tem até 120 dias para alterá-la (se quiser) e votá-la. Caso isso não seja feito, o texto perde a validade. Se for aprovado, parte das mudanças deve ser aplicada a partir de 2017, enquanto outras terão implantação gradual.
A MP afeta e revoga várias leis em vigor, como trechos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei nº 9.394/1996) e regras do Fundeb, o qual é regulamentado pela Lei nº 11.494/2007.
Quanto ao período integral e a melhoria na educação, o Ministério da Educação (MEC) indica que há evidências de que a carga expandida de aulas, quando aliada a um bom projeto pedagógico, melhora os resultados dos estudantes. As mudanças, contudo, poderão trazer gasto para os estados, embora o ministro negue.
O ministro Mendonça Filho afirma que a maior parte dos recursos destinados às alterações, em especial à ampliação da oferta de ensino integral, deverá ser repassada pelo MEC. Algumas medidas, porém, não estão inclusas nesse aporte federal, como a oferta de disciplinas optativas pelas escolas.
Ele também nega aumento do valor da mensalidade nas escolas particulares e afirma que as novas diretrizes deverão valer a partir de 2017. No novo modelo, o estudante do nível médio poderá escolher as disciplinas parte das disciplinas que quer cursar. O texto prevê que parte da grade – equivalente a cerca de um dos três anos da etapa – será comum a todos.
Depois disso, haverá a opção de aprofundamento em cinco áreas: linguagens, matemática, ciências humanas, ciências da natureza e ensino técnico. A oferta das habilitações, porém, vai depender das redes e escolas.
O texto indica que matemática e português serão obrigatórias nos três anos do Ensino Médio. Hoje, há 13 disciplinas compulsórias na etapa. O texto prevê ainda a certificação de conhecimentos. Estudantes que sabem inglês, por exemplo, poderão eliminar a disciplina. E se a escola do estudante não oferecer a área em que ele quer se aprofundar, a rede deverá criar mecanismos que permitam a mobilidade dele. A discussão da oferta dessas áreas para aprofundamento deve ser feita em cada unidade da Federação.
Quanto ao ensino técnico, o secretário de Educação Básica, Rosseli Silva, disse que, com as mudanças, será possível ter formação técnica dentro de 1.400 horas. Hoje, o período para concluir o ensino é maior.
Considerada o maior gargalo da educação brasileiro, o Ensino Médio é visto, atualmente, como uma estrutura engessada e distante do interesse dos jovens. Dados do MEC indicam que o país registra 1,7 milhão de adolescentes entre 15 e 17 anos fora da escola – 16% da população nessa faixa etária. A etapa também tem a maior taxa de evasão da educação básica.
Com informações da Agência e Rádio Câmara, Mídia e CNTE