“Decisão do STF é marco, mas não há avanço sem educação antirracista”

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que injúria racial se equipara ao crime de racismo e, portanto, é inafiançável e imprescritível, ou seja, não pode ser substituído por fiança e é passível de punição a qualquer momento. A decisão foi proferida nessa quinta-feira (28/10), e faz refletir sobre os caminhos necessários para superar o racismo no Brasil.

A dirigente do Sinpro-DF Márcia Gilda avalia que a decisão da Suprema Corte é, sem dúvidas, um “reconhecimento necessário”. Entretanto, para ela, a superação do racismo passa, necessariamente, pela Educação.

“É na escola que a gente muda o mundo; mas também é na escola que a gente reproduz o mundo. Essa reprodução não é feita necessariamente de forma explícita: ela também se dá também através da omissão. Se a gente não se posiciona como antirracista, acabamos perpetuando essa chaga social. As crianças e os adolescentes precisam entender o que é o racismo, discutir racismo, contextualizar o racismo. A decisão do STF é um marco, mas não há avanço sem educação antirracista. Lembremos de Paulo Freire quando diz: ‘se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda’”, avalia Márcia Gilda.

Em uma metáfora bem construída, a dirigente dá o exemplo da utilização das faixas de pedestre no Distrito Federal. “Talvez o DF seja o único lugar do Brasil em que as pessoas param na faixa de pedestre, têm consciência de atravessar na faixa, de fazer o ‘sinal de vida’. Isso porque, lá atrás, foram feitas diversas campanhas de conscientização, sobretudo no ambiente escolar. As escolas debateram fortemente o tema, inclusive com ações do Detran-DF dentro das salas de aula. Por que não podemos seguir esse exemplo quando o tema é racismo?”, questiona.

Atualmente, a Lei Federal 10.639/03 determina o ensino da História e a Cultura da África para a Educação Básica, também assegurado no Currículo em Movimento da Educação Básica. Mas para Márcia Gilda, a formalização por si só não é capaz de transformar o perfil racista da sociedade brasileira.

“A questão da raça é trabalhada muito de um ponto de vista folclórico ou festivo, normalmente no dia 20 de novembro, Dia da Consciência Negra. E não é assim. A questão do racismo deve ser tratada desde a educação infantil, durante todo ano letivo, de forma interdisciplinar. Nosso Currículo em Movimento orienta trabalhar com o tema, inclusive pela perspectiva dos direitos humanos, mas não há uma estruturação dessa discussão de forma interdisciplinar”, contesta.

Segundo pesquisa do PoderData, de 2020, 81% da população concorda que há discriminação no Brasil por causa da cor da pele. Pelo estudo, 34% dos brasileiros afirmou ter preconceito contra negros, 3 em cada 10 pessoas; e 9% não sabe dizer se tem ou não preconceito.

Ao mesmo tempo, dados de 2018 do IBGE mostram que, no Brasil, apenas 29,9% dois cargos de gerência no Brasil são ocupados por negros, e que 3 em cada 4 brasileiros que estão entre os 10% mais pobres também são negros. Em 2020, o IBGE constatou que os negros representam 72,9% da população desocupada e, segundo o Mapa da Violência do mesmo ano, a cada 100 pessoas assassinadas, 75 são negras.