Com derrubada de vetos, Congresso desmascara as prioridades do governo Bolsonaro

O Congresso Nacional retomou, nessa segunda-feira (27), um único item que havia sido vetado no Projeto de Lei (PL) nº 9.165/2017, do Poder Executivo, que cria a Política de Inovação Educação Conectada com o objetivo de apoiar as escolas na obtenção de acesso à Internet de banda larga e fomentar o uso pedagógico de tecnologias digitais na educação básica. O PL foi convertido na Lei nº 14.180/2021. Com isso será reincorporado à lei o dispositivo que previa o apoio com repasses de recursos por meio do programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), disciplinado na Lei nº 11.947/2009.

Nessa segunda, o Congresso derrubou vários outros vetos do presidente Jair Bolsonaro (ex-PSL) a projetos de lei e outras peças legislativas que visam à melhoria da qualidade de vida e inclusão social, financeira e educacional da população, dentre elas, derrubou o veto total ao PL 827/20, que proíbe o despejo ou desocupação de imóveis até o fim de 2021 e suspende os efeitos de qualquer ato ou decisão de despejo, desocupação ou remoção forçada coletiva de imóvel privado ou público no meio urbano, seja os de moradia ou para produção.

Os parlamentares derrubaram ainda o veto a dispositivo do PL385/21, do Senado, para suspender durante o ano de 2021 a comprovação de vida perante o INSS para que os segurados continuem a receber os proventos e, outro projeto que será convertido em lei é o PL 4113/20, do deputado Afonso Florence (PT-BA) e outros, que assegura o repasse de ao menos 70% dos recursos previstos em parcerias com o terceiro setor durante o período de calamidade pública da Covid-19.

“A derrubada desses vetos revela as prioridades do governo Bolsonaro. Por exemplo, no campo da educação, enquanto ele veta integralmente projetos de lei que investem recursos financeiros públicos na equipagem, aquisição de Internet e na melhoria das escolas públicas, gasta as reservas do Estado e dinheiro do Orçamento público em campanhas que não favorecem o povo, como o gasto R$ 441 mil para impulsionar uma única publicação do Ministério da Cidadania no Facebook”, analisa Mônica Caldeira, diretora do Sinpro-DF.

Veto 10

No setor da educação, outro veto derrubado em junho deste ano, após muita pressão da categoria e dos movimentos sociais, foi o chamado “Veto 10”, de Bolsonaro, com o qual ele rejeitou, integralmente, o PL 3.477/20 (Fust), do deputado Idilvan Alencar (PDT-CE) e outros 23 parlamentares, aprovado em dezembro de 2020, que previa R$ 3,5 bilhões da União para estados, Distrito Federal e municípios garantirem a estudantes e professores à rede mundial, beneficiando 18 milhões de estudantes e 1,5 milhão de docentes por causa da pandemia do novo coronavírus.

Se esses vetos não tivessem sido derrubados, só no Distrito Federal, a falta de conectividade das escolas públicas continuaria prejudicando quase 130 mil estudantes da rede pública de ensino, que ficaram excluídos das aulas remotas pela completa falta de acesso à Internet e aos equipamentos tecnológicos para esse fim, segundo levantamento realizado pelo Sindicato dos Professores no Distrito Federal (Sinpro-DF) em abril de 2020.

Carestia e corrupção

O governo Bolsonaro atua para piorar a vida do brasileiro e não precisa explicar muito porque todo mundo está vivendo, por exemplo, dois pesadelos diários: as centenas de milhares de mortes evitáveis por covid-19 e a inflação galopante nos preços da alimentação, combustíveis etc. por causa da dolarização da economia imposta no Brasil pela política neoliberal dos governos Bolsonaro e Temer.

Além da política econômica da carestia, com produtos alimentícios e todas as necessidades com preços elevados e fora da realidade, tudo isso acompanhado da maior taxa de desemprego dos últimos 30 anos, o brasileiro tem de conviver com os desvios de trilhões de reais públicos para a corrupção, como, por exemplo, a compra de deputados/as e senadores/as apoiadores do governo que têm aprovado projetos de privatização do patrimônio público brasileiro, de extinção de direitos trabalhistas, de enfraquecimento das leis ambientais entre outras ações neoliberais.

Para se ter uma ideia das “prioridades” do governo Bolsonaro, em dezembro de 2020, 3 meses antes de vetar integralmente o PL 3477, o presidente criou um orçamento paralelo com cerca de R$ 3 bilhões para garantir o apoio do centrão no Congresso. Na época, a mídia liberal denunciou a existência do orçamento secreto de Bolsonaro que incluía a compra de tratores e equipamentos agrícolas por valores até 259% acima do preço de referência no mercado. Os dados foram encontrados em 101 ofícios enviados por deputados e senadores ao Ministério do Desenvolvimento Regional.

Em julho deste ano, o Ministério da Cidadania gastou R$ 441 mil para impulsionar uma única publicação no Facebook, sobre o auxílio emergencial, num período em que Bolsonaro alcançou um dos menores patamares de popularidade. A postagem resultou em poucas interações. Mas o desperdício de dinheiro público, a campanha eleitoral fora de época e a prática de financiamentos caros a postagens é recorrente nessa Pasta. Desde janeiro de 2020, segundo denúncia da mídia liberal, foram gastos R$ 4,7 milhões para alavancar 136 postagens em Facebook, Instagram, LinkedIn e Twitter. As postagens sobre auxílio emergencial custaram R$ 1,2 milhão, 26% do total.

Enem

O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) é um dos mais emblemáticos exemplos de falta de prioridade do governo federal. A prioridade, nesse caso, é privatizar a educação pública. Para isso é preciso promover exclusão educacional. Assim, para aprofundar esse tipo de exclusão, em agosto deste ano, o ministro da Educação, Milton Ribeiro, negou a isenção da taxa de inscrição para a prova àqueles que faltaram ao Enem no ano passado por medo da Covid-19 e, por isso, perderam o direito ao benefício. Esse veto de Ribeiro deixou centenas de milhares de estudantes sem o acesso ao concurso. Essa foi uma das principais explicações para que o Enem 2021 tivesse o menor número de inscritos desde 2005.

De acordo com a mídia liberal, mais de 3 milhões de estudantes de baixa renda elegíveis para a gratuidade foram excluídos. Precisou de uma frente de partidos de esquerda e muitas organizações da sociedade civil entrarem com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo mudanças na regra para gratuidade. PT, PDT, PSOL, PCdoB, PSB, PV, Rede Sustentabilidade, Cidadania, Solidariedade, além da União Nacional dos Estudantes (UNE), União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES), Educafro e Frente Nacional Antirracista e até a Defensoria Pública ingressaram com uma ação judicial para garantir a isenção aos faltosos. O argumento era o de que estudantes mais vulneráveis do ponto de vista financeiro, além dos ausentes em decorrência da pandemia, não conseguiriam pagar os R$ 85 da taxa de inscrição. O governo federal, no entanto, conseguiu na Justiça o veto de isenção a faltosos. 

A edição de 2020 do Enem foi realizada em janeiro de 2021, durante o aumento de infecções pela Covid-19. Como consequência, obteve o maior registro de abstenção da história do exame, de 55,3%. Para a edição 2021, o Enem teve o menor número de inscrições em 13 anos, fator relacionado à resistência do Ministério da Educação em conceder a isenção de pagamento da taxa de inscrição, de R$ 85, para os faltantes da edição anterior.

No início de setembro, o STF entendeu que, por causa da pandemia da covid-19, as provas de 2020 foram aplicadas em um contexto de anormalidade e que a exigência de comprovação documental para os ausentes viola diversos preceitos fundamentais, dentre eles o do acesso à educação, e decidiu, por unanimidade, pela reabertura do prazo para o pedido de isenção da taxa de inscrição. Com a decisão da Justiça em favor dos estudantes pobres, 280.145 pessoas se inscreveram na nova chamada, um aumento de 9% no número de inscritos.