CEM 304 da Samambaia mantém tradição e aprova mais de uma dezena na UnB

Equipe de educadores(as) do CEM 304 de Samambaia

Doze estudantes do Centro de Ensino Médio (CEM) 304, de Samambaia, foram aprovados na Universidade de Brasília (UnB) pelo Programa de Avaliação Seriada (PAS). Eles(as) iniciam os cursos no primeiro semestre de 2020. A maioria vai cursar licenciaturas diversas, mas também houve aprovação para odontologia, engenharia, farmácia e turismo.

“Ainda falta saber outros resultados. Até agora não recebemos os nomes de quem passou no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), no vestibular tradicional e no Sistema de Seleção Unificada (Sisu). No momento, o ProUni está sendo realizado. Depois será a seleção do Fies. Vamos aguardar os resultados. Temos certeza de que haverá mais aprovados e novos estudantes universitários do 304”, afirma a diretora, Rosângela Alves Pereira Ventura.

DESINTERESSE
Com dois mil estudantes, distribuídos nos cursos de Ensino Médio regular e 1º e 2º Segmentos da Educação de Jovens e Adultos (EJA), o CEM 304 funciona nos três turnos. Sua equipe de educadores(as) atua voltada para o PAS e o Enem e, embora tenha uma tradição na aprovação em universidades, atualmente, a escola enfrenta um dos maiores desafios da educação pública: o desinteresse da comunidade escolar pela academia.

Além da baixa participação dos pais e mães, o corpo docente e a direção da escola disputam o interesse dos(as) estudantes com vários tipos de violência, como, por exemplo, com as seduções das ruas, o aliciamento das drogas, os desajustes familiares, a depressão resultante de uma série de problemas que vão da falta de dinheiro das famílias extremamente pobres até o abuso sexual que muitos estudantes sofrem em casa.

“Este ano tivemos esses 12 que passaram pelo PAS, haverá outros, quando saírem os resultados do Enem. Mas já tivemos muito mais estudantes aprovados em universidades em anos anteriores. Digo isso porque a dificuldade que a gente encontra hoje, que todo educador encontra, é o interesse do estudante na escola. Acho que em toda escola pública, desde a Educação Infantil, esse retorno da família e do estudante está difícil. Tenho 28 anos de profissão e ainda não consegui encontrar um caminho para resolver essa situação tanto enquanto professora como enquanto educadora e, agora, enquanto gestora”, afirma Rosângela.

SUCATEAMENTO
Quando se trata de educação, a única fórmula para superar as dificuldades provocadas pela falta de interesse do(a) estudante é a modernização da escola e dos métodos de aprendizagem. Tudo isso envolve investimento de dinheiro público nos equipamentos e atualização acadêmica de professores. A equipe de educadores também não tem alívio do lado do Governo do Distrito Federal (GDF). Se precisa de criatividade para lidar com as violências sociais, que embaçam e até eliminam o interesse dos estudantes de baixa renda pelos estudos, de outro, tem de enfrentar com dribles de craques os desafios políticos e as dificuldades financeiras criadas pelo próprio GDF.

Em vez de ajudar, o governo busca dificultar o trabalho desenvolvido na escola de promover a inclusão educacional e social com educação de qualidade socialmente referenciada ao não investir os recursos financeiros públicos suficientes na escola. O 304 recebeu, no ano passado, as duas parcelas do Programa de Descentralização Financeira e Orçamentária (PDAF), mas foi com atraso e num valor reduzido, o que causou atrasos, transtornos e incapacitações evitáveis.

“Somente por meio de mais políticas públicas e investimentos financeiros será possível promover a democratização do acesso dos estudantes no curso superior. Ainda não houve essa democratização almejada no Brasil. Para isso acontecer, precisamos melhorar a educação básica da rede pública com mais investimentos e valorização dos professores. E assim integrar mais estudantes às universidades públicas, garantindo a inclusão de todas as classes sociais ao Ensino Superior público e de boa qualidade”, afirma Carlos Souza Maciel, diretor do Sinpro-DF.

ISENÇÃO DA TAXA
Mas um dos problemas principais e mais graves que têm impedido os estudantes das classes de baixa renda do Distrito Federal de ingressarem nas universidades é o cancelamento da isenção da taxa de inscrição no PAS e Enem. Antes dos governos Ibaneis e Rollemberg, a isenção era para todos os estudantes da escola pública. Agora, não. Para o estudante obter a isenção, a família dele tem de estar cadastrada em algum programa social, como o Bolsa Família, Bolsa Escola e outros que foram, recentemente, burocratizados e reajustados para a política de choque de gestão do governo Jair Bolsonaro de forma que boa parte da população carente que usufruía desse direito foi eliminada dos programas.

“E isso complicou para todos porque muitos não têm a isenção da taxa de inscrição no PAS porque suas famílias não integram os programas sociais e, ao mesmo tempo, também, não têm o dinheiro para a inscrição: se fizer a inscrição não ficam sem dinheiro para comer. Não é brincadeira. No ano passado, fizemos uma vaquinha entre professores e conseguimos bancar inscrições”, informa Justina Corrêa Neves Neta, a vice-diretora.

Este ano, a vaquinha garantiu o ingresso, pelo PAS, de um estudante para o curso de turismo. “Esse corte na isenção ocorreu no governo Rodrigo Rollemberg (PSB) e permanece no governo Ibaneis Rocha (MDB). É a política neoliberal de “enxugamento” do Estado. Esse enxugamento só afeta as políticas sociais voltadas à população de baixa renda. O dinheiro público continua sendo drenado em quantidades inimagináveis para a iniciativa privada e para os visíveis desvios de finalidades na gestão pública e no sistema de ensino público, como, por exemplo, a militarização de escolas públicas”, critica Cláudio Antunes, coordenador de Imprensa do Sinpro-DF.

CRIATIVIDADE
A direção do CEM 304 combate o desinteresse da comunidade escolar e as dificuldades decorrentes da má gestão pública com criatividade. No ano passado, firmou parcerias com professores e deputados distritais. “Graças a isso tivemos uma semana com aulões voltados para o PAS e o Enem e obtivemos esse resultado: mais de uma dezena aprovada logo de cara. Acreditamos que teremos mais de duas dezenas. Em 2020 vamos nos dedicar a fazer ainda melhor. Vamos fechar o mês de outubro todinho para esse objetivo”, afirma a diretora.

Ela informa que, em anos anteriores, a escola assegurou muito mais aprovações. “Em 2016, por exemplo, tivemos 20 aprovados pelo PAS/Enem. Nesse ano, um dos estudantes foi aprovado em medicina e, outro, em engenharia na UnB. Em 2017, 36 estudantes foram aprovados pelo PAS/Enem. Este ano, por enquanto, 11 foram aprovados no PAS. Estamos aguardando os demais resultados”, contabilizou a gestora.

No entanto, na avaliação da diretoria colegiada do Sinpro-DF, a criatividade tem limites e sua capacidade de evolução depende muito de investimentos públicos. “Tem uma escola aqui no Santo Antônio que recebeu somente R$ 8 mil no ano passado. Como é que uma escola desse porte recebe só isto em recurso financeiro?”, indaga.

TRADIÇÃO
A diretora da escola conta que a unidade tem tradição em aprovação em universidades públicas e privadas e afirma que esse sucesso é resultado de muito trabalho com visão coletiva que ela trouxe como fio condutor da sua gestão. “Esse sentimento de coletivo é que nos proporciona a capacidade de superar os desafios que os filhos da população de baixa renda trazem e que os impedem de permanecer na escola”, afirma.

Ela diz que, além da criatividade, outro aspecto assegura a manutenção da tradição e a obtenção desse resultado. “É o trabalho de ‘bastidores’ intenso” que nós, da direção, realizamos”, afirma. Professora de Atividades, Rosângela foi eleita, recentemente, para o cargo de gestora. Mas chegou no CEM 304 como supervisora pedagógica. “Desde então, buscou trabalhar com uma visão coletiva”.

“No princípio foi muito complicado, mas, devagar, fui construindo essa concepção e conseguimos implantar o estudo relacionado ao coletivo. O coletivo é meta primordial numa escola. Se você atua em conjunto, as coisas tendem a melhorar, principalmente em prol do estudante e do grupo de trabalhadores da educação, porque a visão coletiva une a equipe pedagógica”, garante Rosângela.

MODERNIZAÇÃO
Vinícius Vieira, professor de história, que já passou por dez escolas da Secretaria de Estado da Educação (SEEDF), afirma que além da visão coletiva, é preciso reconhecer que uma escola equipada também colabora profundamente com o sucesso nos seus resultados. Ele diz que, embora ainda careça de melhorias e novas tecnologias para se adequar aos novos tempos, o CEM 304 é uma das mais equipadas escolas da rede pública de ensino.

“Claro que não se compara com escolas privadas que têm estrutura e equipamentos pedagógicos ultramodernos, mas, embora precise de recursos financeiros para melhorar, o 304 da Samambaia é uma unidade bem estruturada, tem datashow nas salas de aula, laboratório, biblioteca e ventiladores, que, embora não funcionem bem, ajudam a melhorar o clima em época de muito calor”, finaliza o professor.