CEM 04 de Ceilândia realiza projetos de sucesso e, todo ano, aprova mais de 30 estudantes na UnB

Mais de mil estudantes de 2º e 3º Anos participaram da Semana de Arte e Literatura do Centro de Ensino Médio (CEM) 04 de Ceilândia. A iniciativa, que integra, há anos, o Projeto Político-Pedagógico (PPP) da escola, ocorreu entre os dias 9 e 13 de setembro. Eles apresentaram peças teatrais, concertos musicais, dança contemporânea, recitais de poesias e expuseram trabalhos de artes plásticas conectados com a literatura, as artes plásticas, o ensino de língua estrangeira e a atual realidade do Brasil.

O projeto existe há anos com o nome “Semana de Arte Moderna”.  Mas, este ano, a professora de artes, Tatiana Romeu, tomou a frente e, juntamente com os professores de português, Cláudia Rodrigues e Roberto Cavalcante, e de espanhol, Míria Venâncio, implantaram modificações.

Uma delas foi a troca do nome para Semana de Arte e Literatura. Essa mudança atendeu à reivindicação dos estudantes de adequar a atividade ao conteúdo do Programa de Avaliação Seriada (PAS). Para incluir a gigantesca referência bibliográfica do programa, os professores separaram o conteúdo por núcleos temáticos e cada turma ficou com um deles.

MÉTODO DE ENSINO, APRENDIZAGEM E LIBERDADE DE EXPRESSÃO
Antes a atividade reproduzia a Semana de Arte Moderna de 1922. Essa atividade revolucionou a cena cultural e educacional brasileira. Realizada no Teatro Municipal de São Paulo, modificou para sempre as abordagens educacionais e artístico-literárias no Brasil.

Em 1922, os artistas buscaram a transformação dos antigos conceitos do século XIX. Havia uma insatisfação estética, notadamente na literatura e poesia, que os inquietava. No CEM 04, a inquietação adveio das obras do PAS e da percepção de cada um sobre os temas do dia a dia.

Nos trabalhos, os estudantes abordaram assuntos, como feminicídio, censura, militarização das escolas, crise econômica, ditadura militar de 1964, torturas, meio ambiente e Amazônia, entre outras realidades históricas recentes da sociedade brasileira.

Tatiane conta que, ao reelaborar a atividade, o grupo de professores modificou também as abordagens e ampliou os horizontes: além do modernismo, trouxe muitas outras escolas de artes e literatura para o palco do auditório do CEM 04. “Este ano a gente adotou muita coisa da arte contemporânea e de outras tendências. Por isso achamos que o termo ‘moderno’ não era mais adequado”, explica ela.

 

Estudantes após apresentação de peça teatral no auditório do CEM 04. Foto: Ecom

 

SUCESSO ACADÊMICO E FALTA DE DINHEIRO
Apesar da escassez de recursos públicos do Governo do Distrito Federal (GDF), a atividade foi um sucesso, sobretudo no aspecto acadêmico-curricular. “O projeto cumpriu seu propósito de estabelecer uma ligação crítica das obras literárias e artísticas plásticas com o teatro, a dança, a música e o cotidiano do estudante”, afirma a professora de português, Cláudia Rodrigues.

A avaliação do grupo de professores é a de que, ao direcionar a atividade para a prova do PAS, eles conseguiram oferecer aos estudantes uma forma mais tranquila e leve de aprendizado dos conteúdos mais densos. “Montamos roteiros com as obras da referência bibliográfica e introduzimos as obras literárias relacionadas aos temas sobre o Brasil associadas a pinturas. E criamos estratégias para os temas ficaram casados. Repassamos os roteiros para os estudantes e eles fizeram diversas produções, como peças teatrais, recitais, dança, música etc.”, informa Cláudia.

Nilson Couto Magalhães, diretor da escola, conta que esse é um dos PPP da escola que têm história. “Vários professores já se aposentaram e a herança vai ficando no CEM 04. Sempre no nosso PPP fica previsto recursos para a realização dessa atividade”, informou. Ele diz que “os trabalhos são maravilhosos e os estudantes gostam muito. É interessante porque retira o estudante da aula só expositiva, só em sala de aula, e coloca o conteúdo numa forma mais prazerosa”.

O diretor afirma ainda que, apesar de a escola tê-lo garantido em seu Programa de Descentralização Administrativa e Financeira (PDAF), este ano quem arcou com a maior parte das despesas foi o próprio estudante. “Eles bancaram com dinheiro do próprio bolso os objetos temáticos, cenário, figurino. A escola usou recursos do PDAF para assegurar o bom funcionamento do auditório, iluminação, pintura. Este ano conseguimos até uma cortina nova doada por uma professora”.

 

Profa. Tatiane e estudante no camarim. Foto: CLisboa

 

 

DESENVOLVENDO POTENCIALIDADES
A qualidade do ensino é comprovadamente boa, tanto que, todo ano, o CEM 04 coloca cerca de 30 estudante dentro da Universidade de Brasília (UnB). Em 2017, um estudante da escola ingressou no curso de medicina da Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS) e, em 2018, mais dois. Foi no CEM 04 que a UnB instalou seu primeiro polo ao estender um de seus campi para a Ceilândia. “O CEM 04 é muito importante na vida de seus estudantes. No seu PPP, busca desenvolver as potencialidades dos estudantes e, principalmente, o envolvimento dos professores, pais e mães.

Além de dar conta do cotidiano, é uma escola que desenvolve projetos que fortalecem as artes, a literatura, as feiras de ciências, atividades físicas, como jogos interclasses, atividades de campo”, afirma Eliceuda Silva França, coordenadora da Secretaria de Cultura do Sinpro-DF. A diretora do sindicato conta que uma das filhas dela, hoje formada com curso superior, estudou no CEM 04. “A escola tem um olhar amplo, para além do papel dela de repassadora de conhecimentos. Ela atua para transformar vidas para exercer a cidadania com mais reponsabilidade”, afirma.

Eliceuda considera importante ressaltar outro aspecto relevante do CEM 04: “No momento em que os governos federal e distrital iniciaram o processo de desmonte do sistema público de educação e do ensino noturno, tanto da Educação de Jovens e Adultos (EJA) como do ensino regular, o CEM 04 está firme e forte com suas turmas de terceiro segmento e ensino médio regular formando jovens no noturno”.

 

Apresentação de peça teatral na Semana de Arte e Literatura. Foto: Ecom

PPP E PDAF
Quem confere os resultados do CEM 04 no PAS e no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e vê a boa aparência do prédio, pensa que a escola recebe recursos financeiros suficientes do GDF para sua manutenção e existência acadêmica. O muro seguro e elegante em seu redor, uma área interna bem conservada e uma lista de 30 aprovados na UnB todo ano não pensa noutra coisa. Mas a realidade não é essa.

O sucesso da escola decorre do esforço da equipe de professores, direção, técnicos-administrativos e dos próprios estudantes. “Desde que cheguei nesta escola, em 1997, ela nunca viu uma reforma de fôlego promovida pelo GDF. A diretoria afirma que nunca houve atualização da estrutura física e qie economiza ao máximo para garantir o seu funcionamento.

“Quando eu cheguei aqui, em 1997, tudo estava muito ruim. Toda a parte elétrica era exposta; a hidráulica vazando para todo lado. Até que eu consegui corrigir os problemas elétricos e hidráulicos para começar a aplicar o dinheiro na beleza da escola foi 5 anos de gestão”, afirma Nilson Magalhães.

A equipe de docentes e funcionários e os estudantes veem como descaso e má gestão o jeito que o atual governo administra os recursos financeiros destinados à educação pública. Isso porque, de um lado, escolas sem nenhum presença do governo. Em outras, a presença do poder é exagerada e desvirtuada, com uso de PM dentro da unidade escolar.

O aspecto que denuncia esse tipo de má gestão é o fato de o CEM 07 ter recebido vários investimentos. “Só que eu presenciei, o CEM 07 já passou por três reformas gerais bancadas pelo GDF. Agora, por último, com a militarização, o GDF praticamente o reconstruiu”, diz o diretor.

A comunidade escolar do CEM 04 afirma que não precisa de militarizar a escola para que ela receba os recursos financeiros e os cuidados do GDF.  “Não vejo necessidade de militarizar a escola. O que a escola pública precisa é do dinheiro público para assegurar sua infraestrutura física e pedagógica”, assegura Magalhães.

Ele afirma que a PM tem de estar na porta da escola combatendo o crime e garantindo a paz no ambiente escolar. “Dentro da escola, quem tem de tratar da parte pedagógica e disciplinar é o professor, que é o profissional preparado para isso. Se eu tivesse a assistência de dois policiais do Batalhão Escolar todo dia aqui na porta do CEM 04, meu problema estaria resolvido”, finaliza.

Profa. de português, Cláudia; e profa. de artes, Tatiane. Foto: CLisboa