CEF 407 de Samambaia realiza campanha “Proteção Feminina” para combater pobreza menstrual

Com a pandemia da Covid-19, a direção do CEF 407 descobriu que, para além da pobreza menstrual, as famílias das estudantes de baixa renda não têm condições de comprar os itens de higiene pessoal e nem sequer o que comer 

 

Na ausência de políticas públicas de combate à pobreza, incluindo aí a pobreza menstrual, o Centro de Ensino Fundamental (CEF) 407, de Samambaia, não esperou o pior e pôs em curso a campanha permanente intitulada “Proteção Feminina”, para fornecimento de kits de higiene para as famílias de baixa renda que têm filhos e filhas na escola.

No pacote, além de absorventes higiênicos para as estudantes, a escola inclui todos os outros itens da higiene pessoal para toda a família. Geralmente, quem participa financeiramente das doações são os(as) próprios(as) professores(as) e algumas pessoas ao redor da comunidade escolar.

“Recentemente, após o retorno das aulas presenciais, a direção apresentou o projeto ao Sinpro-DF, durante uma visita do sindicato à escola. Sabemos que outras escolas desenvolvem o mesmo projeto para evitar a evasão e amenizar a situação econômica das estudantes”, informa Cláudio Antunes, diretor do Sinpro-DF que visita essa escola.

Josuel Santos da Silva, professor de história e vice-diretor do CEF 407, de Samambaia, eleito na última eleição para um mandato de 2 anos (2020-2021), conta que a pandemia do novo coronavírus expôs uma situação dramática de mais de 80 famílias que, hoje, dependem da escola para comer e se higienizar. Ele conta que muito antes de o Distrito Federal ter uma lei de combate a pobreza menstrual, o CEF 407 já distribuía, gratuitamente, absorventes higiênicos para as meninas de baixa renda.

No Distrito Federal, apesar de o governador Ibaneis Rocha (MDB) ter sancionado, em janeiro deste ano, a Lei nº 6.779, de 2021, de autoria da deputada distrital Arlete Sampaio (PT), que prevê a distribuição gratuita de absorventes em escolas e em Unidades Básicas de Saúde (UBS) para mulheres em situação de vulnerabilidade e estudantes da rede pública no Distrito Federal, nada foi feito até agora. Recentemente, circulou a notícia, nos meios de comunicação liberais, que a Secretaria de Estado da Saúde (SES-DF) teria informado que está se organizando para começar a cumprir a lei com a distribuição de absorventes higiênicos femininos nas escolas de nas UBS.  

Contudo, enquanto isso não acontece, a escola continua com sua campanha mensal de distribuição de kits de higiene. Além disso, com a atual política econômica neoliberal, não basta distribuir absorventes. Com os pais e mães de famílias desempregados, é preciso distribuir todos os produtos de higiene pessoal e comida.

Inspiração surgiu na aula sobre silenciamento das mulheres na história

Josuel conta que a campanha para distribuição de absorventes no CEF 407 começou em 2017, quando ele e uma professora perceberam a inconveniente exposição das meninas ao precisarem de o absorvente na escola. “Por que elas tinham de passar por uma exposição pública e pedir autorização para fazer a troca de absorvente no banheiro?”, questionaram.

A partir dessa indagação, decidiram disponibilizar, na diretoria, kits com absorventes. Mas, foi depois de uma aula sobre o silenciamento da mulher nos livros de história para o 7º Ano, realizada em 2019, que a proposta evoluiu e o kit passou a ser colocado, gratuitamente, para todas as estudantes de baixa renda, dentro do banheiro feminino.

Na aula, o professor de história descobriu muito mais ao discutir a ausência das mulheres nos livros de história. Ele conta que o debate fluiu de tal forma que as estudantes apontaram fatores que as colocavam no universo do silenciamento das mulheres em todos os espaços e, um deles, foi esse do problema do absorvente.

“Nessa aula, várias estudantes comentaram que elas se ausentavam da escola em determinados períodos do mês em razão da menstruação. Essa conversa fluiu para depois da aula e, uma estudante contou ao professor que, naquela classe, havia várias meninas que faltavam porque não tinham condições de comprar o absorvente. Ela mesma montou o primeiro kit e deu a ideia de deixá-lo fixo no banheiro feminino. Adotamos”.

Foi assim que, em 2019, o CEF 407 começou a campanha “Proteção Feminina” de distribuição de absorvente na escola. A direção comprou todo o material, colocou no banheiro e eliminou a exposição das meninas e a evasão escolar por causa de menstruação.

“Naquela época ainda não existia este nome, mas, posteriormente, quando o debate sobre isso cresceu na sociedade, descobrimos que isso se chama pobreza menstrual. Tivemos relato de estudantes que usavam jornal para conter a menstruação”, diz Josuel.

Comunidade vai buscar comida na escola

Em 2020, quando ele foi eleito para a direção e também chegou a pandemia da Covid-19 no Brasil, a realidade dessas famílias se manifestou de forma cruel para os(as) professores(as) do CEF 407. Ele conta que a diretoria e os(as) docentes viram o tamanho da pobreza da comunidade escolar.

“Pelos pedidos dos pais e mães por comida, descobrimos que a situação era muito pior do que uma mera pobreza menstrual. As famílias não tinham o que comer. Pais de família vinham chorando pedir à gente ajuda para alimentar a família. Foi daí que tivemos a ideia de montar o kit higiene, afinal, deduzimos que, se não tinham o que comer, como estaria a situação da higiene pessoal?”, conta o professor.

Ele diz que o dia da entrega de Cesta Verde passou a ser um dia de comoção porque a comunidade vai buscar comida na escola. “Essa pobreza se tornou gritante. Testemunhamos pais passando fome. Inclusive gente de fora da comunidade escolar vindo pedir comida e buscar Cesta Verde, sem nada para comer em casa. Essa pobreza ficou muito mais aflorada. Testemunhamos pais perdendo emprego, sem poder pagar Internet”, relata.

Sensível a essa situação, a escola reformulou o movimento, iniciado em 2017, para fornecer, além absorventes, todos os itens da higiene pessoal. A campanha interna, entre professores e professoras, reúne doações que são entregues em pacotes fechados para não expor as famílias. Com isso, a escola passou a fazer um levantamento das famílias que precisam de ajuda.

“No último levantamento, feito recentemente, descobrimos que pelo menos 80 famílias precisam desse suporte. Mas, é claro que é muito mais porque, depois da primeira distribuição, algumas famílias que não receberam começaram a nos procurar. Vamos ter de fazer um novo levantamento e, como as coisas não estão economicamente favoráveis, é provável que este número esteja aumentando”, finaliza.