Governo Ibaneis-Celina deixa mais de 1 milhão de estudantes do DF fora da EJA
Do ano passado para cá, quase nada mudou no atendimento à demanda de trabalhadores(as) que buscam a escola pública para ingressar na Educação de Jovens, Adultos e Idosos Trabalhadores (EJAIT). Os números continuam praticamente os mesmos revelados pelo estudo nº 1.030, de 2023: mais de 1 milhão de pessoas fora da escola porque não têm acesso à EJA no Distrito Federal. Esse estudo foi realizado coletivamente pela Terceira Secretaria da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) e mostrou que, entre 2019 e 2023, a capital do País havia registrado uma queda acentuada nas matrículas da EJA, e tudo continua do mesmo jeito este ano.
Esse levantamento de 2023 mostrou que, em 2019, havia 45.259 estudantes matriculados nessa modalidade de ensino, e, em 2023, caiu para 32.958 matrículas. Este ano, embora o Governo do Distrito Federal (GDF) tenha anunciado o aumento de matrículas na EJA, ao contabilizar os(as) estudantes oriundos(as) do ensino especial, o número de matrículas continua caindo. Em breve, o Fórum Distrital de Educação (FDE) divulgará novos dados sobre isso.
Assim, o decréscimo de matrículas persiste e, segundo o estudo do ano passado, isso se traduz em “evasão escolar”. O documento da CLDF apontava, em 2023, que essa evasão era decorrente da pandemia da covid-19, uma vez que essa queda ocorreu, justamente, entre 2020 e 2022, nos 2 anos em que o mundo viveu a crise sanitária do coronavírus. A CLDF também levou em consideração o resultado da atuação insuficiente da Secretaria de Estado da Educação do Distrito Federal (SEE-DF), que, na emergência da pandemia, não realizou eficientemente o mapeamento de estudantes que não participaram das aulas remotas, ou seja, não fez a busca ativa contínua, e nem ofereceu garantia de condições adequadas para o acesso a essas atividades.
No entanto, a fase crítica da pandemia passou e, em 2023, a vida voltou ao normal. A EJA continuou com uma baixa considerável no número de matrículas. E mantém esse descréscimo em 2024. A CLDF chamou de “abandono” as vagas dos(as) trabalhadores(as) jovens e adultos que não conseguiram permanecer na EJA por diversas razões e mostrou que, no primeiro semestre de 2019, o índice desse “abandono” correspondia a 37,24% das matrículas; em 2020, a 3,97%; e, em 2021, a 7%. O índice de reprovação, por sua vez, no mesmo período, foi de 22,60%, em 2019; 48,97%, em 2020; e, em 2021, 55,73%. O estudo informa ainda que na plataforma de dados educacionais mantida pela SEE-DF não se encontram disponibilizados os índices de abandono e reprovação de 2022 e 2023.
Lógica perversa
Uma análise do Grupo de Trabalho Pró-Alfabetização do Distrito Federal/Fórum de Educação de Jovens e Adultos do Distrito Federal (GTPA-Fórum EJA) do documento da CLDF indica que a evasão na Educação de Jovens, Adultos e Idosos Trabalhadores (EJAIT) resulta do agravamento das desigualdades sociais durante a sindemia global/pandemia com efeitos na modalidade EJA integrada à Educação Profissional e que isso revela haver mais de 1 milhão de trabalhadores do DF impedidos de acessarem a educação pública por falta de investimento do governo em várias ações de promoção da EJA. Aliás, o que tem ocorrido, é o fechamento de turmas dessa modalidade e até o encerramento da educação pública no turno noturno.
“A métrica estatística do sistema escolar, que mantém a lógica de quem está e de quem sai da escola, não dá conta, efetivamente, do problema estrutural da Educação de Jovens e Adultos na forma integrada à educação profissional porque esta tem como referência a identidade dos trabalhadores que não têm educação básica completa. Portanto, evasão, repetência, reprovação, e até mesmo a expressão estúpida de ‘abandono’, como se fosse uma culpabilização do trabalhador e não uma interrupção do percurso escolar dele pela dificuldade de se manter na escola, tudo isso leva a uma constatação de que, de 2019, com 45.259 matrículas, e em 2023, com 32.958 matrículas, isso representa 3,29% que, na verdade, não atinge a mais de 1 milhão de trabalhadores que sustentam a economia do Distrito Federal cotidianamente sem direito à educação básica”, alerta Maria Luiza P Maria Luiza Pereira, professora aposentada da UnB e membro do GTPA-Fórum EJA.
Problema estrutural
Ela diz que é preciso haver uma compreensão maior desse problema por parte dos(as) professores(as) e orientadores(as) educacionais da rede pública de ensino, bem como por parte da classe trabalhadora, de que, “em se tratando de um problema estrutural da sociedade capitalista, que, no DF é revelada pela alta concentração de renda, a possibilidade de um(a) trabalhador(a), seja ele(a) formal ou colocado na situação de informalidade, no momento, e há algum tempo, está impregnado de condições e relações de trabalho impeditivas do tempo de estudar porque esse trabalhador, para sobreviver, precisa de se dedicar à sobrevivência de si e de sua família”.
A professora explica que há uma situação criada para impedir mesmo que esse(a) trabalhador(a) acesse de fato a educação pública. “Ele e ela vivem em transportes coletivos que não permitem uma mobilidade em tempo hábil para chegar a uma escola; e, além disso, são pessoas que têm famílias que tem condições e possibilidades de expandir a sua criatividade, sua condição mesmo de sustentação, sejam homens e mulheres, e não tem, por ser difícil, condição de estar na escola. E, mais, se muda o seu lugar de moradia, muda também a sua condição de permanecer na escola”, afirma.
Maria Luiza diz também que “é preciso que entendamos que o processo de inserção, de inclusão dos trabalhadores na educação básica requer não apenas um esforço na direção da política educacional, mas de todas as políticas setoriais de saúde e de assistência social, de segurança pública e de mobilidade urbana, coisa que no DF, praticamente, não se tem, além de ser muito caro, no sentido de ser um investimento que requer de fato pela ‘carrocracia’, que é a ditadura dos carro próprios e não do transporte coletivo, que impede esse trabalhador de estar na escola. O mais grave é que ele é também alvo de manipulações de suas mentes e corações e até mesmo sequestros de suas almas por ideias que não lhe dão a consciência política necessária que são sujeitos de direitos já pagaram com impostos a educação que não têm, a saúde que não têm, a segurança pública, o saneamento, a coleta de lixo e a própria moradia com dignidade que também não tem”.
Nesta segunda matéria da campanha de defesa da EJA, o Sinpro mostra um dos aspectos que têm impedido boa parte da classe trabalhadora de acessar essa modalidade de ensino para que, com esse conhecimento, a sociedade brasiliense se mobilize em favor do direito à educação para todos e todas. Confira a seguir a primeira matéria da série.
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