Câmara aprova PL que transforma Fundeb em balcão de negócios

Dezembro de 2021 vai ficar na história do Brasil como o mês que o governo Jair Bolsonaro (PL) e a Câmara dos Deputados aceleraram políticas de desmonte da educação pública e da pesquisa científica. Começam a explodir também os resultados da ação silenciosa e devastadora do ministro da Educação Milton Ribeiro.

 

Só nos últimos 10 dias vieram a público dezenas de denúncias que revelam os problemas fabricados pelo governo Bolsonaro para implodir o Sistema Público de Educação. Dentre elas, a denúncia de interferência político-ideológica fundamentalista no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que registrou o mais baixo índice de participação de todos os tempos e o pedido de exoneração de 35 servidores do Inep.

 

A Capes, instituição pública consolidada de fomento à pesquisa estrangulada pelo governo Bolsonaro por meio de grandes, sucessivas e mal-intencionadas retiradas de recursos financeiros público do setor, registrou, nos últimos 7 dias, o pedido de demissão de 114 cientistas. Na noite dessa quarta-feira (8), o deputado e presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) colocou em votação, às pressas, um pacote de projetos de lei para ajudar a acelerar esse desmanche da educação básica.

 

No meio do embrulho, estava o Projeto de Lei nº 3.418/2021, de autoria da deputada federal Professora Dorinha Seabra Rezende (DEM-TO), que modifica a Lei nº 14.113/20, a qual regulamentou, em dezembro do ano passado, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb Permanente).

 

Trata-se de um PL que, a pretexto de fazer apenas uma atualização na lei de 2020, a fim de adiar para 2024 a definição de novos índices para rateio dos recursos do Fundeb quanto ao valor anual por aluno entre etapas, modalidades, duração da jornada e tipos de estabelecimento de ensino, transformou o Fundeb num balcão de negócios.

 

Aprovado às pressas, e de noite, o PL já foi enviado ao Senado Federal e seguiu com uma série de emendas para acelerar o desmonte do fundo público que garante a educação básica pública. O texto aprovado foi o substitutivo do relator, deputado Gastão Vieira (Pros-MA), que autoriza o uso de recursos do Fundeb para bancar matrículas de escolas privadas e pagamento de remuneração a psicólogos e assistentes sociais atuantes nas escolas, conforme prevê a Lei 13.935/19.

 

Para isso, os estados, o Distrito Federal e os municípios deverão usar parte dos 30% do fundo não vinculados aos salários dos profissionais da educação. E mais: entrega parte do fundo público, criado para assegurar o dever do Estado de fornecer o serviço de educação básica gratuita, para a iniciativa privada. Dentre os “jabutis” aprovados destacam-se:

 

1) Venda da Folha de Pagamentos dos(as) profissionais da educação para bancos privados. Antes a gestão dos recursos se dava apenas no Banco do Brasil e CEF e, no caso do Distrito Federal, pelo BRB.

 

2) Repasse de recursos do Fundeb para instituições do Sistema S de Educação Técnica Profissional.

 

3) Pagamento de todos os(as) trabalhadores(as) da educação das redes públicas de ensino por meio dos 70%, sem necessidade de profissionalização.

 

4) Manutenção de psicólogos e assistentes sociais nos 30% do Fundeb e foi rejeitado o destaque da deputada federal Rejane Dias (PT-PI), que pretendia incluir esses entre os profissionais pagos com os 70% dos recursos do Fundeb.

 

5) Incluiu o setor privado da educação entre as escolas que irão receber recursos financeiros públicos do Fundeb, como as escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas, que cobram mensalidades e se dizem sem fins lucrativos.

 

Após análise minuciosa do PL 3418/21, que seguiu para o Senado, a Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação (CNTE) irá lançar, na tarde desta quinta-feira (9), uma nota pública.

 

Na opinião da diretoria da confederação e do Sinpro-DF, será preciso muita mobilização para reverter, no Senado Federal, tantos retrocessos aprovados na Câmara. Segundo informações da CNTE, “a previsão era de votar o projeto, na Câmara, na próxima semana, mas acordos golpistas anteciparam a votação para essa quarta-feira (8). Como pode um relatório concluído no fim da tarde ser votado na noite do mesmo dia, sem qualquer debate? Isso é golpe!”

 

Ainda de acordo com informações da confederação, a inclusão do Sistema S no Fundeb é inconstitucional. Só uma PEC poderia prever esse desvio de recursos públicos para instituições privadas. Foi um debate intenso à época da regulamentação do fundo que retornou, agora, de forma sorrateira e relâmpago. “Precisamos de mobilização da categoria em todo o País para consertar mais esse equívoco da Câmara no Senado”, afirma. 

 

O artigo 213 da Constituição Federal diz, claramente, que “os recursos públicos serão destinados às escolas públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas, definidas em lei, que: I – comprovem finalidade não-lucrativa e apliquem seus excedentes financeiros em educação; II – assegurem a destinação de seu patrimônio a outra escola comunitária, filantrópica ou confessional, ou ao Poder Público, no caso de encerramento de suas atividades. § 1º Os recursos de que trata este artigo poderão ser destinados a bolsas de estudo para o ensino fundamental e médio, na forma da lei, para os que demonstrarem insuficiência de recursos, quando houver falta de vagas e cursos regulares da rede pública na localidade da residência do educando, ficando o Poder Público obrigado a investir prioritariamente na expansão de sua rede na localidade”.

 

 

 

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