Atenção se volta para piso do magistério, mas meta está no PDE

A crise financeira que atingiu em cheio a classe trabalhadora do Distrito Federal – e de todo o Brasil – fez com que a categoria do magistério público colocasse atenção total no índice de atualização do piso do magistério. Afinal, já são sete anos sem qualquer reajuste no vencimento, que vem sendo engolido pela inflação. Entretanto, enquanto os olhos se voltam para a atualização do mínimo, o magistério público do DF tem como um dos objetivos financeiros o alcance da meta 17 do Plano Distrital de Educação (PDE), que equipara o vencimento básico de professores e professoras à média da remuneração das demais carreiras de servidores públicos do DF com nível superior.

“Ninguém aguenta mais. É gasolina, é alimento; tudo sobe, e nosso salário continua sem qualquer tipo de reajuste. Então, quando se fala em 33% de reajuste para o piso da educação, a categoria logo pensa que esse é um índice que, automaticamente, deve ser contabilizado nos nossos vencimentos. É uma interpretação gerada pelo desespero de ver o salário congelado há sete anos, sem dar para pagar as contas”, avalia a diretora do Sinpro-DF Rosilene Corrêa.

De acordo com a Lei do Piso (Lei 11.738/2008), a aplicação do índice de atualização deve incidir sobre vencimentos que correspondam a até o mínimo. Esse índice de atualização é feito todo ano, e equivale à variação do valor por aluno anual do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (VAAT, indicado pelo Fundeb). Como o último percentual dessa variação foi de 33%, o vencimento mínimo do magistério deve sair dos atuais R$ 2.886,24 para R$ 3.845,34.

“Com a atualização do piso do magistério, professores que recebem menos que R$ 3.845,34, que é o valor indicado para o mínimo, terão reajuste. O índice aplicado para esse reajuste poderá ser menor que 33%, desde que o mínimo de R$ 3.845,34 seja atingido”, explica a diretora do Sinpro-DF Berenice D’arc. Ela ainda ressalta que o novo Fundeb é uma das principais conquistas das últimas décadas do movimento sindical dos trabalhadores da educação. O Fundo também foi alvo de destruição do governo Bolsonaro, e só se manteve ativo graças à pressão da categoria do magistério público de todo o Brasil.

A regra citada pela sindicalista está expressa na Lei do Piso, e esclarece que carreiras do magistério público que tenham vencimento inicial acima do mínimo não percebem o índice de atualização estabelecido. É o caso da carreira do magistério público do DF. Pela tabela salarial mais atual da categoria – de março de 2015 –, professores ingressam na carreira com vencimento inicial de R$ 3.858,87.

Luta pela isonomia salarial, meta 17 do PDE (2017)

 

“É essencial lembrar que, pela própria Lei do Piso, o que conta é o vencimento básico. Gratificações, anuênio ou qualquer bonificação não podem ser considerados para o valor do piso. Recentemente, a Secretaria de Educação do DF disse em um jornal de grande circulação que nosso vencimento inicial era de mais de R$ 5 mil. Isso não é verdade. Aliás, embora recebamos acima do piso do magistério, nunca estivemos tão perto do mínimo: são apenas R$ 13 de diferença”, lembra Berenice D’arc.

Para Luciana Custódio, que também integra a diretoria colegiada do Sinpro-DF, o achatamento do vencimento mínimo da categoria do magistério público no DF é reflexo da política de desvalorização da educação, implementada pelos últimos governos distritais.

“O último reajuste concedido aos professores do DF foi em março de 2015. De lá pra cá, as perdas inflacionárias passam de 44%, levando em consideração o IPCA. Perdas que, aliás, não incidem apenas no vencimento, mas também no auxílio alimentação e no auxílio saúde”, diz Luciana Custódio.

A dirigente sindical ainda alerta que o congelamento salarial que passa de meia década deixa ainda mais distante o cumprimento dos objetivos e metas estabelecidas no Plano Distrital de Educação.

“O PDE é uma conquista nossa, garantida com muita luta da categoria. E é nele que está a política de valorização salarial que devemos reivindicar. Na meta 17, está expressa a necessidade de valorização dos profissionais da educação como uma política de Estado, imprescindível para, junto com as demais 20 metas, construir um Estado Democrático. E para que essa valorização seja feita, o PDE prevê a equiparação do vencimento básico de professores e professoras, no mínimo, à média da remuneração das demais carreiras de servidores públicos do DF com nível de escolaridade equivalente. No nosso caso, esse nível é o superior”, esclarece Luciana Custódio.

Das 29 carreiras de servidores públicos do DF com nível superior, professores e professoras estão em último lugar quando considerado o vencimento inicial.

A vigência do PDE sancionado em 2015 vai até 2024.

A valorização dos professores e das professoras sempre foi pauta do Sinpro. Na foto, Luciana Custódio (esq) e Rosilene Corrêa coordenando assembleia da categoria que discutia pauta salarial (2015)

 

Não é benesse, é lei
Depois de ter dado reajuste zero para professores da educação básica em 2021, Bolsonaro, o presidente que segue protagonizando níveis históricos de rejeição, subiu o tom para tentar protagonizar a atualização de 33% do piso salarial dos professores do magistério público.

Para engrossar o discurso falacioso, o ministro da Educação, Milton Ribeiro, chegou a fazer pronunciamento em rede nacional nessa terça-feira (1º/2), afirmando que “o presidente Jair Bolsonaro concedeu o maior aumento à categoria dos professores desde 2008, quando foi estabelecido o Piso Nacional do Magistério em nosso país”.

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Verdade seja dita, não fosse a Lei do Piso, aprovada em 2008 pelo governo Lula, professores não teriam qualquer instrumento legal para reivindicar, ao menos, o valor mínimo do vencimento inicial da carreira, já que é a própria lei, e não o presidente da República em exercício, que determina o percentual de reajuste anual.

“A Lei do Piso, do governo Lula, determina que o reajuste para quem recebe o mínimo seja anual. Não se trata de uma benesse de Bolsonaro. É lei, e deve ser cumprida. O que deve ser lembrado é que o presidente quis, a partir de uma medida provisória, estabelecer um ajuste de apenas 7,5% para professores, inferior até mesmo à inflação. Com a pressão do Sinpro, da CNTE e dos sindicatos da educação, Bolsonaro recuou”, alerta a diretora do Sinpro-DF Rosilene Corrêa.

Berenice D’Arc, diretora do Sinpro-DF, atuou nas diversas lutas em defesa no PDE. Na foto, ela representa o Sindicato em audiência pública na CLDF sobre o Plano Distrital da Educação (2018)

 

Ela ainda lembra que a Lei do Piso tem “o objetivo de valorizar a educação pública, o que só pode ser alcançado dando condições mínimas de vida para professores”. “Essa lógica deveria ser adotada por todos os governos. Infelizmente, vemos o contrário aqui no DF e em outros estados. Somos exemplo disso quando mostramos que nosso salário está congelado há sete anos”, critica a professora aposentada.

A dirigente Luciana Custódio lembra que, para além do congelamento salarial, a categoria do magistério público do DF sofreu um calote.

“Em 2013, depois de greves e outras lutas, garantimos reajuste salarial que foi de 23% a 70%. Esse valor foi dividido em seis vezes, com pagamento de duas parcelas por ano. Entretanto, a parcela de setembro de 2015 não foi paga; e não por falta de luta, mas por falta de um governo que dialogue com os interesses da educação pública. Há o anúncio de, finalmente, a tabela salarial será corrigida a partir do próximo mês de abril. E assim como a atualização do piso do magistério, o pagamento dessa sexta parcela é lei”, afirma.

Fora da lei
Se no DF o piso salarial do magistério público foi garantido a partir da luta sindical – que continua atuante pela valorização da categoria –, estados e municípios padecem com o descumprimento da lei.

O assessor jurídico da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) Eduardo Ferreira lembra que, até 2019, pelo menos metade dos mais de 5,5 mil municípios brasileiros descumpriam a Lei do Piso.

“A CNTE tem 52 sindicatos filiados, 27 de base estadual. Poucos sindicatos são de base municipal. O que se percebe é que municípios apresentam uma fragilidade de representação sindical, com grandes dificuldades de fazer o enfrentamento jurídico para garantir o pagamento do piso do magistério”, afirma.

Pela Lei, não há previsão de penalização de gestores que descumprirem o piso em estados ou municípios. “Entretanto, os sindicatos podem entrar com ação de cobrança contra o ente público. Ou seja, embora o prefeito ou o governador não sofra sanção, o Estado pode sofrer, com pagamento de retroativos e multas, por exemplo. E temos algumas vitórias nesse sentido”, afirma Eduardo Ferreira.

Pressão do Sinpro-DF barra veto do governador Ibaneis ao art. 56 da LDO. Com isso, ficou garantido o pagamento da última parcela do reajuste salarial da categoria

 

Segundo a Lei do Piso, cabe à União complementar o pagamento mínimo do vencimento do magistério público nos estados e municípios que comprovarem a incapacidade financeira para realizar o que manda a Lei. “Desde 2008, nenhum estado ou município conseguiu comprovar essa incapacidade. O problema que vem ocorrendo é a estruturação da carreira. Em muitos lugares, o piso vem sendo o teto”, esclarece o assessor da CNTE.

Lutar sempre
Diante de um cenário de total desvalorização do magistério público, o Sinpro-DF encontra amplos desafios pela frente. Há 43 anos na luta incessante pela educação e pelos profissionais do setor, as estratégias para superar o arrocho salarial estão em curso.

“Nós fomos forjados na luta. Não é agora, em um dos piores momentos para a educação, que vamos mudar a nossa história. A questão salarial do magistério público sempre foi uma pauta do Sinpro. Não por acaso hoje nosso vencimento inicial supera o piso do magistério. Nunca deixamos de pautar a questão salarial, e reivindicamos o retorno imediato da mesa permanente de negociação com a Secretaria de Economia do DF para garantir à nossa categoria o que ela merece: respeito e dignidade, o que não pode ser alcançado com vencimentos desvalorizados”, afirma a dirigente do Sinpro-DF Berenice D’arc.

Como 2022 é ano eleitoral, a lei determina que reajustes salariais ao funcionalismo público só podem ser concedidos até abril. Além disso, os atuais governos não podem fazer dívidas para gestões posteriores.