Precarização do magistério é uma das principais causas do assédio moral na escola

O assédio moral tem destruído as relações de trabalho no Brasil, causando graves doenças emocionais e a degradação das relações no ambiente de trabalho.  A prática reiterada de situações humilhantes e constrangedoras no ambiente de trabalho, que define o assédio moral, tem motivado e aumentado vários tipos de doenças emocionais com centenas de afastamentos, cujos principais sintomas são a síndrome de burnout, depressão e ansiedade.

A prova disso é que, no início deste ano, o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) revelou que houve um aumento de 38% nos afastamentos por transtornos mentais e comportamentais dos trabalhadores de 2022 a 2023. Na rede pública de ensino do Distrito Federal (DF) não foi diferente. A Secretaria para Assuntos de Saúde do Trabalhador do Sinpro, por meio do seu atendimento jurídico da saúde, tem constatado o aumento de vítimas que procuram a proteção do sindicato para denunciar os abusos sofridos no ambiente laboral.

No entendimento do Sinpro, o motivo desse aumento é a ampliação significativa da precarização do magistério, o que tem sido um dos principais propulsores do aumento da prática de assédio moral nas escolas. Salas de aulas lotadas, propostas pedagógicas arbitrárias, imposição de chefias que não estabelecem diálogos, discrepância entre cobranças, expectativas e condições para objetivos pedagógicos, condições de trabalho precarizadas, falta de material de apoio para atender as múltiplas deficiências, dentre outros problemas, são condições precárias que ocasionam danos à integridade física e psíquica dos(as) servidores(as) da educação.

“A rede pública enfrenta um processo de adoecimento por assédio moral que nos preocupa tanto que, este ano, o Sinpro decidiu dedicar esforços para erradicar esse mal das nossas escolas”, afirma Élbia Pires, coordenadora da Secretaria para Assuntos de Saúde do Trabalhador. Uma das ações é a campanha “Assédio moral nas escolas, NÃO!”, que parte de um esforço contínuo do Sinpro de combater esse problema. Essa campanha surgiu a partir do aumento de casos de adoecimento por assédio moral, observados nos atendimentos realizados pelo sindicato e nas visitas dos diretores do Sinpro às escolas. A psicóloga da entidade, Luciane Kozicz, tem diagnosticado muitos desses casos.

Psicóloga e pesquisadora da Universidade de Brasília (UnB), Luciane Kozicz afirma que a Clínica do Trabalho, realizada semanalmente nas escolas da rede pública do DF, também tem constatado os principais sintomas diante de tanta precariedade na educação: “Culpa e vergonha, silenciamento, depressão, ansiedade, síndrome de burnout, espaço coletivo interditado, que torna o servidor um coadjuvante no ensino”.

O Sinpro oferece à categoria vários serviços para enfrentamento desse mal. Além dos serviços mencionados anteriormente, há uma cartilha sobre o tema e, este ano, está com a campanha “Assédio moral nas escolas, NÃO!” para conscientizar, dar visibilidade e transparência sobre práticas assediantes, muitas vezes normalizadas no cotidiano do trabalho. “A ideia é criar uma rede de proteção para que os profissionais possam exercer o magistério sem que isso se torne uma carga destrutiva, permitindo-lhes viver plenamente suas outras dimensões de vida”,  afirma Élbia.

 

Medo e insegurança: o combustível do assédio moral

Luciane Kozicz afirma que o aumento de contratação temporária na rede de ensino amplia o caos relacional e psíquico. “Estratégias como reduzir o quadro estável, tornar a carreira imprevisível, instabilidade de projetos, variação contínua de colegas e equipes resultam na degradação de vínculos e corrosão da personalidade”, salienta a psicóloga.

Essa situação trabalhista, estritamente relacionada ao modelo econômico capitalista neoliberal, normaliza contratações precarizadas. No DF, por exemplo, há cerca de 22 mil professores em regência de classe, dos quais 16 mil são temporários. “Cerca de 70% da categoria está em situação de contratação precarizada, o que gera incertezas, disparidade de direitos e sofrimento. Esse é um dos motivos pelos quais defendemos a convocação imediata dos aprovados no último concurso e a realização de novos concursos públicos para atender a essa demanda sempre crescente na escola pública”, defende Pires.

Além disso, problemas que deveriam ser resolvidos coletivamente viram perseguições individuais, com trabalhadores(as) sendo exigidos(as) a se entregar integralmente ao trabalho. “O governo Ibaneis é exemplo desse ‘sujeito neoliberal’, que usa a homogeneização dos discursos e dos saberes para instituir um novo modelo de servidão voluntária que molda mentes. É tutelado com técnicas refinadas de motivação, estímulo e incentivo. O efeito dessa nova subjetividade é a produção em cadeia com trabalhadores empreendedores e competitivos com falha zero”, explica Luciane.

Na saúde, segundo ela, percebe-se o crescimento geométrico dos afastamentos por depressão: a segunda maior CID (Classificação Internacional de Doenças) de afastamento no trabalho. Cansados(as) das exigências desse desempenho “admirável”, com aprendizados contínuos, flexibilidade e mudanças impostas, comprometimentos coagidos e desmoralizado, o adoecimento é a linguagem que resta”, destaca a psicóloga.

Ela afirma que “a depressão se refere a um ser humano em pane, cansado de si mesmo. Para um assediador, esse trabalhador é descartável. Esse sentimento é muito comum entre professores(as) readaptados(as), que ficam desamparados e, muitas vezes, não encontram sentido na nova tarefa”. O Sinpro denuncia essa situação há anos e defende o fortalecimento das relações de trabalho para erradicar o assédio moral.

O tema foi debatido no programa TV Sinpro de quarta-feira (5/6). Para acessá-lo, basta clicar no link do YouTube do Sinpro a seguir:

MATÉRIAS EM LIBRAS