Artigo: Toda forma de educar vale a pena

A educação acontece na sala de aula, nos corredores, nas ruas, nas assembleias, e principalmente se dá pelo exemplo de que lutar é preciso.
 

“Se você é capaz de tremer de indignação 

a cada vez que se comete uma injustiça no mundo,

então somos companheiros.”

 Che Guevara

O mês de outubro, do professor, da criança e do servidor público, fica tristemente marcado, no Distrito Federal, pelo ataque covarde e descabido do governo Rollemberg (PSB) contra professores e professoras. Arrancados de seus carros, algemados, agredidos brutalmente e presos, educadores foram expostos ao horror de um tratamento indigno para qualquer ser humano.
As cenas que deixaram a comunidade brasiliense estarrecida e os estudantes das escolas públicas chocados trouxeram, imediatamente, à memória, o horror praticado pelo governo psdbista do Paraná contra a comunidade escolar que se manifestava por ocasião da greve que durou mais de 40 dias e foi tratada com total descaso e desrespeito pelo governo de Beto Richa.
No Estado de Goiás a violência não foi física. A pressão emocional não foi em menor tempo. Ali também um governador do PSDB investe na destruição da educação pública.
Em São Paulo, administrado pelo PSDB há 20 anos, os professores tiveram suas reivindicações ignoradas durante três meses de greve. E, agora, para coroar o desprezo pela educação pública, o governador Geraldo Alckmin promove o fechamento de 94 escolas estaduais.
A voracidade pelo desmantelamento do Estado vem da década de 1990, com FHC/PSDB, na Presidência da República. A implantação do projeto neoliberal no Brasil foi marcada por retrocessos econômicos, políticos, sociais, culturais e éticos, que se refletem até hoje. Esse processo estabeleceu raízes e, apesar de um período de 12 anos de luta por uma nova organização social, com outros princípios que apontam ser possível a construção de um país mais justo, os ramos maléficos do autoritarismo neoliberal surgem em diferentes lugares, em distintos formatos. Os ataques são parecidos e as consequências terrivelmente devastadoras para todos.
Com a educação não poderia ser diferente. Afinal, direito fundante da cidadania e da consciência ética, segredo não se faz de que ela é um ato político libertador.
As marcas do conservadorismo têm sido tatuadas pelo Congresso Nacional. Principiou com o debate sobre o Plano Nacional de Educação (que se estendeu aos legislativos estaduais e municipais) quando houve o impedimento da garantia que os recursos seriam destinados exclusivamente à educação pública. A inserção do que seriam também diretrizes do PNE, as questões de gênero e orientação sexual foram extirpadas da proposta original. Esse debate ampliou seu espectro e chegou à absurda proposta de que os professores não podem tampouco falar de política em sala de aula.
Os reflexos das insanidades praticadas no parlamento brasileiro lançam seus tentáculos aos governos conservadores estaduais. Educadores e educadoras mobilizados\as por seus direitos têm sido covardemente agredidos moral e fisicamente em vários estados comandados por governadores sociais-democratas.
Em São Paulo, governado por Alckmin, a Apeoesp precisou ingressar com denúncia contra as condições de trabalho nas escolas junto ao Escritório da ONU.
Em Goiás, Marconi Perillo não deixa por menos. Organiza a terceirização\privatização da educação pública por meio da contratação de OS. O decreto prevê a contratações de trabalhadores em educação por salários até abaixo do mínimo!
Decreto parecido também foi publicado por Rollemberg no Distrito Federal, prevendo a contratação de OS para as áreas de saúde e de educação.
O ranço de FHC e o objetivo liberal de destruir a educação pública e os que a ela defendem se revigora. Claro está que os ataques não são às professoras e aos professores. O vampirismo é à educação. O capitalismo se reinventa e vê espaços na educação pública brasileira. Além de assumir inúmeras instituições educacionais, empresas internacionais produzem materiais “didáticos” em série. Caixas prontas com concepções e ideologias que interessam ao capital transnacional para que nossos cidadãos percam definitivamente o conceito de país, desvalorizem sua pátria, desprezem sua cultura. Fácil imaginar onde isso chegará em breve se não houver reação firme em defesa da educação pública de qualidade.
A destruição da dignidade em nosso país também se expressa pelo sentimento de volta ao Brasil Colônia quando constatamos os retrocessos impingidos à sociedade pelo Congresso Nacional: terceirização, alteração do conceito de trabalho escravo, redução da maioridade penal, redução da idade mínima para trabalhar, proibição da adoção de filhos por casais homoafetivos, impedimento de aborto nos casos de estupro, risco de vida para a mãe e má formação fetal, são indubitáveis indícios do retorno à barbárie.
Professoras e professores, por sua tarefa política de educar para a autonomia, para o exercício da liberdade e da cidadania, por meio de suas representações de classe, participam desses debates, se contrapondo aos retrocessos. Cumprindo seu papel de construir a mudança, o avanço dos direitos, a humanização e sensibilização de crianças e adolescentes para temas fundamentais para a sociedade brasileira, são indesejáveis aos governos conservadores. É importante combater sua organização, destruir suas reivindicações que, além de salário digno, direito previsto constitucionalmente, inserem denúncias contra o desmantelamento da educação pública, exigem escolas adequadas, educação de qualidade, condições dignas de trabalho para si e de estudo para estudantes.
A educação acontece na sala de aula, nos corredores, nas ruas, nas assembleias e, principalmente, se dá pelo exemplo de que lutar é preciso.  Não é possível compactuar com retrocessos, cortes de direitos, indignidades cometidas contra a educação, os professores, os alunos e suas famílias, a sociedade brasileira.
Certos de seu papel de incentivadores do desenvolvimento da consciência enquanto mola propulsora de mudanças, professoras e professores de Brasília lutam por seus direitos, garantidos em lei e desrespeitados pelo governador Rollemberg.  Como resposta, são afrontados em sua dignidade física e moral. Porém, o papel educativo nem nesse momento é desconsiderado. E a lição vem em forma do despertar da solidariedade. Imediatamente após os ataques, a consciência de classe aflora e outros trabalhadores percebem que a luta é de todos. Rodoviários paralisam a suas atividades em solidariedade aos professores. Servidores da administração direta manifestam sua indignação, funcionários municipais das cidades do entorno expressam seu grito de “estamos juntos”. E nova lição é resgatada. Somos todas e todos trabalhadoras e trabalhadores. E juntos, somos mais fortes.
A luta se fortalece. O sangue se transforma em energia. A indignação de uma categoria se transforma em sentimento de revolta concretizado no companheirismo de todas as categorias. A classe é trabalhadora. E a resposta aos atos de barbárie, desrespeito e desejo de destruição da educação pública vem pela lição aprendida de Paulo Freire e ensinada a todas e todos: “Não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão.”
 
* Por Rosilene Correa
Diretora do Sindicato dos Professores no Distrito Federal
Diretora da CUT Brasília e da CUT Nacional