Artigo: As contribuições do SEAA para uma escola inclusiva e democrática, onde todos e todas podem aprender

A grandeza da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEEDF) pode ser mensurada por vários mirantes: pelo grande número de servidores e estudantes, pelo impacto na organização e funcionamento da sociedade local, pela contribuição essencial na educação formal que se estende da primeira infância até a velhice, pela ação intencional que objetiva a superação das desigualdades socioeconômicas e dos preconceitos e discriminações de qualquer ordem que persistem em nosso país.

E, no entanto, a história da Secretaria ainda é bastante desconhecida. Saudamos iniciativas como a do Museu da Educação do Distrito Federal, levada a efeito pela UnB, que se constitui com a missão de preservar, salvaguardar e difundir a memória da educação distrital, já que essa história, no interior da rede, encontra-se em migalhas ou em opacidade.

Provavelmente por esse motivo um Serviço que existe desde 1968 não seja compreendido por muitos na rede pública, sendo alvo de interpretações equivocadas acerca de suas atribuições. Estamos falando do Serviço Especializado de Apoio à Aprendizagem – SEAA, composto por profissionais com formação em Pedagogia e Psicologia que aspira oferecer suporte técnico pedagógico com vistas ao apoio educacional especializado às escolas públicas.

Para compor o SEAA, psicólogos escolares são admitidos por concurso público e pedagoga(o)s são professor(a)es efetivos que passam por processo seletivo interno. Articuladamente, pedagoga(o)s e psicóloga(o)s trabalham mapeando, assessorando e acompanhando o processo de ensino e aprendizagem, com vistas ao êxito escolar e, por conseguinte, almejando uma educação democrática, integral e humanizada.

Um Serviço Especializado deve colaborar decisivamente para uma educação melhor. A presença de especialistas estava entre as preocupações do grande educador Anísio Teixeira que já indagava em 1958: Por que especialistas de educação? O mestre anteviu que a necessária democratização da escola acarretaria a necessidade de novos profissionais porque quanto maior a abrangência, maiores os desafios para o processo de ensinar e aprender.

Afirmava que a educação escolar para uma minoria era baseada na seleção de professores e alunos e, portanto, exigiria uma reduzida capacidade de planejamento e administração. Continuava dizendo que uma escola onde todo(a)s pudessem frequentar e aprender demandaria dos seus profissionais um estudo das dificuldades e dos recursos para vencê-las, mediante “todo um trabalho de administração complexo, diversificado e difícil”. Justificava-se, assim, a atuação dos chamados especialistas em educação.

Nesse sentido, os especialistas são requisitados porque a escola é e precisa ser cada vez mais pública, democrática e inclusiva. Incorporar tal consciência evita os saudosismos eivados de opiniões acríticas ou repletas de ignorância ao evocar uma distante “escola pública de qualidade”, organizada para ser acessada por “poucos e bons”.

Provavelmente, tal modelo de escola excluiria até as autoras desse texto e boa parte de seus leitores e leitoras, advindos das classes populares.

Avançando no tempo, a luta coletiva gerou novas legislações e direitos. Assim, hoje todos os sistemas educacionais – desde a Educação Infantil até o Ensino Superior – devem cumprir e fazer cumprir os princípios da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996. Alguns são bastante explícitos em seu teor progressista:

Igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

Respeito à liberdade e apreço à tolerância;

Valorização do ambiente escolar;

Garantia do direito à educação e à aprendizagem ao longo da vida;

Garantia de padrão de qualidade.

Certamente, a materialização ou, pelo menos, a busca incessante e sistemática por tais princípios remete à democratização, qualidade social e inclusão lato sensu que precisam permear o chão da escola. Para tanto, a conscientização e a promoção do respeito às diversidades e a defesa do direito de aprendizagem de todo(a)s o(a)s estudantes norteiam e fundamentam legalmente o trabalho do SEAA.

Ainda andando na esteira da legislação, trazemos o atual Plano Nacional de Educação (PNE) 2014-2024. Com força de lei, o PNE estabelece 20 metas a serem atingidas no campo educacional no ínterim de 10 anos. O Distrito Federal, com base no PNE, elaborou seu plano decenal correspondente, o Plano Distrital de Educação (PDE) na lógica da qualidade da educação socialmente referenciada.

O PDE, em sua Meta 2, indica a necessidade de ampliar o quadro de profissionais para atuarem no Serviço Especializado de Apoio à Aprendizagem, no espaço-tempo nível escola e na assessoria ao trabalho pedagógico, com o objetivo de contribuir para a superação das dificuldades apresentadas pelos estudantes, adotando a perspectiva da atuação institucional.

Desse modo, ancorado na lei e na legitimidade, o SEAA combate a estigmatização e a invisibilidade dos sujeitos, especialmente do(a)s estudantes, mas não somente. O Serviço rebate imagens, falas e práticas baseadas no senso comum ou em estereótipos sobre quaisquer seres humanos. Tais atitudes podem anular ou distorcer as suas demais características ou até mesmo podem invisibilizá-los no interior da instituição, impactando negativamente as aprendizagens discentes ou o desenvolvimento profissional pleno.

Ao mesmo tempo, o SEAA luta contra a exclusão socioeducacional, processo multifacetado e que afeta toda a vida social. A exclusão acumula camadas de interdependência econômica, social, de gênero, étnica, política, cultural, etc e a escola, de modo intencional ou não, pode reproduzir estratégias e/ou posturas que podem ampliar o fosso entre os sujeitos.

Retomando o título, é necessária a (re) apresentação do Serviço, visto que também ele padece de estigmas e desconhecimentos. Por isso, certas indagações e dúvidas são comuns no cotidiano da escola: “Não conheço esse serviço. Faz o quê mesmo?”; “O trabalho é fazer relatório e encaminhar?”; “Manda o estudante para a sala do Serviço pra ver se ele se acalma.”; “Como assim, a(o) psicóloga(o) não pode atender o estudante?”; “Como assim, a(o) pedagoga(o) não dá reforço?” São indagações que ainda refletem a necessidade de disseminar as funções e as características do SEAA.

Nesse sentido, ao entrelaçar história, informação e propósito, o SEAA vem a público não para dizer a que veio, mas sim para reafirmar sua importância diante de escolas cada vez mais desafiantes porque são cada vez mais inclusivas. Ainda bem! Enquanto alguns setores da Secretaria têm como atribuição garantir o acesso, o SEAA trabalha para que, junto aos demais profissionais, cada sujeito por trás de um número de matrícula aprenda e se desenvolva integralmente, conforme objetiva o Currículo em Movimento. Em tempos de pandemia – e antes dela – lutamos contra mais um vírus persistente, o vírus do fracasso escolar, como bem descreve Bernard Charlot.

Assim, ao tornar a apresentar o Serviço Especializado de Apoio à Aprendizagem, reitera-se nosso compromisso com uma escola inclusiva. Uma escola inclusiva opera cotidianamente por meio do interesse genuíno em compreender o desenvolvimento humano, considerando as interações e as relações como elementos fundantes do conhecimento e acolhendo as diversidades e as singularidades que enriquecem os ambientes coletivos. O foco se desloca das dificuldades e incapacidades para as potências e possibilidades de superação que os seres humanos, juntos, são capazes de edificar.

Evocamos outro mestre, Paulo Freire, que nos lembra: “Escola é sobretudo, gente Gente que trabalha, que estuda”. Sendo assim, o SEAA trabalha com gente, analisando, intervindo e conciliando um processo que comporta uma dimensão, que é necessariamente coletiva e institucional, e também uma dimensão particular e individual. Nessa escola, um sujeito não “atrapalha” outrem. Cada sujeito é um “recurso” para alavancar o crescimento coletivo.

É preciso considerar que as pessoas que fazem a escola cotidianamente não são seres abstratos, e sim seres essencialmente sociais, com suas identidades e histórias, imersos numa vida grupal na qual partilham uma cultura, (re)criando conhecimentos, valores e atitudes advindas dessas relações. Num processo que é, ao mesmo tempo, social e intersubjetivo, a atuação especializada do SEAA faz emergir, conduz e favorece o desenvolvimento das potencialidades de cada um(a) e a superação das fragilidades, na firme crença de que todo(a)s têm o direito de aprender. Isso porque a educação se constitui em direito humano fundamental e incondicional para cada um(a) e para todo(a)s.

Ao finalizar, imersos neste cenário concreto, desafiador e rico, consideramos urgente e indispensável expandir o SEAA para todas as escolas da Educação Básica, como preconiza o PDE, para que o “bem aprender” impulsione e sedimente o “bem viver”.

Edna Rodrigues Barroso – Professora aposentada, atuou como Pedagoga do SEAA
Valdirene Reis – Coordenadora Intermediária do SEAA em Ceilândia