Além de um golpe à democracia, o PL da Escola Sem Partido é uma tentativa de mordaça

Imagine uma escola sem debates políticos, sem movimento estudantil, sem análise histórica, pluralidade de ideias, questionamentos e críticas dos estudantes. Para muitos, isto passaria tranquilamente como um relato da ditadura militar, mas a exemplificação é ponto defendido por partidos conservadores da política brasileira e vem ganhando força nas câmaras municipais ao redor do Brasil, no Congresso Nacional e na Câmara Legislativa do Distrito Federal.
Desde a formulação do Projeto de Lei nº 867/2015 pelo deputado federal Izalci Lucas (PSDB-DF), a proposta que institui a chamada Escola Sem Partido se espalha pelo País com o objetivo de coibir o que seus autores chamam de processo de ideologização dentro de sala de aula. A proposta pretende “enquadrar” professores(as) que “doutrinem” ideologicamente os estudantes e até mesmo prender estes educadores em caso de descumprimento da proposta, que passou a ser chamada ao redor do Brasil de PL da Mordaça.  O apelido não foge em nada ao seu sentido, já que a proposta é claramente uma medida de mordaça e censura àqueles que tem, entre suas obrigações, abordar e ensinar ideologias políticas, sociais, históricas e culturais nas salas de aula.
Desde a fundação de Brasília, os(as) professores(as) e orientadores(as) educacionais se caracterizaram pelo seu compromisso com uma educação democrática, inclusiva e de qualidade no Distrito Federal, pontos que colocaram a Capital Federal como referência na educação pública em todo o país. Travestida de uma medida que visa única e exclusivamente o fim das análises progressistas na grade curricular e em materiais didáticos, o PL da Mordaça é, na verdade, mais uma tentativa de cercear a democracia e acabar com o debate nas escolas, fator que constrói diretamente a consciência crítica e política do estudante.
A primeira iniciativa para instituir a Escola sem Partido partiu do Legislativo fluminense, com um projeto de lei do deputado estadual Flávio Bolsonaro, filho do deputado federal Jair Bolsonaro. O texto do PL nº 2.974/2014 proíbe a ideologização partidária na grade curricular e em materiais didáticos. O exemplo mais radical é o PL nº 1.411/2014, do deputado federal Rogério Marinho (PSDB-RN), que prevê até pena de prisão para o(a) professor(a) acusado de “assédio ideológico”.
Para a presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee) e professora da PUC-São Paulo, Madalena Guasco, o objetivo do PL da Mordaça é aumentar o ódio e o conservadorismo no País. “Esse movimento está tentando propor nas várias assembleias legislativas, projetos de lei que vão desde vigilância do professor em sala de aula a punição através de mandado extrajudicial. Até agora, eles conseguiram aprovar somente em Alagoas. Aqui em São Paulo o projeto foi engavetado. Agora, em nível nacional, eles estão aproveitando o debate dos parâmetros nacionais curriculares para introduzir o controle do conteúdo ensinado em sala de aula. Eles sabem que a iniciativa deles é inconstitucional, mas o que eles querem é criar um ambiente de medo e perseguição. É disso que se alimenta o fascismo”, analisa a professora.
 
 Censura no Distrito Federal
Na Capital Federal, o PL da Mordaça ganhou corpo com o Projeto de Lei n° 1/2015, da deputada distrital Sandra Faraj (SD). A exemplo dos demais projetos espalhados ao redor do País, este PL mostra um completo desapreço pela democracia tão duramente conquistada pelo povo brasileiro, ao sugerir a censura de conteúdos e a fiscalização da liberdade de ensinar, retomando práticas autoritárias características dos períodos da ditadura militar.
Para o Sinpro, o PL impede os(as) professores(as) de ensinar e os(as) estudantes de aprender, onde o profissional apenas emite o conteúdo, como se fosse um robô, sem provocar o diálogo e a reflexão, precarizando o ensino e censurando a interação dentro da sala de aula. “Esse projeto rotula os professores como militantes de esquerda em sala de aula, o que é absurdo. Há profissionais que militam, outros sem partido, há professores de direita e de esquerda. Isso não pode ser interpretado como um risco de influência em sala. Nós defendemos uma escola plural, que incentive estudantes a discutir os fatos da história e da atualidade, e, para isso, o debate não pode ser cerceado”, analisa Rosilene Corrêa, diretora do Sinpro.
O Sinpro é contra projetos como este por acreditar que é a partir da pluralidade de ideias, de uma aula alicerçada em debates abertos e no respeito à democracia que teremos uma sociedade crítica, contextualizada e plural. Além de uma mácula significativa na democracia brasileira, o PL da Mordaça compromete de forma significativa a busca por uma escola pública de qualidade.