Trabalhadores na luta pela reforma agrária

Os/as trabalhadores/as do campo, das águas e das florestas estão desde a segunda-feira ocupando Brasília para organizar mobilizações conjuntas na luta pela terra. Mais de 5 mil trabalhadores ficarão acampados no Parque da Cidade até quarta-feira, dia 22. Os diretores do Sinpro estiveram presentes no local do acampamento para prestar o apoio da entidade ao movimento. (foto)
A atividade faz parte do Encontro Nacional Unificado dos Trabalhadores (as) e Povos do Campo, das Águas e das Florestas, que acontece depois de 51 anos do primeiro congresso nacional camponês. O objetivo do Encontro é fazer pressão no governo e dialogar com a sociedade sobre os direitos dos trabalhadores (as) rurais e o papel estratégico da reforma agrária no desenvolvimento agrário e econômico do Brasil.
As atividades terminarão com uma grande marcha, na quarta-feira (22), rumo à Esplanada dos Ministérios. A previsão é de que a marcha reúna mais de 10 mil pessoas.
Para o Secretário de Meio Ambiente da CUT, Jasseir Fernandes, as manifestações devem mostrar que a agricultura familiar representa um modelo de desenvolvimento sustentável não apenas internamente, mas também externamente.
“Mais de 70% dos alimentos na mesa do brasileiro são produzidos pelos agricultores familiares, mas também boa parte do que é exportado. Não perdemos divisa porque a pequena propriedade gera alimentos, não é o latifúndio quem faz isso e precisamos expor essa realidade.”
Além da pauta imediata
“O Brasil avançou nos últimos anos por meio de medidas como a ampliação dos recursos para o Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), do PAA (Programa Nacional de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar), mas são medidas pontuais. O trabalhador rural não tem sido tratado como prioridade para o governo. Queremos construir uma agenda positiva para trabalhar ações macro de todo o movimento”, acrescenta Fernandes.
Secretário de Política Agrícola da Confederação dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), William Clementino, aponta que o combate à miséria, bandeira principal do governo da presidenta Dilma Rousseff, é inviável sem a preocupação com o trabalhador rural.
“A conferência é estratégica para resgatar o papel da reforma agrária no desenvolvimento rural do Brasil com sustentabilidade e buscando superar a pobreza. Hoje, essa discussão é uma pauta enfraquecida na sociedade e no governo que tem dificuldade para desprender da macroproposta do agronegócio”, destaca.
Coordenadora da Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (Fetraf), Elisângela Araújo, aponta também a necessidade de a gestão Dilma definir de qual lado está.
Investimento para desenvolvimento sustentável
“Não dá para continuar produzindo alimentos saudáveis sem investimentos em um formato baseado na agroecologia. E, para isso, é necessário a reestruturação política do acesso ao crédito, à tecnologia e à pesquisa para poder organizar a ampliação da produção e da comercialização. Não basta apenas avanços que chegam no Plano Safra, focadas no crédito, sem a reestruturação”, defende Jasseir Fernandes.
“A Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) faz pesquisas sobre venenos para multinacionais, mas, muitas pessoas que estão lá boicotam a agricultura familiar, não tratam com a mesma prioridade. Temos que ter a ousadia de discutir o limite da propriedade da terra, a estrangeirização de nossas propriedades, que cada vez mais são vendidas para multinacionais”, afirma o Secretário de Meio Ambiente da CUT
Demanda por terra continua
Para o Secretário de Política Agrícola da Contag, a ideia defendida por setores do governo de que não é mais preciso distribuir terra e bastar restringir a política agrícola à oferta de crédito está equivocada.
“Metade dos 16 milhões de pessoas pobres no Brasil está no campo e precisamos desenvolver as áreas onde os assentamentos funcionam, com oferta de estradas, habitação, comercialização, assistência técnica, crédito. Mas, como vamos oferecer tudo isso para quem não tem nem a terra? Não dá para fazer assistência técnica para o trabalhador ser carpinteiro.”
Segundo dados da Contag, há cerca de 200 mil famílias acampadas aguardando por um espaço onde possa produzir. Porém, a demanda social certamente é muito maior que essa, já que nem todos que necessitam estão obrigatoriamente assentadas.
Lobby do agronegócio
De acordo com o secretário de Meio Ambiente da CUT, a reforma agrária ainda emperra em um Congresso refém do latifúndio.
“A agricultura familiar tem a responsabilidade com o país de garantir a produção sustentável e a segurança alimentar, mas muitas vezes isso não é compreendido como fundamental dentro do governo, porque não há uma análise mais profunda. Do outro lado, temos um Congresso refém do latifúndio, que usa a terra apenas como reserva de valor, interessa o que gerar valor”, explica Fernandes.
Maior poder de lobby no Congresso, a bancada dos ruralistas conta com 120 deputados federais e 13 senadores, segundo a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).
Repolitizar os agricultores
Em 1961, em um Brasil comandado por João Goulart, que assumiu após a renúncia de Jânio Quadros, os trabalhadores rurais realizavam o primeiro congresso nacional camponês, em Belo Horizonte (MG). Recentemente reeleito presidente da CUT-RN, José Rodrigues Sobrinho era um dos presentes e lembra que os movimentos do campo tinham como pauta principal o fim da divisão de sua produção com os latifundiários e o acesso à Previdência.
“À época, nós ocupávamos as terras para não “pagar meia”, porque produzíamos, mas tínhamos sempre que dar metade para o proprietário. E também para ter o instituto de aposentadoria e previdência na agricultura. Havia também outros mecanismos que combatíamos, como o cambão, em que os agricultores trabalhavam três dias de graça em troca de peixes, por exemplo. Se não fizéssemos isso, seríamos mandados embora”, comenta.
Com a pressão dos camponeses e a ascensão de Goulart, destaca o presidente da CUT-RN, o cambão acabou e começou um processo de desocupação da terra. Interrompido apenas pelo golpe militar.
O dirigente CUTista que estará também no encontro de 2012 acredita que o grande avanço deve ser retomar o poder político do trabalhador do campo.
“Há uma despolitização dos trabalhadores diante das políticas compensatórias. Hoje estamos rediscutindo a repolitização e a reorganização dos trabalhadores rurais. Para isso, precisamos de rejuvenescimento dos quadros de nossos sindicatos.”
Com CUT Nacional